O “Mata-pau” da Globo

A TV Globo faz, há muito tempo, um meritório esforço para ilustrar a sociedade sobre a problemática ambiental nacional e mundial. Seus programas Globo Ecologia e Globo Rural, entre outros, são de boa qualidade e, sem dúvida, têm contribuído muito a aprimorar as relações, sempre difíceis, entre seres humanos e natureza. Por isso, é penoso observar com certa freqüência deslizes pouco perdoáveis em outros programas com muita audiência dessa emissora.

“Matapalo” em espanhol, ou “mata-pau” em português, é uma figueira muito comum no Brasil e em toda a América tropical úmida, portanto informar ao público que essa árvore é exclusiva da América Central é um erro crasso.

No programa Globo Repórter exibido sexta-feira, 7 de fevereiro, a audiência foi levada a visitar as maravilhas naturais e culturais da Guatemala. Foi uma ótima escolha, pois poucos imaginam que um país tão pequeno possa conter tantos tesouros. A propaganda prévia anunciava, entre outras coisas, que seria mostrada uma planta devoradora de árvores. Quando o momento chegou, o apresentador insistiu que essa planta estranguladora era exclusiva das selvas guatemaltecas. Na verdade a tal planta (“matapalo” em espanhol, ou “mata-pau” em português) é uma figueira muito comum no Brasil e em toda a América tropical úmida, portanto informar ao público que essa árvore é exclusiva da América Central é um erro crasso.

O programa teve vários erros adicionais do mesmo calibre, nos aspectos biológicos, geológicos e históricos, aparentemente induzidos pelo entusiasmo dos guias locais. Erros assim são muito comuns no Globo Repórter e também, embora em menor grau, no Fantástico, programas com enorme audiência que, nesses casos, desinformam ao invés de informar.

O problema anterior se resolveria facilmente se a Globo tivesse alguns assessores científicos, que pudessem ser consultados, por exemplo, via internet, antes de propalar tais programas. Tem mais, a publicidade anterior ao indicado programa omitiu que este trataria da Guatemala. Apenas anunciou um vago “América Central”. Levou um bom tempo para se descobrir que o programa não se referia a Costa Rica, nem a Honduras, Nicarágua, El Salvador ou Panamá. Mostrar, ainda que seja muito brevemente, um mapa do local da visita não faria dano a ninguém e ajudaria muito a compreender o relato e, obviamente, a educar.

Houve ainda outro problema. As magníficas e interessantes imagens dos quetzais, uma das mais belas aves do mundo (esta sim exclusivamente centro-americana), e das paisagens da floresta e dos rios não se equipararam ao proporcionalmente enorme tempo dedicado à suposta aventura de trepar até a boca de um vulcão. O apresentador, perdido na névoa, quis convencer a audiência de que estava executando um ato valoroso e arriscado. Não teve sucesso, já que era evidente que a trilha por ele percorrida é transitada diariamente por dezenas de turistas, que não fazem tanto alarde. O que é uma pena é dedicarem precioso tempo do programa a algo tão desinteressante, estando num país tão esplêndido como a Guatemala. Do mesmo apresentador já foram exibidas “aventuras perigosas” no Pantanal, enfrentando um mini-jacaré que havia sido previamente molestado.

A Globo faz um trabalho excepcional nos seus programas que descrevem a natureza e a cultura do Brasil e de outros países. Prestando um pouco mais de atenção a “detalhes” como os mencionados, poderia ser ainda mais útil no seu propósito de ilustrar, informar e educar o público.

*Esse texto foi editado em 12/06/2024 para repaginação