Neste mês de maio a Universidade Federal do Amazonas (Ufam) apresentou 57 indicadores ambientais que atestam um bom estado de conservação nos 420 quilômetros que separam as cidades de Coari e Manaus, ao longo da calha dos rios Negro e Solimões. Este é um dos resultados do projeto Piatam, sigla que significa Potenciais Impactos e Riscos Ambientais na Indústria do Petróleo e Gás no Amazonas. Desde 2000, a iniciativa se propõe a elaborar um plano de controle ambiental e análise de riscos ecológicos decorrentes do transporte de petróleo no estado. Em seis livros são apresentadas as demais pesquisas sobre esta região, que muito em breve será cortada por um gasoduto.
Além de um volume com os indicadores, as publicações trazem espécies da vegetação encontrada em nove localidades afetadas pelo empreendimento, um inventário de peixes de lagos do médio Solimões, pesquisas sobre uso de recursos naturais, um estudo sobre a memória da região e um levantamento sócio-demográfico, com atlas incluído.
Para o professor Pedro Ivo Soares Braga, a região está bem preservada porque as atividades dos ribeirinhos são de baixo impacto. “O sistema pouco intensivo de agricultura, com rotatividade de área, permite que a várzea se regenere”, explica. Braga estudou a vegetação em um raio de três quilômetros ao redor de cada uma das comunidades que serão afetadas pelo transporte de combustível. E pretende continuar monitorando a área para fazer novas avaliações de acompanhamento. “Daqui para frente, com os indicadores, vou poder dizer como vai variar a situação”, avisa.
Mas pelo menos dois indicadores já requerem atenção. De acordo com os estudos, foi registrada uma pequena quantidade de larvas de peixes importantes para a economia e sustento dos moradores da região, além da presença de substâncias tóxicas na ictiofauna de alguns lagos. Segundo o biólogo Rosseval Leite, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), tambaquis e matrinchãs não estão se reproduzindo como deveriam. E a causa é a pesca excessiva dessas duas espécies. Outro problema é a possibilidade de contaminação de alguns lagos por substâncias tóxicas espalhadas por terra, como herbicidas, ou em pequenas embarcações.
Prevenção
A iniciativa, provocada diretamente pela iminência da instalação de um grande empreendimento, serviu de motivação para que o estado conhecesse mais as características da área. “Cruzando os dados sobre solo e sócio-economia, por exemplo, a gente pode detectar se existe algum problema com o uso de agrotóxicos”, opina a biblioteconomista e professora da Ufam, Kátia Cavalcante, que coordenou a edição dos livros. “A gente pode apontar se uma política pública de distribuição de agrotóxicos está tendo efeitos sobre o meio ambiente”, completa.
Mas tão importante quanto conhecer a região é saber o que fazer em caso de acidentes. “Se houver um derramamento, várias medidas vão ser tomadas, entre elas a busca do retorno ao estado anterior ao impacto. Outra é remediar o impacto”, explica o professor Alexandre Rivas, coordenador do projeto. A prevenção também protege a própria Petrobras, evitando que a empresa seja responsabilizada por danos que não foram provocados por ela. “É o que ela não tinha quando aconteceu o acidente na Baía de Guanabara, em 2000. Eles não tinham informações sobre o estado anterior ao vazamento”, afirma Kátia.
Riscos e cuidados
Cerca de 56 mil barris de petróleo são produzidos por dia nas plataformas de Petrobras no rio Urucu, no coração da Amazônia. E para chegar à refinaria mais próxima, em Manaus, este óleo precisa percorrer 650 quilômetros, em dutos e navios. O principal risco são os cursos d’água existentes na área, que podem rapidamente espalhar a mancha de óleo. “É preciso levar em conta o ciclo hidrológico, a subida e descida dos rios, e que a população que vive ali depende dos recursos destes rios”, afirma Rivas.
Com base nos resultados do Piatam, a Petrobras elaborou um mapa de sensibilidade ambiental ao longo da calha dos rios. O impacto potencial de um derramamento de óleo foi classificado em dez níveis, que representam desde estruturas artificiais, menos vulneráveis, a florestas inundáveis, consideradas as mais sensíveis. “Hoje, estamos estudando 11 comunidades em que o impacto seria maior, afirma o coordenador técnico da Petrobras para o projeto, Fernando Pellon.
As pesquisas servem também para prever o comportamento do trajeto de uma mancha de óleo em caso de vazamento. Os dados são aferidos durante simulações feitas pela companhia, usando pipoca, que segundo Pellon quando jogada na água se comporta de maneira semelhante ao óleo.
* Vandré Fonseca é jornalista em Manaus.
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