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Em defesa do Conama

A história do Conselho Nacional do Meio Ambiente é o melhor argumento para contestar os críticos que, neste momento de crise, questionam sua legalidade.

11 de agosto de 2005 · 19 anos atrás
  • Maria Tereza Jorge Pádua

    Engenheira agrônoma, membro do Conselho da Associação O Eco, membro do Conselho da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Nat...

As resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), bem como suas atribuições, vêm sendo objeto de discussões cada vez mais acirradas. Estas incluem até afirmações a respeito de sua eventual inconstitucionalidade. O assunto ganha destaque no momento em que o ministro do Supremo Tribunal Federal paralisa, de certa forma em boa hora, a resolução que dispõe sobre as Áreas de Preservação Permanente, as APPs.

Com o pretexto de discutir a legalidade do Conama e das suas resoluções, se advoga dos dois lados da moeda. Particularmente, por não ter a necessária competência nos aspectos jurídicos e legais deste assunto, vou passar ao largo dos mesmos, deixando que juristas e professores doutores se ocupem e resolvam as profundas divergências sobre o assunto.

A situação atual das discussões sobre o Conama foi originada pelo tema da regulamentação referente às APPs, ou seja, as interpretações do Código Florestal (Lei 4771 de 1965), em especial nos seus artigos que sofreram atualização por Medida Provisória em 2001. Tal medida remete ao Conama as especificações e excepcionalidades relativas às mencionadas APPs. Este fato e, em especial, os erros e aberrações propostos pelo Conama sob o controle do governo petista para as APPs, geraram inúmeros protestos da sociedade civil e dos especialistas. Isso deu lugar a que alguns considerassem que o Conama estaria extrapolando suas atribuições e legislando, ao invés de regulamentar dentro do marco legal.

Na verdade, o mencionado Código Florestal vem sofrendo reiteradas investidas, até no Legislativo, com o objetivo claro de diminuir ou eliminar as restrições ao uso da terra por ele impostas. No entanto, discutir a necessidade de uma atualização do nosso Código Florestal é uma faceta do problema. Achincalhá-lo, é outra. O Código Florestal, embora antigo, propiciou que o Poder Público estabelecesse a grande maioria das unidades de conservação do Brasil. Além disso, limitou o uso das propriedades particulares, tanto com relação às hoje discutidas APPs, quanto com relação à reserva legal, que protege 50% da extensão das propriedades privadas na região amazônica e 20% no restante do país. Muitos ambientalistas, então famosos, participaram de sua elaboração. De forma a meu ver inconteste, trouxeram, à época, enormes benefícios à conservação da natureza ou à biodiversidade do Brasil, embora este termo nem fosse conhecido naquela ocasião.

Esta necessidade de atualização da Lei Florestal propicia uma série de propostas.
Algumas bem intencionadas, mas muitas com o objetivo claro de favorecer a área produtiva, em detrimento dos serviços ambientais que a conservação da natureza presenteia a todos os brasileiros. A Medida Provisória nº 2166-67 de 21 de agosto de 2001, que modifica os artigos sobre as Áreas de Preservação Permanente pelo só efeito da lei e remete sua regulamentação ao Conama, foi o estopim para a discussão das resoluções do orgão e de sua constitucionalidade ou não.

Como já disse, não posso discutir com grandes juristas, mas como uma cidadã que conhece os aspectos técnicos do assunto e que é uma ex-membro daquele conselho, quero defendê-lo, ou melhor, defender tudo de bom que o Conama fez em sua curta história de 24 anos e a importância de sua continuidade para nossa nação. Talvez a própria história do Conama retrate a sua enorme importância para os brasileiros e sua defesa seja excessiva e desnecessária. Mas, me parece que muitos desconhecem sua história e dele falam como se fossem íntimos protagonistas de seus feitos e heróis da luta pela conservação da natureza, julgando-o agora, após mais de duas décadas de existência, dispensável.

O Conama é um órgão do Sistema Nacional de Meio Ambiente, subordinado ao Ministério de Meio Ambiente e presidido pelo ministro. Suas competências estão bem especificadas no artigo 7º do decreto N°3.942 de 20001. Abriga a representatividade de todos os principais segmentos da sociedade, tendo, portanto, legitimidade política e social. Sua composição é assim distribuída: 32 conselheiros do governo federal; 27 dos governos estaduais, 8 dos governos municipais; 8 das entidades empresariais e 22 da sociedade civil, como entidades ambientalistas e de trabalhadores, e 4 como membros honorários ou convidados. Prepara projetos de decretos para serem assinados pelo Presidente da República, como órgão do Executivo que é, como, também, projetos de lei a serem enviados ao Legislativo. Assessora o ministro ou ministra do Meio Ambiente nos assuntos de resíduos sólidos, saneamento, biodiversidade, florestas e aspectos ambientais das outras políticas setoriais. Elabora, aprova e acompanha a implementação da Agenda Nacional do Meio Ambiente.

Suas centenas de resoluções e moções, ao passarem por inúmeros assuntos da área ambiental, entram em detalhes que seguramente leis não poderiam entrar. Além do mais, é um fórum de excepcional participação da sociedade, tanto através de seus membros representativos, como através das várias instituições, especialistas e técnicos, que participam de suas nove Câmaras Técnicas e são por elas convidados a participarem. É um importante colegiado, que ajuda o Ministério do Meio Ambiente por sua delegação. A pauta é feita por aquele Ministério e tem como membros grandes cientistas e conhecidos ambientalistas, ou pelo menos os mais famosos e atuantes do país. Sua constituição foi e é modelo para o estabelecimento dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, os conhecidos CONSEMAs. Notabilizou e deu corpo à ADEMMA e a ABEMA (respectivamente, Associações de Órgãos Estaduais e Municipais de Meio Ambiente). Finalmente, é o centro de discussões provenientes de denúncias de atentados contra o meio ambiente, quer sejam resultantes de atos governamentais ou do setor privado.

Esta ameaça por ora sofrida pelo Conama, teve origem no início do governo atual, que o minimizou de várias formas: pelas poucas reuniões e decisões tomadas nos dois primeiros anos, com agendas quase que puramente burocráticas, ou por atos do próprio Executivo, desautorizando resoluções, como a medida provisória que permitiu a importação de pneus usados. Também é verdade que a minuta aprovada pelo Conama sobre a abertura de APPs, usando o pretexto de utilidade pública e interesse social, foi um duro golpe para a imagem daquele Conselho, a ponto de ter que ser suspensa pelo Supremo Tribunal Federal, em defesa do meio ambiente.

A história do Conama daqui para frente vai depender de bom senso e esforço de seus membros. Será preciso, principalmente, controlar os ataques quase sempre espúrios daqueles que querem diminuir seus poderes, ou mesmo acabar com este fórum privilegiado e decisivo para garantir a legitimidade da política ambiental do país.

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