A capital gaúcha reviveu na última semana o drama dos alagamentos, com chuvas torrenciais que cobriram parte de bairros da Zona Norte e da Zona Sul da cidade. Com a frequência cada vez maior de eventos extremos, as questões climáticas passaram não só a fazer parte das preocupações da população de Porto Alegre, mas também a pautar a corrida eleitoral.
((o))eco analisou os planos de governo dos quatro candidatos com melhor colocação nas pesquisas para prefeito da capital gaúcha e identificou que o assunto ganhou importância inédita nas propostas eleitorais, com destaque para reconstrução e modernização dos sistemas de contenção de enchentes.
Confira abaixo as principais propostas para a área ambiental de cada um dos quatro candidatos analisados. Eles aparecem no texto por ordem alfabética.
Felipe Camozzato, atual deputado estadual no Rio Grande do Sul e candidato pelo Novo, tem como uma de suas principais bandeiras a privatização do Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae).
Em comparação com os outros três candidatos melhor colocados na corrida eleitoral, o plano de governo de Camozzato é o que tem propostas mais genéricas, sem aprofundamento sobre a forma como pretende executá-las. O documento, de 37 páginas, é dividido em quatro eixos: “Reconstruir, Fortalecer, Inovar e Libertar”.
O programa do candidato reconhece a responsabilidade antrópica das mudanças climáticas, mas não propõe ações de redução das emissões do município. Segundo ele, a Defesa Civil deve ser fortalecida, para “ser capaz de construir e executar planos de contingência com base em diferentes tipos de cenários de risco, como deslizamentos, enchentes, enxurradas, vendavais e tempestades”.
Ele também propõe investimentos em bacias de amortecimentos de cheias, redução de impostos e realocação de famílias que estão em zonas de risco. Além disso Camozzato também defende a implantação de um sistema de monitoramento com alertas em tempo real.
Seu plano de governo cita a palavra “enchente” 16 vezes e a palavra “clima” e derivados, como “climático”, 4 vezes. As palavras “meio ambiente” ou “sustentabilidade” não aparecem nem uma vez. Camazzoto está na 4ª posição da corrida eleitoral, com 7,8%, segundo pesquisa divulgada no último dia 30 pelo instituto AtlasItel.
Terceira colocada nas pesquisas, com 22,7% das intenções de voto, Juliana Brizola dedicou um capítulo inteiro de seu plano de governo ao tema das “Mudanças Climáticas e Infraestrutura”.
No documento, ela propõe recuperar e modernizar o sistema de proteção contra enchentes e criar um sistema de monitoramento de alerta integrado. Além disso, ela defende a atualização do plano diretor de drenagem urbana e a formulação de uma estratégia metropolitana de resiliência e adaptação às mudanças climáticas.
Também constam em seu plano de governo a implantação de projetos de infraestrutura verde para redução de ilhas de calor, a eletrificação da frota de ônibus e a criação de um departamento de resiliência e proteção contra as cheias.
O socorro a micro e pequenos empresários afetados pelas enchentes e redução de impostos para moradores de bairros afetados pelos eventos climáticos extremos também aparecem em suas propostas.
Em seu plano de governo, que tem 65 páginas, a palavra “enchente” aparece 16 vezes, a palavra “Ambiente” e derivações aparecem 7 vezes. A palavra “clima” e derivações aparecem 15 vezes e a palavra “sustentabilidade”, 10 vezes.
Maria do Rosário, deputada petista, dedicou grande parte de seu Plano de Governo à questão climática. Dentre os candidatos que estão melhor colocados nas pesquisas, ela é a que mais claramente reconhece as mudanças climáticas como uma realidade.
Segundo o Plano de Governo de Rosário, “a crise que vivemos não é um acaso, não é uma fatalidade. De um lado ela foi construída pelo negacionismo e imobilismo diante das mudanças climáticas, de outro pelo desmonte da gestão pública, desvalorização de seus peritos, técnicos e engenheiros. As lições deste momento nos exigem uma virada política, administrativa e cultural”.
Ela propõe a implementação de uma série de iniciativas para tornar Porto Alegre uma “cidade esponja”, de forma a melhorar o ciclo da água no planejamento urbano. Dentre as iniciativas, estão a recuperação de áreas verdes degradadas, ampliação da arborização urbana, reconfiguração da política municipal de coleta seletiva e de resíduos, ações para transição energética e investimentos em educação ambiental.
Rosário também propõe a formulação de um plano de contingência para enfrentamento de eventos extremos, criação de uma estrutura pública dedicada à drenagem e proteção, remoção de famílias que habitam áreas de risco, de forma consensual e reestruturação do Dmae.
Em seu Plano de Governo, que possui 55 páginas, a palavra “enchente” aparece 27 vezes, a palavra “clima” e variações, 17 vezes, a palavra “ambiente” e variações, 8 vezes, e a palavra “sustentabilidade”, 3 vezes. Maria do Rosário está em segundo lugar na corrida eleitoral, com 28,9% das intenções de voto, segundo pesquisa do AtlasIntel.
Sebastião Melo, atual prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição pelo MDB, dedica 16 das 27 páginas de seu Plano de Governo para enaltecer os feitos de sua gestão – que foi duramente criticada pelas falhas em conter as enchentes e pela forma como a prefeitura lidou com a tragédia.
Melo dedicou três páginas para falar em “Reconstrução e Adaptação Climática”, ressaltou o investimento de R$ 510 milhões em obras de reconstrução de drenagem e segurança hídrica e citou o plano de ação climática que seu governo começou a desenvolver em resposta às enchentes.
Ele promete medidas como a criação de um sistema de medição e alerta de riscos, a atualização do plano de contingência e a implementação de um centro de monitoramento e previsão do tempo. Também estão entre as propostas medidas tributárias de alívio aos afetados pelas enchentes, com descontos e isenções de tributos.
Em seu plano de governo, a palavra “enchente” aparece 15 vezes, a palavra “clima” e variações, também 15 vezes, a palavra “ambiente” e variações, 7 vezes, e a palavra “sustentabilidade”, 4 vezes. Melo lidera as pesquisas, com 32,4% das intenções de voto, segundo o AtlasIntel.
Segundo especialistas ouvidos pela Agência Pública, as propostas apresentadas pelos candidatos apresentam limitações, gerando dúvidas se as medidas serão efetivamente implementadas. Dentre as críticas feitas, estão a ausência de medidas de redução de emissões de gases de efeito estufa, falta de clareza sobre evolução das medidas com cenários de agravamento climático e ausência de detalhes sobre como medidas propostas serão financiadas e de fato implementadas.
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