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Governo Lula põe e tira

O governo Lula criou um número razoável de unidades de conservação, mas a maioria de uso sustentável. E mais grave, não criou meios de tirá-las do papel.

8 de junho de 2006 · 18 anos atrás
  • Maria Tereza Jorge Pádua

    Engenheira agrônoma, membro do Conselho da Associação O Eco, membro do Conselho da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Nat...

Fomos surpreendidos no dia nacional do meio ambiente com a auspiciosa criação de unidades de conservação na Amazônia brasileira, pelo presidente Lula. Entre elas, a mais expressiva foi a do Parque Nacional do Juruena entre Mato Grosso e Amazonas, com a impressionante extensão de mais de 1,9 milhões de hectares. Parabéns, Marina.

Sabemos que as populações locais e os deputados de Mato Grosso tudo fizeram para impedir este ato. É uma notícia boa para a área ambiental tão desprezada pelos governantes, em especial quando se estabelece áreas protegidas de uso indireto ou de preservação permanente dos recursos naturais. Ao mesmo tempo, estamos perdendo Parques Nacionais inteiros como o do Araguaia, Monte Pascoal e do Monte Roraima que foram considerados como de dupla afetação para as populações indígenas que lá vivem, não obstante serem, na sua maior parte, índios para lá de aculturados. Áreas menores vêm sendo tiradas dos Parques Nacionais para quilombolas, como, por exemplo, no Parque Nacional da Serra da Bocaina ou no de Aparados da Serra, dentre outros casos.

O Parque Nacional do Juruena criado no dia 5 de junho deste ano engoliu 60% de um Parque Estadual de Mato Grosso e 100 mil hectares da Reserva Ecológica de Apiacás. Mas não faz mal. Só que essas frações superpostas devem ser subtraídas da soma total das unidades de conservação de uso indireto estabelecidas pelo governo federal.

Este governo tem privilegiado o estabelecimento de unidades de conservação de uso direto dos recursos naturais ou de “uso sustentável”, ou seja, aquelas que podem ser exploradas, como são os casos das Florestas Nacionais e das Reservas Extrativistas. As primeiras existem principalmente para outorgar concessões florestais às empresas privadas ou comunitárias, embora ainda não exista um só hectare dos mais de 23 milhões de hectares de Florestas Nacionais já criadas, sob este regime. Já as Reservas Extrativistas servem para a exploração para os mais diversos fins, incluindo além da exploração de borracha e de castanha do Pará, agricultura, pecuária, exploração florestal, caça e pesca. Ou seja, as Reservas Extrativistas constituem-se em uma modalidade, até que bastante adequada, de fazer reforma agrária. Segundo se depreende das tabelas 1 e 2 o governo atual estabeleceu 12 milhões de hectares de unidades de conservação de uso direto dos recursos e tão somente 7 milhões de hectares de uso indireto.

Neste período do governo Lula, oito Parques Nacionais foram criados (ver tabela 1 abaixo). Como sabemos o país possui 61 Parques Nacionais que totalizam quase 22 milhões de hectares. Assim, este governo foi responsável pelo estabelecimento de 16% da extensão de todos existentes. Só que se tirarmos o que se perdeu do PN do Araguaia e do Monte Roraima e parte do Parque Nacional de Monte Pascoal, bem como as superposições do Juruena temos de subtrair mais de 700 mil hectares, ou seja, a percentagem vai cair para 13%. Dever-se-ia tirar também os 60% da área protegida a nível estadual absorvidos pelo Parque Nacional de Juruena. Isso sem falar no que vem sendo disponibilizado para os quilombolas, mas para sermos bem honestos, outros dois Parques Nacionais sofreram ampliação neste governo: O Parque Nacional de Grande Sertão Veredas e o da Amazônia. Assim, fica mais ou menos elas por elas.

Mas, estabelecer ou extinguir unidades de conservação é a parte mais fácil da tarefa de conservar amostras da natureza nacional. A parte difícil é o manejo efetivo das mesmas, pois é a única garantia de que realmente algo seja preservado. E, neste aspecto, a atuação do Governo atual tem sido deprimente. Nunca na história das unidades de conservação federais, a situação orçamentária foi tão precária. Nunca os parques, estações e reservas estiveram tão abandonados e desprotegidos e, acima de tudo, sem perspectivas. Parece que o Governo acredita realmente que a preparação de pomposos planos para as unidades de conservação e a realização de inúmeras reuniões é suficiente para manejá-las. Um pouco de realismo é urgentemente necessário para acompanhar o estabelecimento de novas unidades de conservação e isso implica em mais pessoal, mais guardas melhor remunerados, mais recursos para envolver as comunidades locais no manejo, equipamento e combustível para os veículos e embarcações. Também implica abrir as unidades de conservação ao turismo, à educação, à recreação e ao esporte compatível.

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