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Empresas ainda veem com ceticismo a “Lei Rouanet da Reciclagem”, recém regulamentada

Como obstáculos, instituições representativas do setor mencionam pouca transparência e dificuldade de acesso aos recursos anunciados, além de ausência de toda a cadeia produtiva

Elizabeth Oliveira ·
24 de julho de 2024

O clima em empresas recicladoras ainda tem sido de ceticismo quando o assunto envolve o Decreto 12.106, popularmente chamado de “Lei Rouanet da Reciclagem”. Assinado há duas semanas, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, essa iniciativa veio para regulamentar o incentivo fiscal à cadeia produtiva da reciclagem, conforme estabelecido na Lei 14.260 de 8 de dezembro de 2021.

Para impulsionar uma cadeia produtiva que enfrenta uma grave crise econômica ditada pela desvalorização dos preços dos materiais recicláveis e pela alta demanda por matérias-primas virgens para a fabricação de embalagens de papéis, plástico e vidro, entre outros, como ((o))eco tem mostrado desde março, o decreto prevê R$ 300 milhões em benefícios tributários concedidos pelo Ministério da Fazenda por intermédio do Ministério de Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). 

“O decreto não contempla toda a cadeia da reciclagem, deixando de fora as empresas processadoras, as que mais investem em tecnologia, máquinas e equipamentos. As recicladoras são responsáveis por todos os materiais reciclados que chegam à indústria de transformação”, argumenta  o presidente do Instituto Nacional da Reciclagem (Inesfa), Clineu Alvarenga. Ele está à frente de uma instituição que reúne processadores de materiais como ferro, papel, vidro, plástico e alumínio. Para ele, o decreto serve somente para cooperativas, pequenos empreendimentos e para a indústria.

Embora a intenção do governo seja avaliada como positiva, o cenário parece desafiador para João Paulo Sanfins, vice-presidente da Associação Nacional dos Aparistas de Papel (Anap). Para ele, a medida “é pouco transparente e o acesso aos recursos será muito difícil”. Sanfins ressalta que para as empresas terem direito aos recursos, será necessário “apresentar ao governo projetos que estimulem atividades de reciclagem, ter os projetos aprovados e ainda convencer as empresas e pessoas físicas a doar recursos”. 

O vice-presidente da Anap exemplifica que o decreto determina que o incentivo fiscal às empresas terá o limite de “um por cento do imposto devido, o IRPJ [Imposto de Renda de Pessoa Jurídica], em cada período de apuração trimestral ou anual” e opina que seria mais adequado liberar linhas de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com juros subsidiados, o que “fomentaria muito mais a cadeia de reciclagem”, afirma.

A que se destina o incentivo fiscal à reciclagem do Decreto 12.106

  • Capacitação, formação e assessoria técnica, inclusive para a promoção de intercâmbios, nacionais e internacionais;
  • Incubação de microempresas, de pequenas empresas, de cooperativas e de empreendimentos sociais solidários;
  • Pesquisas e estudos para subsidiar ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;
  • Implantação e adaptação de infraestrutura física de microempresas, de pequenas empresas, de indústrias, de cooperativas e de associações de catadores;
  • Aquisição de equipamentos e de veículos pelas cooperativas e pelas associações de catadores;
  • Organização e apoio a redes de comercialização e de cadeias produtivas, integradas por microempresas, pequenas empresas, cooperativas e associações de catadores;
  • Fortalecimento da participação dos catadores nas cadeias de reciclagem;
  • Desenvolvimento de novas tecnologias para agregar valor ao trabalho de coleta de materiais reutilizáveis e recicláveis.

Acesse o decreto na íntegra aqui.

  • Elizabeth Oliveira

    Jornalista e pesquisadora especializada em temas socioambientais, com grande interesse na relação entre sociedade e natureza.

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