Sempre admirei zoológicos e aquários públicos. É meu entendimento que os animais nessas instituições exercem a função de embaixadores de suas respectivas espécies. Quantos conservacionistas de hoje não iniciaram sua paixão pela vida selvagem graças a terem se divertido em um zoológico quando crianças? Quantas pessoas terão a oportunidade de estar frente a frente com um gorila, ou observar os detalhes da pele de uma cobra venenosa? Pelo menos, de forma barata e segura? Mesmo assim, me pergunto quantas pessoas fazem a conexão entre o animal em cativeiro e seu habitat natural. Eu acredito que a associação é importante para que haja conscientização ambiental plena.
Vivemos desassociados do mundo natural. Outro dia, na Ilha Grande, me deparei na trilha com uma família apavorada com uma galinha que cruzava seu caminho. Tive de explicar que a ave não mordia. Voltei para casa com uma idéia fixa: associar minha ONG, o Instituto Araguaia, que trabalha com animais em seu habitat natural, a diversos zoológicos ao redor do mundo. Esse projeto não envolve repasse de recursos entre as partes, apenas requer que as instituições aceitem exibir em telão, ao lado do cativeiro, as imagens do habitat natural dos animais a ele associados, a fim de que o público venha a entender a necessidade de se conservar o mundo lá fora. Do lado de cá, nossa ONG se encarrega do que for necessário para garantir a transmissão das imagens.
A idéia foi recebida com entusiasmo por diversas instituições, e tive a oportunidade de visitar os Zoológicos de Frankfurt, Dortmund, Miami, Washington e os aquários de Baltimore, Genova, e Barcelona. Fiquei encantada com o que vi, tanto em termos de bem-estar animal quanto em termos da educação ambiental que essas instituições promovem aos visitantes, em especial às crianças.
Contraste
“Sem nada para distraí-los, os orangotangos lhe pareceram deprimidos e, enquanto ela estava lá, espremidos em um cubículo de concreto (…)”
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Um tempo depois resolvi visitar o Zoológico do Rio de Janeiro. Uma grande amiga me disse para não ir. “Você vai se aborrecer” – disse–me ela em tom de alerta – “Eu estive lá recentemente e vi muito sofrimento”.
Ouvi casos de animais grandes demais para jaulas minúsculas e sujas, e de animais neuróticos e deprimidos. Enquanto ouvia, minhas condolências iam para aqueles pobres seres aprisionados, personagens inocentes de uma estória de horrores.
O que mais me chamou a atenção, e me levou a escrever essa coluna, foi o fato de não poder contra-argumentar que o orçamento do zoológico do Rio não deve chegar aos pés de outros no “mundo desenvolvido”. No caso dos orangotangos, por exemplo, seu local é um ambiente desprovido de brinquedos. Segundo minha amiga, que trabalha em um zoológico na Alemanha, bastava a instalação de pneus, balanços, ou outros artefatos de baixíssimo custo para exercitar e tirar a monotonia dos primatas. Sem nada para distraí-los, os orangotangos lhe pareceram deprimidos e, enquanto ela estava lá, espremidos em um cubículo de concreto tentando sair do sol no “Rio 50 graus” daquele dia. E concluiu: “Com carinho e pouco investimento se faria uma grande diferença”.
Ano passado, uma voluntária em nossa base de pesquisas era uma especialista em criar brinquedos para evitar depressão e neuroses em lontras e peixes no Aquário de São Paulo. Sei também que o Zoológico de Sorocaba tem sido elogiado por garantir o bem-estar dos bichos. Mas perante a narrativa de minha amiga, senti – como em tantas frentes ultimamente – vergonha de meu estado.
Garantir o bem-estar dos animais é um dever de qualquer zoológico. Caso contrário, não passam de verdadeiros campos de concentração idênticos aqueles que um dia foram a vergonha da Europa. Aprender com a história é isso: perceber que não se pode fazer com os animais aquilo que não mais aceitamos que façam com a nossa própria espécie.
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