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Publicado originalmente por Observatório do Clima
A reunião preparatória da UNFCCC (Convenção do Clima da ONU), em Bonn, teoricamente a penúltima antes da conferência de Paris, é uma espécie de conferência do clima em miniatura. É uma seleção das mesmas pessoas num ambiente mais acessível e menos espalhado fisicamente. Desta vez ela não acontece no plenário do parlamento da finada Alemanha Ocidental, que teve sua capital nesta cidade. A reunião da ONU ocupa um recém-inaugurado, mas menos charmoso, centro de convenções.
Os assuntos estão sendo afunilados e há um clima (ah, o clima!) menos conflitivo do que o habitual. Várias das negociações paralelas que constituem a grande negociação parecem estar avançando, embora isso não tenha necessariamente a ver com o resultado final para o planeta. Todos já dão de barato que o acordo de Paris, com seu conjunto de INDCs – as metas de fato voluntárias dos países – ficará ainda bem aquém do necessário para limitar o aumento da temperatura média do planeta, neste século, a 2o C. Ressurge a discussão de que deveria ser 1,5o C. Concordo em gênero, número… e grau. Mas e aí?
Essa diferença, ou “the gap”, no jargão onuês, permanecerá, um pouco maior ou um pouco menor. Por mais o que boletim diário das ONGs, o ECO, exorte: “Paris não pode ficar no mínimo denominador comum!”, isso é exatamente o que sempre foi e continuará sendo o processo da UNFCCC. Na medida em que requer que todas as decisões sejam tomadas pelo consenso dos 196 governos ali representados, continuará sendo, por sua natureza, o mínimo denominador comum ou, para usar uma imagem dos anos 1960 de Che Guevara: “A velocidade da guerrilha é aquela do homem mais lento da tropa”.
Quem será o homem mais lento? O Canadá, de Steven Harper, um quase negacionista climático? A Austrália, de Tony Abott, que tem a mais alta emissão per capita e liquidou a taxa de carbono instituída pelos trabalhistas? A Arábia Saudita? A Rússia? Todos têm pronto seu discurso mostrando o muito que já fizeram em termos de mitigação de emissões de efeito estufa. No fundo, não é esse o ponto. Se a UNFCCC é, inevitavelmente, o mínimo denominador comum, é importante ele seja o mais alto possível, tornando o “gap” menos obeso.
A partir daí, pelos próximos cinco anos, se for aceita a sensata proposta dos “rachets”, revisões quinquenais de metas dos países, decisiva será a concertação voluntária de grupos de países, empresas, ONGs, os “clubes climáticos” dispostos a uma ação adicional e, sobretudo, – esse é o ponto vital – uma “Bretton Woods do baixo carbono”: a criação de mecanismos econômicos que movam os trilhões necessários para a transição rumo a economias limpas.
Nesse sentido, o ponto mais frágil do processo negociador é o ponto F: Finance. Ali predomina essa ilusão de que governos irão – porque moralmente constrangidos – passar recursos para outros governos por intermédio do Fundo Verde do Clima. Na melhor das hipóteses, esse fundo chegará em 2020 com US$ 100 bilhões anuais. Ninguém seriamente acredita que isso irá acontecer. E, mesmo que venha a acontecer, seria ridiculamente pouco! Só na transição energética é necessário US$ 1 trilhão de dólares por ano. O FVC aportaria para mitigação 5% disso (os outros 50 bi teriam que ir para adaptação, para o qual o fundo é melhor formatado, ainda que crucialmente lhe faltem os governos locais).
Então de onde virá o dinheiro? Dos governos? Os governos estão na lona, quase todos apresentam déficits e dívidas internas (e as vezes externas) consideráveis. O dinheiro do mundo está no sistema financeiro internacional: US$ 300 trilhões nos bancos de investimento, fundos de pensões e outros variados numa infinidade de aplicações que na sua imensa maioria guardam pouca relação com a economia real e tendem a multiplicar “bolhas” especulativas como aquela de 2008. A bolsa de Xangai, na sua penúltima queda, perdeu, em dois dias, US$ 3,5 trilhões!
É essa a questão crucial que não é discutida senão muito perifericamente nas conferências do clima. Não há impasse tecnológico para a transição para economias de baixo carbono, mas há um “buraco negro” de financiamento que evidentemente faz parte do mesmo quebra-cabeças político que mantém viva a pobreza extrema em boa parte do mundo. O primeiro passo para enfrentar esse impasse é reconhecer que que a emissão de carbono precisa ser taxada e que a sua redução, as ações de mitigação, constituem valor. Num mundo seriamente ameaçado de catástrofes climáticas inenarráveis, a redução de carbono terá de tornar-se o novo “padrão ouro”.
Veja aqui e aqui vídeos que postei sobre o tema.
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