Em 2018, o Brasil tinha 74 parques nacionais. Naquele momento a informação do número de parques nacionais existia em bases de dados e tabelas, mas não estava organizada, sequer escrita em uma frase. Naquela época era comum encontrar no noticiário números defasados. Hoje são 75 parques nacionais brasileiros e logo mais poderão ser 76, se confirmada a criação de Albardão, no Rio Grande do Sul.
Após visitar três parques nacionais durante nossas férias, ainda em 2018, começamos a pesquisar mais sobre eles e a notar que havia informações, mas que estavam descentralizadas. Tomamos para nós a responsabilidade pela organização e a divulgação das belezas e da importância dos parques nacionais através de uma expedição. Assim nasceu o Entre Parques BR.
Após três anos de preparação, a expedição com prazo previsto de três anos foi iniciada no Dia Mundial do Meio Ambiente, 05 de junho, de 2021. Até agora visitamos e documentamos 65 parques nacionais. Em nossas pesquisas, tomamos conhecimento sobre bases de dados do ICMBio (órgão gestor das UCs federais), mapas, estudos acadêmicos, estudos de institutos e ONGs, leis, protocolos de monitoramento, entre tantas outras.
Já foi demonstrado que além de conservação, os parques nacionais geram emprego e renda em comunidades locais, benefícios em termos de saúde e bem-estar para os visitantes e a população do entorno, além de uma série de serviços ecossistêmicos prestados pela fauna, flora e fungos.
Mas como será a distribuição de visitas entre os parques nacionais? Os parques nacionais mais antigos tiveram mais tempo para criação de uma infraestrutura turística e por isso recebem mais visitas? Os parques nacionais, quando reconhecidos como Patrimônios Naturais pela UNESCO, passam a receber mais visitas, permitindo que seja criada uma estrutura turística e atraindo ainda mais visitas de forma ordenada? E como os parques menos visitados podem atrair visitantes, valorizando seus atrativos singulares e mantendo o ordenamento e a qualidade da visitação?
Em 2021, o Instituto Semeia apresentou no Diagnóstico do Uso Público em Parques Brasileiros: a perspectiva da Gestão que “na esfera federal, a média é de um único funcionário para cada 11 mil hectares de área protegida”. Considerando que hoje o ICMBio conta com R$0,13 para gerir cada hectare, como a reestruturação de carreira – pela qual os servidores ambientais estão mobilizados desde o início de 2024 – pode ampliar os benefícios de conservação, emprego e renda, bem-estar e qualidade de vida associado às unidades de conservação?
Extrapolando as informações para o Parque Nacional da Tijuca, o mais visitado nos últimos anos, com pouco menos de 4 mil hectares de área, é como se lá houvesse somente o equivalente a um terço de um funcionário dedicado e pouco mais de R$500 ao ano para receber quase 4,5 milhões de visitas. Ou R$111 ao ano para cada 1 milhão de visitas.
Resultados de 2023
No final do mês de março deste ano foram divulgados os números de visitas a parques nacionais brasileiros em 2023. Os números detalhados ficam disponíveis em uma plataforma online que permite filtros, análise de histórico e que os dados sejam baixados e cruzados.
Os resultados de 2023 indicam um recorde de visitação aos Parques Nacionais. Um marco a ser comemorado e que pode demonstrar um aumento do interesse da população, como mostra a 4ª edição do estudo “Parques do Brasil: Percepções da População” elaborado e divulgado pelo Instituto Semeia.
O número de visitas a parques nacionais atingiu em 2023 o maior número histórico: 11,8 milhões, um valor 13,3% maior que o número de visitas em 2022, ano no qual a quantidade de visitas voltou a superar os níveis pré-pandemia.
Em 2019 haviam sido registradas 9,8 milhões de visitas e nos dois anos subsequentes a quantidade de visitas foi menor, devido às restrições de acesso, totais ou parciais. Em 2023, a maior parte dos parques nacionais monitorados recebeu mais visitas que antes da pandemia.
A visitação a parques nacionais manteve-se concentrada em alguns parques: 77% das visitas ocorreram em 5 parques nacionais, que correspondem a 6,7% do total. E 88% das visitas ocorreram em 10 parques nacionais, ou 13,4% do total.
Dos 75 parques nacionais, 46 (61,3% do total) receberam 12% das visitas, enquanto que 19 parques nacionais (25,3% do total) não receberam visitas, não realizaram monitoramento do número de visitas ou não reportaram os números em 2023.
O número de visitas no Parque Nacional da Tijuca, localizado no Rio de Janeiro, não somente foi o maior observado dentre os 75 parques nacionais, como o crescimento foi quase o dobro da média.
O Parque Nacional da Tijuca foi o que mais recebeu visitas em 2023, assim como nos anos anteriores. Foram 4,46 milhões de visitas em 2023 vs 3,54 milhões em 2022, um aumento de 26%. Se comparado com o número de visitantes em 2019, antes da pandemia, quando foram registrados 2,95 milhões visitantes, o crescimento é de 51,2%.
Em 2023, pela primeira vez o número de visitas ao Parque Nacional da Tijuca foi divulgado por setor. O Cristo Redentor, o único atrativo pago dessa Unidade de Conservação, foi responsável por 53,1% das visitas ocorridas no parque carioca.
O número de ciclistas também passou a ser monitorado, atingindo mais de 211 mil visitas. E com essa abertura, hoje sabemos que no setor Floresta da Tijuca, que corresponde a 9,1% das visitas do Parque Nacional, houve um aumento de 100 mil visitantes no ano, 33% a mais que em 2022.
A quantidade de visitas aos setores do Parque Nacional da Tijuca são comparáveis a outros dos maiores parques nacionais. Caso cada um dos seis setores fossem considerados parques nacionais separados, a título de análise, quatro estariam entre os dez mais visitados.
Hoje sete parques nacionais têm concessões de serviços de apoio à visitação ativas no Brasil: Aparados da Serra e Serra Geral (ambos entre RS e SC), Chapada dos Veadeiros (GO), Iguaçu (PR), Itatiaia (RJ), Marinho de Fernando de Noronha (PE) e Tijuca (RJ).
Dois parques nacionais estão com a concessão em implementação: Chapada dos Guimarães (MT), e Jericoacoara (CE). E um parque, o Pau Brasil (BA), teve seu contrato de concessão extinto em 22/09/2022.
Os nove parques nacionais com contratos de concessão de serviços de apoio à visitação em parques nacionais ativos ou em implementação receberam 8,9 milhões de visitas em 2023, ou 75,2% do total de visitas a parques nacionais.
Os parques nacionais brasileiros foram criados em momentos distintos e cada um deles têm características diferentes em termos de atrativos, estrutura de visitação, acesso, entre outros. A maior parte dos 19 parques sem registros de visitação foram criados nos últimos 20 anos. Somente um tem mais de 50 anos: o Parque Nacional do Araguaia (TO). Todos os 5 parques com mais de 500 mil visitas têm pelo menos 20 anos desde sua criação. Nenhum dos parques com menos de 10 anos teve registro de visitas em 2023. E exceto o Parque Nacional do Araguaia, todos os parques com mais de 50 anos tiveram pelo menos 10 visitas ao dia.
Há ainda uma concentração na visitação de parques nacionais por biomas. Na Mata Atlântica, onde vive mais de dois terços da população do país e onde está um terço dos parques nacionais, foram registradas 68,6% das visitas. Na Amazônia, onde vive 12,3% da população brasileira e onde estão 28% dos parques nacionais, foram registradas 0,38% das visitas.
Com base nas informações fornecidas pela base CNUC (Cadastro Nacional de Unidades de Conservação) do Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática, parques nacionais com Plano de Manejo, Conselho Gestor, reconhecidos como Sítio do Patrimônio Mundial pela UNESCO ou parte de mosaicos de Unidades de Conservação receberam mais visitas que a média em 2023.
Parques nacionais reconhecidos como Sítio Ramsar, apesar de não terem mais visitas que a média, destacaram-se em 2023 pelo maior aumento percentual médio de visitas comparado a 2022.
Tendo visitado 65 dos 75 parques nacionais desde junho de 2021, podemos atestar que todos os parques nacionais têm potencial de receber visitantes com a infraestrutura existente. E que pelo menos 13 dos 19 parques para os quais não foram reportados números de visitas recebem turistas. Nos próximos meses, visitaremos mais 5 parques dessa lista e poderemos afirmar quais estão aptos e quais deles já recebem visitantes.
A ausência de dados reportados, em nossa experiência por conversas com servidores, ocorre mais por uma necessidade de aprimoramento da contagem do que por uma falta de visitantes. Ou seja, certamente a quantidade de visitas a parques nacionais é ainda maior.
Quando falamos em parques nacionais em um país com uma extensão continental e uma diversidade de paisagens como o nosso, é importante considerar que os parques são representantes dessa sociobiodiversidade. E que a diversidade de atrativos e também de infraestrutura para visitação é um ponto forte que deve ser valorizado.
Trazendo novamente o Parque Nacional da Tijuca como exemplo, podemos ver uma ampla diversidade de atrativos e infraestrutura para receber visitantes. O Corcovado pode ser acessado tanto por trem ou van quanto a pé. A Vista Chinesa é acessada de carro e cada vez mais de bicicleta. Os Setores Floresta e Pedra Bonita podem ser acessados de carro ou a pé, e os maiores atrativos são as trilhas.
Da mesma forma, muitos parques nacionais têm infraestrutura mais antropizada, com acesso mais fácil, ao mesmo tempo em que outros tantos apresentam uma estrutura mais rústica para acesso e pernoite. Ambos podem e devem ser valorizados e podem ser visitados de forma ordenada.
Ao mesmo tempo em que milhões de turistas tomam um ônibus e percorrem os 11km da portaria do Parque Nacional de Iguaçu até as cataratas, trajeto equipado com banheiros, restaurantes e um elevador; centenas ou milhares de pessoas tomam uma voadeira em Mâncio Lima, no Acre, para acessar o Parque Nacional da Serra do Divisor, onde as pousadas geridas por comunidades locais permitem uma estadia extremamente confortável no meio da Floresta Amazônica.
Enquanto centenas de milhares de pessoas visitam de chinelos, sem necessidade de equipamentos de trilha, as belas praias do Parque Nacional da Serra da Bocaina ao lado da vila de Trindade, no litoral do Rio de Janeiro; quase 2 mil pessoas cruzam a fronteira para a Venezuela e percorrem a pé quase 100 km para acessar o lado brasileiro do Monte Roraima, onde está o parque nacional homônimo, pernoitando em barracas à luz da lua e das estrelas.
O conhecimento dos brasileiros com relação aos parques nacionais vem aumentando, assim como o número de visitas. Segundo o Instituto Semeia, este foi o primeiro ano desde 2018 em que “o patamar de conhecimento total de parques naturais supera a casa dos 90% entre a população brasileira”.
Se todos os parques nacionais recebessem pelo menos 10 visitas ao dia, teríamos um adicional de 55 mil visitantes. Essa simulação pouco mudaria os resultados do número total de visitas ao ano, mas faria uma grande diferença para centenas de pessoas e famílias que trabalham no entorno ou em atividades dentro deles.
São essas pessoas e famílias que estão, ou podem estar, presentes diariamente nos parques nacionais, que acompanham turistas e reportam condutas irregulares, criando uma rede de apoio aos órgãos gestores cujos recursos são insuficientes para a gestão.
As informações acima mostram a importância do tema e a oportunidade, não somente em negócios, de que os parques tornem-se, cada vez mais, parte do imaginário coletivo. E que com isso possam se transformar também cada vez mais em ferramentas que permitam a educação ambiental, além do seu papel principal de conservação.
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Se entendi direito, dos 11,8 milhões de pessoas que visitaram parques nacionais no Brasil em 2023, só a metade foi realmente visitar um parque nacional. A outra metade foi visitar o Cristo Redentor.