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Bush e o clube do Pigou

Bush perdeu talvez a sua última chance de agir como um estadista. No discurso da União, poderia ter dado um golpe certeiro nas emissões de carbono. Mas faltou coragem de inovar.

24 de janeiro de 2007 · 18 anos atrás
  • Eduardo Pegurier

    Mestre em Economia, é professor da PUC-Rio e conselheiro de ((o))eco. Faz fé que podemos ser prósperos, justos e proteger a biodiversidade.

Parafraseando o cômico Groucho Marx, o presidente Americano George W. Bush deveria entrar para um clube que o aceitasse. Que tal se ele entrasse para o clube do Pigou? Lá ele seria admitido, apesar da sua popularidade cada vez mais baixa, até entre os conterrâneos. Não porque fosse desejado como sócio, mas por ser o único que pode colocar em prática, de pronto, o objetivo do clube: reduzir o consumo de gasolina e a produção de gases do efeito estufa nos EUA.

Ontem, durante o discurso do State of the Union, ele perdeu uma ótima chance de fazer alguma coisa concreta sobre as emissões americanas. Na questão ambiental, propôs reduzir em 20% o consumo de gasolina até 2017, mas sem medidas claras para alcançar a meta. Propôs a substituição do petróleo por fontes alternativas, como o etanol. Trata-se de um aceno endereçado a seu eleitorado fiel, os agricultores americanos que produzem etanol a partir do milho, e precisam de subsídios para vendê-lo a preço competitivo.

Ao invés, Bush deveria ter procurado a turma de Gregory Mankiw, professor de Harvard e ex-presidente do Council of Economic Advisers do próprio Bush. Através de um manifesto, Mankiw fundou o clube do Pigou com uma proposta simples: cobrar um imposto em cima de cada galão de gasolina consumido nos EUA. O valor do imposto é objeto de debate. Conforme a opinião, seria de um a dois dólares por galão. O principal resultado esperado é a redução do consumo de gasolina e da geração de gases do efeito estufa. De quebra, teria vários outros efeitos interessantes.

O nome do clube homenageia Arthur Cecil Pigou (1877-1959), economista que defendeu o uso de impostos para corrigir efeitos negativos da produção, como a poluição. Impressiona a lista de ilustres que já se tornaram sócios desse clube virtual. Entre eles, Al Gore, ex vice-presidente dos EUA, e dois prêmios Nobel de economia, Gary Becker e Joseph Stiglitz. Fazem parte desse seleto grupo os economistas Paul Krugman, Kenneth Rogoff, Robert Frank, William Nordhaus e Alan Greesnpan. Richard Posner (juiz) e Thomas Friedman (jornalista) também estão lá. São pessoas que com freqüência divergem, mas o objetivo do clube e a clareza da proposta os uniram.

Afinal, trata-se de um no brainer, uma tacada líquida e certa. Além da redução do consumo de gasolina, todos os outros efeitos colaterais do plano seriam benéficos aos EUA. Para Bush, um presidente lame duck (pato manco, expressão usada para ilustrar quem não pode mais se reeleger), há uma atração a mais. Escrever na sua biografia, pelo menos uma ação de estadista.

Um imposto pigouviano sobre a gasolina traria em ótima hora um alívio ao déficit público americano. Por baixo, a estimativa de arrecadação é de 100 bilhões de dólares por ano. Um dinheiro que será necessário para cobrir o crescente déficit da previdência.

Reduziria a dependência do petróleo do Oriente Médio e da Venezuela, aumentando o grau de liberdade da política externa americana. Melhor ainda, os exportadores de petróleo pagariam parte do imposto. Quando um grande consumidor diminui suas compras de um produto, o preço cai, transferindo parte do ônus do imposto para os produtores.

Gasolina mais cara tornaria o uso dos carros menos atraente. Resultado, melhora do trânsito e menos acidentes, dois grandes desperdícios materiais e humanos da vida moderna. Haveria também menos necessidade de regulação para aumentar a eficiência dos veículos.

Desde 1975, existem as regras CAFE (Corporate Average Fuel Economy), que tentam regular a eficiência dos automóveis americanos. São complicadas e suscetíveis à pressão dos lobbies das montadoras. Elas conseguiram, veja você, restrições mais leves para os utilitários do que os carros.

Em final de mandato, Bush poderia introduzir a medida usando argumentos que agradariam republicanos e democratas. Do lado do nacionalismo e da soberania americana, ele enfatizaria a redução da dependência de petróleo estrangeiro. Para os ambientalistas, exibiria a previsível redução de emissões de carbono, roubando dos democratas um mote que será usado na próxima campanha. E ninguém reclamaria de uma melhora das finanças públicas.

Bush, você precisa de um lugar para ir quando acabar o mandato. Vai pro clube do Pigou.

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