Em tempos de discussão sobre o destino do Ministério do Meio Ambiente e na inclinação do novo governo eleito de dar mais peso para a bancada ruralista, que deverá escolher o novo ministro da pasta ambiental, uma pesquisa do Laboratório de Ciência Aplicada à Conservação da Biodiversidade da Universidade Federal de Pernambuco revela que o agronegócio impacta 2 em cada 3 espécies de vertebrados ameaçados de extinção no país.
O trabalho, que ainda será submetida em uma revista científica, concedeu o título de bacharel em ciências biológicas pela UFPE para a pesquisadora Fernanda Silva de Barros, orientada do professor Enrico Bernard, responsável pelo Laboratório de Ciência Aplicada à Conservação da Biodiversidade da UFPE.
A pesquisa reuniu os dados de 464 espécies de vertebrados que estão na lista vermelha do ICMBio e localizou 1036 registros de pressões e ameaças. Foi utilizada uma tabela padronizada de classificação de pressões e ameaças, publicada pela primeira vez em 2008 e adotada internacionalmente, inclusive pela IUCN. Essa tabela possui 11 categorias (drivers) e 40 subcategorias (subdrivers), que permitem elencar um grande número de pressões e ameaça.
Dos 1036 registrados, 452 são diretamente decorrentes do agronegócio, o que torna o setor o que mais ameaça espécies ameaçadas de vertebrados do país.
“A média de pressões e ameaças é de 2,2 por espécie”, explica Enrico Bernard. Segundo o cientista, das 464 espécies, 168 sofrem com apenas uma pressão. “Só que 58% das 464 tiveram duas ou mais pressões simultâneas e há exatamente uma tendência de que as espécies de grupos mais ameaçados, como mamíferos e aves, experimentem mais pressões e ameaças”.
A Suçuarana ou onça-parda (puma concolor), o macaco-prego sapajus cay – espécie que ocorre no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul –, e o macaco guigó-de-coimbra-filho (callicebus coimbrai) apresentam, cada uma, 10 pressões ou ameaças cada.
Ainda segundo o professor, a academia e os órgãos ambientais do país ainda subestimam algumas pressões que afetam espécies. Mudanças climáticas, por exemplo, aparecem na pesquisa pressionando apenas 4 espécies, entretanto nenhuma ave ou anfíbio, os grupos mais ameaçados pelas mudanças climáticas.
“Mudança climática apareceu como pressão ou ameaça para um número muito reduzido de espécies, e nenhuma delas era anfíbio ou ave que são globalmente apontados como os grupos mais vulneráveis às mudanças climáticas (…). Provavelmente isso não está aparecendo no radar das pessoas que trabalham com essas espécies. Quando se observa países que fizeram análises semelhantes, como a Austrália, por exemplo, mudanças climáticas aparecem como “top priority” das maiores pressões e ameaças. Mas aqui no Brasil, o número de espécies que teve mudanças climáticas identificadas foi só 2% dessas 464”, estranha.
Para Enrico Bernard, a pesquisa evidencia que a ideia de juntar o Meio Ambiente com a Agricultura, já descartada pelo novo presidente, não daria certo, já que seria unir em um único órgão tanto o responsável pela proteção de espécies ameaçadas como o setor que mais pressiona essas espécies.
Mesmo com o aparente abandono da ideia de fusão de ministério, Bernard é cauteloso. “Nós que acompanhamos essa questão sabemos que não precisa fundir para acabar com o Ministério do Meio Ambiente, há como matá-lo por inanição. Ir lentamente desmontando os quadros, estrangulando ainda mais o orçamento, ao mesmo tempo que se mantém um MMA de fachada, mas sem a capacidade operacional de executar todas as funções que ele deveria executar. Então, isso também precisa ser considerado e discutido amplamente”.
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