Reportagens

Com queimada recorde, Lula anuncia criação da Autoridade Climática

Em evento em Manaus, presidente retira da gaveta a criação da Autoridade Climática, anuncia medidas contra a seca e defende que pavimentação da BR 319 tem que “ser sustentável”

Karina Pinheiro ·
10 de setembro de 2024

O presidente Lula anunciou no início da noite desta terça-feira (10), em Manaus (AM), a criação de uma Autoridade Climática, promessa de campanha. A declaração foi realizada na capital do Amazonas, após o presidente passar a manhã em visita às comunidades afetadas pela seca e pelos incêndios. 

“Nosso foco precisa ser a adaptação e preparação para o enfrentamento a esses fenômenos. Para isso, vamos estabelecer uma autoridade climática e um comitê técnico científico que dê suporte e articule implementação das ações do governo federal”, disse o presidente, que também anunciou a criação de um Comitê Técnico-Científico para apoiar e articular as ações do governo federal de combate à mudança do clima. O objetivo é  estabelecer as condições para ampliar e acelerar as políticas públicas a partir do Plano Nacional de Enfrentamento aos Riscos Climáticos Extremos. 

Lula também afirmou que enviará Medida Provisória para estabelecer o estatuto jurídico da Emergência Climática, o que deve acelerar a aplicação de medidas de combate a eventos climáticos extremos. Atualmente, apenas os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul não enfrentam seca. O país está na pior estiagem em 75 anos, segundo dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). 

Em relação às queimadas, até o dia 10 de setembro, foram registrados 167.452 focos de calor em todo país. Embora o número de focos seja menor que o registrado no mesmo período em 2023, 2022, 2021, 2020 e 2019, com a estiagem recorde, a qualidade do ar piorou e tem contribuído para que mais municípios decretem situação de emergência ou calamidade pública. Segundo o Sistema Integrado de Informações sobre Desastres, coordenado pelo Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, há hoje 1.418 municípios em situação de emergência ou calamidade pública.

“Estamos vivendo uma junção perversa de alguns fatores que criam esta situação. A mudança do clima está mudando o regime de chuvas, o período de seca e de cheia, como vocês estão observando. Uma hora chove demais, outra hora chove de menos”, disse hoje a ministra Marina.

Fonte: Programa Queimadas/INPE.

Visita às comunidades afetadas pela seca 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou ao Amazonas na noite de segunda-feira (09) para acompanhar de perto a situação da seca que afeta diversas regiões do estado. Durante sua visita, nesta terça-feira (10), ele anunciou ações para mitigar os impactos da estiagem e se comprometeu a implementar medidas de infraestrutura e apoio à população local.

Na manhã de terça, Lula visitou as comunidades Paraná do Manaquiri, em Manaquiri, e Campo Novo, no rio Curumitá, município de Tefé. Ele sobrevoou a área para avaliar os efeitos da seca e das queimadas. Durante a visita, o presidente anunciou a distribuição de 150 filtros de água com capacidade de purificação de até 5 mil litros por dia, destinados às comunidades afetadas.

BR 319

Ainda em Manaquiri, o presidente destacou a importância de um pacto entre o governo federal e estadual para avançar na conclusão da pavimentação da BR-319, estrada que conecta Manaus (AM) a Porto Velho (RO) por quase 900 km. Lula reforçou que é fundamental evitar o desmatamento e a grilagem de terras ao longo da rodovia e defendeu a necessidade de desenvolvimento sustentável na região. 

Lula voltou a falar no assunto de noite, já em Manaus, onde participou de uma cerimônia na Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) para anunciar investimentos de R$ 500 milhões em obras de dragagem e manutenção nos rios Amazonas e Solimões.

Antes de discursar, o presidente Lula assinou a ordem de serviço para início imediato dos trabalhos nos primeiros 20 quilômetros deste segmento da BR-319, chamado de Trecho C ou lote Charlie, que se estende do quilômetro 198 ao km 250, que antecede o Trecho do meio e possui licença ambiental. Nos próximos dias deve ser lançado edital para licitar as obras de mais 32 quilômetros, totalizando 52 quilômetros de asfaltamento.

O evento contou com a presença de mais de 50 prefeitos dos municípios amazonenses, estado que possui 62 municípios, dos quais 61 se encontram em estado de emergência por causa da seca. 

Visita a comunidade em Manaquiri (AM). Foto: Ricardo Stuckert / PR

Durante o anúncio, Lula enfatizou a relevância da BR-319 para o desenvolvimento da Amazônia, mas destacou que o projeto precisa ser conduzido com responsabilidade ambiental. Ele mencionou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, reforçando que ela apoia a construção da estrada, desde que ocorra de forma sustentável e com a preservação da floresta.

“Vamos reunir governadores, senadores, ministros e demais autoridades para destravar a BR-319 de forma planejada, garantindo o equilíbrio entre desenvolvimento e preservação ambiental”, garantiu.

A obra é defendida por políticos do Amazonas há mais de uma década. Ambientalistas apontam que a pavimentação já causa aumento da supressão vegetal junto à estrada, com construção de “ramais” – pequenas vias ilegais conectadas à principal e abertas em meio à floresta – que geram desmatamento pelo “efeito espinha de peixe”. Em 2023, mais de 5 mil km de ramais na BR foram abertos em quatro municípios do Amazonas, relatamos

Ação contra a seca

O presidente Lula também assinou durante o evento na sede da Suframa um decreto que regulamenta a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo. A medida define as responsabilidades do Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo e do Centro Integrado Multiagência de Coordenação Operacional Federal (Ciman).

O comitê será formado por ministérios, pelo Ibama, ICMBio, organizações da sociedade civil, representantes de povos indígenas e comunidades tradicionais, entre outros. O grupo será responsável por atividades consultivas e deliberativas de articulação, propor mecanismos para detecção e controle dos incêndios florestais, análise e acompanhamento das demandas referentes ao combate aos incêndios, entre outras medidas.

O Ciman é responsável por monitorar e articular ações de prevenção, controle e combate aos incêndios florestais. Competências do órgão incluem o monitoramento e a instalação de sala de situação para o acompanhamento das operações.

*Editado às 14h10, do dia 11 de setembro de 2024.

  • Karina Pinheiro

    Jornalista formada pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), possui interesse na área científica e ambiental, com experiência na área há mais de 2 anos.

Leia também

Colunas
3 de setembro de 2024

A fumaça que cobre o Amazonas esconde seus causadores

Falta clareza sobre os responsáveis pelas queimadas e posterior punição/controle para se evitar os incêndios. Estamos repetindo erros antigos

Notícias
25 de julho de 2024

Justiça Federal suspende Licença para reconstrução de trecho da BR-319

Licença prévia, emitida durante governo Bolsonaro, contraria 15 anos de reconhecimento de que obra é inviável ambientalmente, diz decisão da justiça

Notícias
20 de maio de 2024

Criação de novo órgão para combate à crise climática preocupa servidores ambientais

Possibilidade foi anunciada por Marina Silva no final de semana. Antes de criar novos órgãos, servidores pedem do governo valorização da carreira ambiental

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.