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Quanto vale uma floresta? Só Deus sabe…

Pesquisa de jornal carioca aponta o Corcovado como símbolo preferido dos moradores. Mas nosso principal cartão postal está longe de ser tratado como merece.

31 de janeiro de 2006 · 20 anos atrás

Leio em O Globo que o Corcovado é o cartão postal do Rio de Janeiro preferido pelos cariocas. A notícia é o resultado de pesquisa que o matutino conduziu entre seus leitores cibernéticos. Era simples votar. Havia dez escolhas. O leitor clicava em uma delas e pronto, a opção estava registrada! Sufragar duas vezes era impossível, graças a um programa que impedia a falcatrua.

O Corcovado venceu de lavada. Sozinho teve mais de 50% dos votos. Mas quem ganhou mesmo foi o Parque Nacional da Floresta da Tijuca, que ainda obteve 4,42% dos votos para a própria Floresta e 1% para o Parque Lage. Vitória no primeiro turno.

Conquista óbvia, diriam os rodrigueanos idiotas da objetividade. Também eu concordo que se tratou de eleição digna da Albânia comunista onde, de antemão, todos já conheciam a aclamação de Enver Hoxa.

O Cristo é tido e havido mundo afora como o símbolo, não só da Guanabara, mas do Brasil inteiro. Está na capa de revistas de turismo, na folhetaria da Embratur, no logotipo da Guarda Municipal. De fato, o Todo Poderoso tem o dom da ubiqüidade. Mas é mais do que o Cristo. Em recente visita à Guanabara, observei uma propaganda da Prefeitura conclamando os cariocas a visitarem a própria cidade.

Entre os pontos sugeridos, 25% estão no Parque Nacional da Floresta da Tijuca. De fato, o plano estratégico de turismo desenvolvido pelo município em 1998, alcunhado de “Maravilha”, já identificava na Floresta 4 dos 40 pontos de maior atração para os visitantes e moradores da Cidade Maravilhosa.

Mas a Floresta não é só ir, caminhar, tocar, sentir, ela também é ver. E verde perto é bacana, mas ver de longe também tem seu valor. Quantos turistas visitariam o Rio se não tivessem a deleitar os olhos a espetacular imagem da verdejante Serra da Carioca, da Pedra da Gávea e da Pedra Bonita?

Será que o valor da Floresta para a economia do Rio está somente ligado aos ingressos pagos na subida do bondinho do Corcovado? Não sou economista, deixo os cálculos exatos para meu colega colunista de O Eco Eduardo Pegurier mas, ainda assim, arrisco a dizer que o valor da imagem é muito superior ao da Floresta concreta (perdoem-me o trocadilho infame).

Para inglês ver

A pesquisa foi feita com cariocas, não com estrangeiros ou com visitantes das Gerais, da Paulicéia e de outras plagas tupiniquins. Carioca não vai ao Corcovado. Já escrevia Joaquim Manuel de Macedo em princípios do século XIX, que é mais fácil o cidadão do Rio de Janeiro ir à Suiça ou empreender uma viagem a Lisboa, do que subir ao alto do Corcovado.

Aliás, bom para o carioca, que se subisse ia se decepcionar com o mafuá que o monumento insiste em ser, com lojas mal ajambradas, comida de terceira, falta de um centro de visitantes digno e corrupção a valer – uma vez sentei junto à guarita de ingressos de automóveis e contei três entradas com pagamento sem emissão de recibo, contra um visitante em dia com os procedimentos legais. Daí que os 700 mil turistas por ano que O Globo informa visitarem o nosso cartão postal maior estão grosseiramente subfaturados, mas isso é motivo para outra coluna, e uma das longas.
De volta ao assunto principal, se o carioca elege, o turista visita, a prefeitura planeja estrategicamente, o comércio estampa na capa de seus reclames e o Governo Federal imprime em sua folhetaria, o que é que estamos esperando para dar tratamento prioritário ao Corcovado? Quando as lojas serão reformadas e o Hotel das Paineiras será recuperado de detrás daqueles infames tapumes e oferecerá hospedagem para os estrangeiros e cafés e restaurantes para os cariocas?

Quando teremos ali um centro de visitantes digno do ponto mais visitado do país? Quando as maravilhosas trilhas ecológicas que ligam o Vale do Rio Cabeça e o Parque Lage ao Corcovado serão reabilitadas e entregues aos ecoturistas? Quando, Meu Deus? Provavelmente quando Deus quiser. E é melhor pedir ao Pai, por que o filho, que em 2006 completa 75 anos encarapitado na corcova maior da Serra da Carioca, até hoje não deu jeito naquilo lá.

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