
O sumiço estratégico dos representantes de órgãos oficiais acabou abrindo espaço para mais críticas e promessas de resistência à construção da barragem. Marcos Apurinã, coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, comentou que povos indígenas reforçarão o movimento contra Belo Monte. “Nem que seja o último índio, não deixaremos isso acontecer, dentro ou fora de terras indígenas. Se o governo Lula diz que o Brasil é um país de todos, mas não quer nos ouvir, paciência, também não ouviremos ninguém”, ressaltou.
Procurador da República no Pará desde 1996, Ubiratan Cazeta comentou que o projeto de Belo Monte navega sobre uma “geração energética fantasiosa” e que o Estado brasileiro “vive de aparências” quando o assunto é ouvir a sociedade e avaliar alternativas à usina, que acabará com a Volta Grande do rio Xingu. “Os prometidos 11 mil megawatts de energia serão gerados por cerca de quatro meses no ano. Como garantir que Belo Monte não seja o início de outros aproveitamentos no rio Xingu para viabilizar seu funcionamento? Falta seriedade quando se fala que as alternativas a Belo Monte são termelétricas. Temos potencial de novas tecnologias em implantação, temos discussões sobre repotenciação do parque hidrelétrico já implantado e sobre as perdas de energia acima das médias internacionais em linhas de transmissão e subestações”, disse.
Cazeta também lembrou que os projetos de Belo Monte, de cinco usinas para o rio Tapajós e duas termelétricas, tudo previsto para o Pará, precisam ser pesados frente às metas para corte de emissões de gases-estufa que o Brasil assumiu e levará à conferência climática de Copenhague. “Quê isso significa para o país? E o desmatamento com toda essa migração? A população na área da obra também deve dobrar, mas o estudo nada cita sobre emissões de gases de efeito estufa. Se temos metas de redução, temos que ter um modelo de desenvolvimento mais adequado. Enquanto essa discussão não for travada, o licenciamento vai gerar processos judiciais a cada passo”, questionou.
Segundo o próprio Estudo de Impacto Ambiental de Belo Monte, serão atraídas para a região mais de 100 mil pessoas, agravando o desmatamento, a pesca e a caça ilegais, além da exploração madeireira e garimpeira. O lago da usina deve alagar cerca de 51 mil hectares de floresta.
Também procuradora da República, Deborah Duprat comentou que os licenciamentos federais tem sido subvertidos por fatores como pressões políticas e econômicas e má qualidade dos estudos de impactos, levando a um aumento no número de condicionantes a cada etapa dos processos – licença prévia, de instalação e de operação. “O que deveria ser estudade e diagnosticado previamente vira condicionante, até que o projeto esteja concluído. Isso é uma subversão do licenciamento”, ressaltou.
“Todos os quarenta especialistas que avaliaram as 18 mil páginas do estudo de impacto de Belo Monte também concluíram que o projeto é uma desfiguração do licenciamento. Como maior obra do PAC, deveria ser um exemplo de condução do licenciamento e das discussões públicas, mas a realidade é outra”, arrematou o professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP Francisco Hernandez, um dos coordenadores do painel de engenheiros, sociólogos, antropólogos, biólogos, ecólogos e cientistas políticos que analisou o projeto federal.
Saiba mais:
Beleza roubada
Manifesto robusto contra Belo Monte
Belo Monte, goela abaixo não
Carnaval na floresta
Biblioteca
Resumo executivo do painel de especialistas que analisou o Estudo de Impacto Ambiental de Belo Monte
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