Reportagens

Raio X para a preservação das florestas tropicais do planeta

Um novo estudo revela 11% das florestas tropicais úmidas destruídas – uma área equivalente à soma das áreas da Espanha e da Suécia – podem ser restauradas de modo a impulsionar o clima e o meio ambiente

Peter Moon ·
3 de julho de 2019 · 5 anos atrás
Foto: Mariana de Fátima Ciríaco Mari Mari/Pixabay.

Grupo de pesquisadores de 14 instituições do Brasil, Alemanha, Argentina, Estados Unidos e da Austrália apontam em novo estudo quais são os hotspots de restauração em cinco continentes, onde as florestas revitalizadas proporcionariam os maiores custos-benefícios em termos de políticas para a captura de carbono atmosférico, garantia da qualidade das águas e preservação da vida selvagem.

“Restaurar as florestas tropicais é fundamental para a saúde do planeta, agora e para as próximas gerações” afirma o líder da pesquisa, o ecólogo brasileiro Pedro Henrique Santin Brancalion, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), da Universidade de São Paulo, em Piracicaba (SP). “Este é o artigo mais importante da minha carreira.”

O estudo “Global restoration opportunities in tropical rainforest landscapes”, publicado hoje na conceituadíssima publicação Science Advances, da Science, um grupo de 14 pesquisadores identificou mais de 100 milhões de hectares de florestas tropicais de baixa altitude espalhadas pela América Central e do Sul, África e Sudeste da Ásia, e que apresentam as oportunidades mais atraentes de restauração para superar o aumento global de temperaturas, poluição e escassez de água, e a extinção da vida vegetal e animal. Brasil, Indonésia, Madagascar, Índia e Colômbia têm a maior área acumulada ideal para restauração.

“Nosso estudo é o primeiro a determinar quais são aquelas regiões do planeta onde a restauração de florestas é mais viável em termos econômicos, e onde seus resultados serão mais duradouros e benéficos. Restaurar as florestas tropicais do planeta é uma obrigação e é factível.”

Os autores usaram imagens de satélite de alta resolução e as mais recentes pesquisas sobre os quatro benefícios florestais (biodiversidade, mitigação e adaptação às mudanças climáticas e segurança hídrica) e os três aspectos do esforço de restauração (custo, risco de investimento e a probabilidade de florestas restauradas sobreviverem no futuro) para avaliar todas as terras tropicais do planeta em blocos de 1 quilômetro quadrado que retiveram menos de 90% de sua cobertura florestal.

Mata com fileiras de mudas. Foto: Pedro Brancalion.

“O estudo identificou os hotspots ideais para restauração florestal como sendo aquelas que obtiveram as pontuações mais elevadas, o que significa que restaurar tais áreas atingiram os maiores benefícios em termos ambientais, e ao mesmo tempo envolveria os projetos menos dispendiosos e menos arriscados em termos de sucesso de preservação no longo prazo,” diz Brancalion.

Os 15 principais países com os maiores hotspots de restauração foram encontrados em todos os biomas ou zonas florestais tropicais. Há três países nas regiões tropicais das Américas, cinco na África e sete no sudeste asiático e Australásia.

Os cinco países detêm os maiores hotspots (por área) identificados como ideais para restauração florestal. São eles o Brasil, a Indonésia, a Índia, Madagascar e a Colômbia. Já os seis países com maior pontuação individual na pesquisa ficam todos na África: Ruanda, Uganda, Burundi, Togo, Sudão do Sul e Madagascar.

“Ficamos surpresos ao encontrar tal concentração de países altamente classificados em um único continente. O estudo realmente destaca o alto potencial para resultados bem-sucedidos de restauração de florestas tropicais nesses países africanos,” diz Robin Chazdon, a coautora do trabalho e pesquisadora do Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da Universidade de Connecticut, nos Estados Unidos.

Cerca de 87% dos hotspots para restauração foram encontrados dentro de regiões prioritárias para a conservação da biodiversidade, quais sejam, áreas que mantêm altas concentrações de espécies não encontradas em nenhum outro lugar, mas apresentam alto risco de desmatamento.

73% dos locais de restauração foram encontrados em países que fizeram compromissos de restauração como parte do Desafio de Bonn, uma iniciativa lançada em 2011 pelo governo da Alemanha e pela União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN) para restaurar 150 milhões de hectares de terras desmatadas e degradadas até 2020 e 350 milhões de hectares até 2030.

Reflorestamento. no morro da Babilônia, no Rio de Janeiro. Foto: Daniele Bragança.

“É encorajador que tantos pontos estejam localizados em países onde a restauração de florestas e paisagens já é uma prioridade”, observa Brancalion.

Na maioria dos casos, os hotspots de restauração se sobrepõem aos campos e pastagens atualmente em uso pelos agricultores. Como resultado, o estudo mostra que a restauração de florestas é mais viável em terras de baixo valor para a produção agrícola.

Alternativamente, os pesquisadores argumentam que a restauração pode ser associada a formas de produção geradoras de renda, por exemplo, enriquecendo pastagens com árvores, colhendo produtos de origem florestal, ou cultivando café ou cacau sob um dossel florestal. Quaisquer decisões sobre mudanças no uso da terra devem envolver totalmente as comunidades locais, uma vez que a restauração deve complementar ao invés de competir com a segurança alimentar e os direitos à terra.

“A restauração envolve muito mais do que simplesmente plantar árvores. Ela começa com a necessidade de acordos mutuamente benéficos com aqueles que atualmente usam a terra,” diz Chazdon.

“Promessas e acordos como o Desafio de Bonn lançado em 2011 e a Declaração de Nova York sobre Florestas, de 2015, mostram que há vontade de restaurar e proteger as florestas,” diz Brancalion.

“Com a ferramenta que desenvolvemos, países, empresas e outros atores que se comprometeram a restaurar as florestas, têm as informações precisas de que precisam para arregaçar as mangas e mergulhar no difícil trabalho de trazer nossas florestas de volta, antes que seja tarde demais.”

 

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  • Peter Moon

    Peter Moon é um repórter científico, historiador da ciência e pesquisador da história natural da América do Sul

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Comentários 1

  1. George diz:

    "Na maioria dos casos, os hotspots de restauração se sobrepõem aos campos e pastagens atualmente em uso pelos agricultores."

    Causa espanto que a Science Advances tenha publicado esse "estudo". A área que eles definiram inclui áreas de pecuária! Quem vai comprar fazendas e tirar os bois para reflorestar?

    E no caso de áreas degradadas que já foram floresta, como o Vale do Paraíba e a velha Trans-Amazônica, eles tem noção do custo de restaurar a fertilidade do solo para que possam voltar a crescer árvores? Tem noção do custo por hectare de fazer isso?

    Isso tudo não passa de um estudo hipotético, sem fundamento na realidade.