A Constituição Federal, em seus artigos 23 e 225, atribui ao município a responsabilidade de proteger e preservar o meio ambiente, bem como, de promover o equilíbrio ambiental para as atuais e futuras gerações. Essa tarefa crucial demanda o envolvimento ativo dos poderes legislativo e executivo municipais.
O Poder Executivo, conforme preconizado pela Política Nacional de Meio Ambiente e o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), deve estruturar o órgão ambiental municipal. Este órgão público deve estar composto por uma equipe técnica multidisciplinar e bem capacitada tecnicamente, assim, poderá atuar de maneira abrangente no controle ambiental da sua cidade.
Simultaneamente, o Poder Legislativo Municipal desempenha um papel fundamental na produção de uma legislação ambiental robusta e sólida. Essa legislação, mesmo que aparentemente mais restritiva, desempenha um papel protetivo fundamental e se bem formulada, incentiva o desenvolvimento sustentável. A ausência de normativas específicas enfraquece a atuação do órgão ambiental, independentemente de sua capacitação técnica, ao não fornecer o respaldo legal e segurança jurídica adequada nas situações do dia a dia.
Infelizmente, a capital do estado do Rio de Janeiro tem apresentado deficiências notáveis nesses dois pilares, especialmente pela ausência de um Código Ambiental Municipal, mesmo respaldada pelo artigo 30, inciso I da Constituição Federal. O município do Rio de Janeiro, diante dessa lacuna normativa, recorre a Decretos e Resoluções sem “força de lei” e à legislação de outras esferas que não contemplam especificamente os interesses locais.
Diante desse cenário de carência de uma política pública ambiental local, é possível compreender a origem das inúmeras ações civis públicas movidas contra diversas pessoas jurídicas, incluindo o próprio Município do Rio de Janeiro no polo passivo. Cito aqui alguns exemplos notáveis: a ocupação irregular da Faixa Marginal de Proteção do Rio dos Cachorros, no CEASA; a imposição da obrigação de recuperação de áreas degradadas devido à ocupação irregular em Santa Teresa; a ausência de licença ambiental e Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) no novo anel viário de Campo Grande, atualmente em construção; o aterramento na faixa de areia da Praia do Pepê, visando viabilizar práticas esportivas; e a instalação de um galpão logístico na Barra da Tijuca, mesmo sem a apresentação de um plano de manejo para a fauna e flora ameaçadas de extinção encontradas no local.
Estes casos ilustram a amplitude dos desafios enfrentados pela cidade do Rio de Janeiro, demonstrando a necessidade urgente de uma abordagem mais eficaz e sustentável na gestão ambiental municipal.
Contudo, também existem municípios fluminenses que se destacam positivamente neste quesito, com legislação ambiental própria, moderna e sólida. Essas normativas estabelecem padrões ambientais mais restritivos e criam mecanismos para permitir a atuação preventiva e coercitiva do órgão ambiental municipal frente aos possíveis impactos gerados pelo desenvolvimento, sem impedir o crescimento econômico de forma sustentável.
Um exemplo notável é o do município de Itaguaí, que instituiu seu Código Ambiental por meio da Lei nº 3.926/2021. A legislação local abrange diversos aspectos, desde a formulação de uma política pública municipal até a estruturação do órgão ambiental, a implementação de um sistema de compensação ambiental, previsão de infrações, entre outros. A experiência de Itaguaí destaca-se como um modelo bem-sucedido, especialmente considerando a ausência anterior de base legal para a exploração de minério, atividade industrial dominante na região.
Os resultados práticos dessas iniciativas são visíveis. Recentemente, Itaguaí obteve uma decisão favorável do Poder Judiciário que reverteu um pedido do Terminal Sepetiba TECON, empresa do grupo CSN. Mesmo com um passivo ambiental pendente desde 2021, a empresa buscava a renovação do alvará de funcionamento municipal sem os devidos documentos previstos no Código Ambiental da cidade. A liminar concedida pelo Tribunal de Justiça a favor da prefeitura, no entanto, demonstra a eficácia de uma legislação ambiental robusta e a importância de sua aplicação para evitar a degradação ambiental causada por agentes econômicos poderosos.
Fica evidente a urgência de os municípios atribuírem a devida importância legal e legislativa a sua agenda ambiental. O objetivo não é obstaculizar o desenvolvimento econômico, mas promover um crescimento sustentável, onde os custos da degradação ambiental sejam atribuídos aos responsáveis. A busca por vitórias como a de Itaguaí deveria se tornar uma prioridade para as cidades, visando um futuro mais equilibrado e sustentável para as comunidades locais.
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