A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, resolveu primeiro classificar o Programa Pantanal de “herança maldita” e agora, dois anos e lá vai pedrada depois, o classifica de “contra os interesses do país”.
Como, senhora ministra, um programa que levou quatro anos de elaboração, com o governo brasileiro, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e uma plêiade de consultores, finalmente é classificado contra os interesses da nação? Um Programa que era para fazer saneamento básico em vários municípios pantaneiros, para limpar o Cuiabá da poluição orgânica, um programa para proteger as nascentes dos rios que fluem para o Pantanal, um programa para implementar várias unidades de conservação e áreas protegidas e para preparar esta região única para o ecoturismo, pode ser assim classificado?
Talvez seja assim denominado pelo atual governo pelo montante dos recursos, pois dizem que seria o mais caro e ambicioso projeto ambiental da história do Brasil, o que absolutamente não é verdade (ou a despoluição do Tietê e o Programa Nacional de Meio Ambiente, do Banco Mundial, não tratam de meio ambiente?), ainda mais considerando que seria realizado em quatro anos. Interessante, pois o programa foi orçado para um empréstimo de US$ 82,5 milhões e considerando-se a necessária contrapartida do governo brasileiro chegaria em US$ 165 milhões. Talvez, também, algumas exigências do órgão financiador, o BID, fossem, como sói acontecer, consideradas draconianas, mas para isso existem, tão propalados pelo atual governo, diálogo e negociações. Além do mais o Brasil poderia negociar critérios que mais lhe aprouvessem.
Mas não, o atual governo matou o Programa Pantanal e pronto! É verdade que ele fora idealizado e preparado pelo governo anterior e este fato, por si só, poderia ser recebido pelo atual governo como algo contra os interesses da nação.
Enganou-se o atual governo em muitas coisas. Começando pelo aspecto político: o próprio governador de Mato Grosso do Sul, do mesmo partido governista, no começo abraçou o Programa Pantanal.
Se tivesse sido implementado, mesmo que parcialmente, nestes quase três anos do atual Governo, o Programa Pantanal já poderia ter trazido grandes avanços, como o estabelecimento de unidades de conservação, infra-estrutura turística, treinamento, educação ambiental e até talvez já apresentar uma melhoria de qualidade das águas que fluem para o Pantanal, a maior área úmida da Terra, objeto de interesse do mundo ambientalista, do comércio, da indústria do turismo e do social.
Oportunidade perdida
Agora os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul discutem a necessidade de uma moratória para a pesca, esquecendo-se que só a moratória não trará nem mais peixes, tampouco mais turistas. Para se ter mais peixes é necessário que se protejam as nascentes dos rios, que se evitem o assoreamento e a erosão, os incêndios, a poluição, principalmente a orgânica, que se evitem barramentos, que se garanta a vazão natural dos rios e finalmente que se fiscalize a pesca predatória.
Assim o Pantanal, tão cantado em músicas e versos, tema de novelas e filmes, perdeu uma enorme e oportuna chance de começar a proteger seus atributos naturais, motivo de tamanha fama e riqueza.
Agora o Governo e a ministra Marina parecem que querem começar a ressuscitar o Programa Pantanal. Um pouco tarde demais, diga-se de passagem. Mas, por que será que estão querendo recomeçar de novo? Será pelos enormes incêndios que a região vem assistindo? Será para contrabalançar as dezenas de hidroelétricas previstas? Ou ainda o estabelecimento de usinas de cana-de-açúcar? Ou a enorme seca que deixa como rastro animais mortos para todos os cantos e uma feiúra sem precedentes nessa região outrora tão bela?
Seja qual for o motivo ou os motivos, é um pouco tarde depois que o país já gastou US$ 4,5 milhões em consultorias e não sei mais o quê, sem que o Programa saísse do papel.
O Programa Pantanal preparado no governo anterior foi considerado faraônico pelo atual, suponho que pelo custo. Mas este mesmo Governo comprou um avião presidencial caro de US$ 56 milhões de dólares, que tem uma vida útil definida, enquanto o Pantanal, se fosse protegido, lá estaria para sempre. Faz hidroelétricas de bilhões de dólares e nos faz ir para um referendo de US$ 200 milhões para referendar o que já estava decidido.
Caro ou barato, a curto ou médio prazo, salvar o Pantanal é tarefa para estadistas e para visionários que podem perceber que, se a região fosse protegida, garantiria por séculos uma entrada de recursos muito superior aos míseros US$ 165 milhões de dólares previstos para os quatro anos do Programa Pantanal, ora morto e enterrado, Senhora Ministra, graças aos senhores.
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