Nem sempre é mérito ou culpa dos governantes, mas o fato é que alguns presidentes do nosso país foram o que pode ser qualificado como amigos das áreas protegidas, enquanto outros parecem ter tido ojeriza à natureza. Vale lembrar-se de fatos interessantes ou curiosos sobre este assunto, fazendo referência exclusiva à categoria de Parques Nacionais, as mais importantes de todas as unidades de conservação.
Como é bem conhecido, o primeiro Parque Nacional do Brasil foi Itatiaia, criado por Getúlio Vargas em 1937, quando era ditador, embora André Rebouças tenha pedido a criação de Parques Nacionais em 1876 e Santos Dumont em 1916. Getúlio criou mais dois Parques Nacionais em 1939: Iguaçu (proposto por Dumont) e Serra dos Órgãos. Assim começava a nossa história sobre estas áreas protegidas. De 1939 até 1959 nenhum outro foi estabelecido. Ficamos, pois, duas décadas sem assistir a criação de Parques Nacionais. Em 1959 começou outra boa safra de Parques Nacionais com o estabelecimento de Aparados da Serra, Araguaia e Ubajara. Tanto os presidentes Juscelino Kubitschek como Jânio Quadros foram generosos com um novo surto de estabelecimento de Parques Nacionais, a grande maioria em 1961 e alguns até mesmo no mesmo dia.
Outros foram florescendo e o único presidente àquela época que não assinou nem mesmo um foi Ernesto Geisel, embora no seu governo os Parques Nacionais e a fauna silvestre do país obtivessem os primeiros avanços de pessoal, recursos financeiros e efetivação no campo de áreas protegidas. Seu Ministro da Agricultura era Allison Paulinelli, que havia sido meu professor na Universidade Federal de Lavras (UFLA) e, assim mesmo, não obstante toda minha insistência, não quis levar ao então presidente os decretos de novos Parques Nacionais. Por outro lado, deu o troco ao fornecer o apoio necessário para a efetiva implantação de Parques Nacionais.
Com o Presidente João Figueiredo tivemos em 1979 um novo boom, com a criação de muitos Parques Nacionais, na Amazônia principalmente, pois até aquele momento só havia o Parque Nacional da Amazônia estabelecido em 1974, por indicação do projeto Radam Brasil. A Amazônia era então um enorme vazio de áreas protegidas. Mas, em 1979, num dia só, foram estabelecidos 8 milhões de hectares de Parques Nacionais na Amazônia, Reservas Biológicas também no bioma amazônico, a primeira área protegida marinha, a Reserva Biológica de Atol das Rocas, e dois Parques Nacionais no Nordeste. No total, é possível que estes feitos tenham sido inéditos na história mundial. Além do mais, foi aprovado o primeiro Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil e foi assinado o Regulamento Geral dos Parques Nacionais. De 1979 a 1982 surgiram dois outros Parques Nacionais e foi publicada a segunda etapa do Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil.
Também entre 1979 e 1982, compraram-se dois milhões de hectares de Parques Nacionais e Reservas Biológicas com os recursos do Fundo de Reposição Florestal. Em seguida, essa prática fundamental da regularização fundiária foi abandonada, fato que deu origem ao justo descontentamento dos produtores rurais afetados. Neste período, outro ganho foi a conclusão e publicação dos primeiros planos de manejo de Parques Nacionais.
Regimes, partidos e indivíduos.
“A atual Presidente poderia deixar também uma marca mais favorável à conservação da natureza se tornasse o SNUC parte integrante do Programa de Aceleração do Crescimento”
|
O Presidente Sarney seguiu esse impulso e estabeleceu muitas áreas protegidas, das quais a mais famosa fosse o Parque Nacional do Grande Sertão Veredas.
O Presidente Collor criou um único parque: o Parque Nacional da Serra Geral. Em seguida, o Presidente Fernando Henrique Cardoso criou várias áreas, entre elas a de maior extensão no Brasil, o Parque Nacional do Tumucumaque.
O Presidente Lula se destacou entre os presidentes que mais criaram Unidades de Conservação, entre elas Parques Nacionais, embora a grande maioria tenha sido de uso direto dos recursos naturais e concentradas na Amazônia. Mas, ao mesmo tempo, no período de Lula começou o processo de eliminação, mudança de categoria, dupla afetação e redução de áreas que, como já é bem conhecido e até já foi aqui publicado, fez o Brasil perder cinco milhões de hectares de áreas protegidas de uso indireto dos recursos naturais nas duas últimas décadas.
Resta-nos analisar o período atual, do mandato da presidente Dilma Rousseff. De 2011 até hoje, ela não estabeleceu qualquer Parque Nacional na Amazônia. Dilma criou dois parques novos, o Parque Nacional Marinho da Ilha dos Currais e o Parque Nacional da Furna Feia, o único do Rio Grande do Norte.
A presidente Dilma tem se recusado a assinar o esperado Parque Nacional de Guaricana, com 45 mil hectares, localizado no estado do Paraná, em plena Mata Atlântica. Todos nós estávamos aguardando ansiosamente a criação deste Parque Nacional no Dia Mundial do Meio Ambiente, mas nada aconteceu. Ao contrário de outras épocas, o que se assiste hoje é a reiterada iniciativa, quer seja do Ministério de Minas e Energia, ou do eterno Ministério da Agricultura, ou dos Legislativos quer federais, quer estaduais, de permitir atividades de uso direto dos recursos naturais nas áreas protegidas. Se não conseguem permiti-las, mudam a categorias de manejo, das mais restritas para as menos restritas, extinguem Parques, pedem mudanças de limites, em geral para construir hidrelétricas, ou linhas de transmissão, ou para minerações ou estradas.
Não são fatos novos, pois o Brasil já assistiu a extinção do Parque Nacional de Sete Quedas em 1981 para dar lugar à hidrelétrica de Itaipu. Nas últimas décadas, a conservação da natureza está perdendo todas as batalhas contra o desenvolvimento desenfreado, sob os olhos de nossos políticos, que nada fazem para evitar o pior. Do outro lado, é necessário dizer que vários presidentes membros de partidos políticos opostos e até de regimes políticos distintos, como os presidentes Getúlio Vargas, Juscelino, Jânio, Figueiredo, Fernando Henrique e Lula foram sensíveis às suas obrigações para com a natureza.
A conservação da natureza não pode esquecer seus benfeitores, a despeito de regime ou partidos políticos. O último presidente da ditadura, Figueiredo, destacou-se na criação de áreas protegidas. Seus feitos na área, a meu ver, não devem ser apagados devido ao regime que presidia, pois Parques Nacionais e fauna silvestre em qualquer situação são responsabilidades do Estado.
A atual Presidente poderia deixar também uma marca mais favorável à conservação da natureza se tornasse o SNUC parte integrante do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), pois este programa não poderá ser chamado de sucesso sem a adequada conservação da natureza.
Leia Também
Parque Nacional do Iguaçu, alvo preferido das autoridades
Mais unidades de conservação para Goiás
Campeonato de redução das unidades de conservação
Leia também
Entrando no Clima#41 – COP29: O jogo só acaba quando termina
A 29ª Conferência do Clima chegou ao seu último dia, sem vislumbres de que ela vai, de fato, acabar. →
Supremo garante a proteção de manguezais no país todo
Decisão do STF proíbe criação de camarão em manguezais, ecossistemas de rica biodiversidade, berçários de variadas espécies e que estocam grandes quantidades de carbono →
A Floresta vista da favela
Turismo de base comunitária nas favelas do Guararapes e Cerro-Corá, no Rio de Janeiro, mostra a relação direta dos moradores com a Floresta da Tijuca →