O designer e escultor Hugo França usa troncos de árvores mortas para fazer cadeiras, mesas, aparadores. “É a madeira que sobrevive às queimadas, uso essa madeira aproveitando e respeitando as formas que eu encontro e adaptando-as para uma escultura mobiliária”. Em Paris, o brasileiro fez uma exposição individual, de junho a agosto deste ano, na galeria Saint Terè, uma das mais disputadas da cidade.
Madeiras de árvores caídas na mata ou de velhas canoas abandonadas ganham uma segunda vida nas obras esculpidas por Hugo França. A forma do objeto sai de cada pedaço de madeira que encontra, em geral toras da Mata Atlântica da região de Trancoso, na Bahia. Enormes pedaços de madeira, tirados de árvores caídas se transformam em cadeiras, espreguiçadeiras, mesas e esculturas. São peças esculpidas diretamente em troncos semi queimados ou pedaços de madeira reaproveitados de velhas canoas, por exemplo.
As peças que saem do ateliê de Hugo França são brutas, pesadas, fortes e caras. Materiais que estariam destinados ao abandono acabam virando jóia rara (ou, jóias raras dizimadas, destinadas ao abandono acabam virando materiais). Uma mesa para jardim, por exemplo, confeccionada a partir da raiz de uma árvore morta e abandonada, custa R$ 4.600,00. Por um lado, ao menos alguém sai ganhando alguma coisa com o caos que assombra a Mata Atlântica.
Depois que se descobriu que brincar de respeitar a natureza está na moda e dá dinheiro, ninguém perde a oportunidade de falar em usar palavras-chave, como desenvolvimento sustentável ou ecologicamente correto, para valorizar o discurso. Mas, ao meu ver, Hugo França teve uma sacada brilhante e não seguiu esta linha previsível e patética de posicionamento. Ele foi além. Presta uma espécie de homenagem póstuma, mesmo que velada, à natureza. Hugo ganha por seu brilhantismo e seus clientes, em busca do inusitado e exclusivo, pagam qualquer preço para ter em casa, um “morto-vivo” esculpido por ele.
A matéria-prima do artista vem, em grande parte, dos restos mortais da Mata Atlântica, que originalmente percorria o litoral brasileiro de ponta a ponta e ocupava uma área de 1,3 milhão de quilômetros quadrados. Atualmente, a mata ocupa apenas cerca de 5 % de sua extensão original. Se o artista fosse feirante, certamente usaria “tá acabando” como jingle e venderia suas peças por muito mais e em muito menos tempo.
Leia também

Cerrado: ação no Supremo quer barrar lavagem de terras griladas no Tocantins
Lei estadual é questionada por entidades civis porque permitiria o registro ilegal de terras e fomentaria a violência no meio rural →

15 anos de pesquisa em Jornalismo Ambiental
Grupo de Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) destaca desafios e avanços da área →

“O Vale do Javari continua esquecido”, critica Beto Marubo sobre falta de políticas para a região
Em conversa com ((o))eco, liderança do Vale do Javari, localizado no oeste do estado do Amazonas, critica governo Lula e aponta descaso com povos indígenas →