Nos dias atuais, onde artistas e “celebridades” chinfrins agem como se fossem a última coca-cola do deserto, pode parecer que o me chamou a atenção foi a presença de personalidades como Edu Lobo, Gilberto Gil, José Celso Martinez, Nana Caymmi e Chico Buarque no meio da massa geral, andando lado a lado com as pessoas e carregando cartazes. Mas não é isso. O que me chamou a atenção na primeira vez que vi esta foto foi a idade dessa turma. Todos estavam na casa dos vinte e poucos anos. Artistas, intelectuais ou cidadãos comuns, todos na foto eram jovens. E estes jovens estavam nas ruas, lutando pelo que acreditavam. Pela coletividade.
Outro dia estava em sala de aula quando me lembrei dela. Meus alunos mostravam grande indignação com a proposta do “Novo” Código Florestal e os seus efeitos sobre a conservação de bens da coletividade para o atendimento de interesses particulares que essa desastrosa proposta representa. Meus alunos, todos na casa dos vinte e poucos anos, possuem hoje o que a geração dos anos 60 e 70 não dispunham. Tem amplo e quase irrestrito acesso à informação. Tem direito de se reunirem em locais públicos e de formarem associações. Tem direito de se manifestarem. Tem facilidades enormes de deslocamento. Com seus computadores pessoais e a internet podem se comunicar com qualquer pessoa do planeta em tempo real. Estão vivenciando um dos melhores momentos da história do planeta em termos de liberdades individuais e possibilidades de futuro.
Esses jovens em breve vão se formar, vão procurar emprego, vão constituir família, vão ter filhos. No entanto, embora entendam e considerem abomináveis os efeitos que as mudanças no uso de recursos naturais terão em suas vidas e na de seus filhos, me parece que não percebem o quão breve elas os afetarão. Apesar de todas as facilidades e possibilidades em suas vidas, falta uma coisa a esses jovens: atitude.
Qual a razão para essa inércia da juventude? Falta de confiança nas instituições públicas, nos políticos e no sistema político? Cinismo diante de uma sociedade individualista e ignorante? Exacerbação do eu em detrimento do coletivo? Falta de crença em seus próprios valores e na sua relevância como cidadão? Preguiça? Resultado de décadas de repressão ideológica e policial aos movimentos sociais?
Muitos dos jovens atuais possuem mais amigos virtuais em suas redes sociais do que amigos reais, daqueles que olham nos olhos, daqueles que são de pele e osso. Amigos virtuais podem nem mesmo existir. Não precisamos ouvir seus problemas, dividir alegrias e tristezas. Não precisamos (ou não queremos) encontrar essas entidades no mundo de verdade. Os contatos virtuais são apenas um refúgio para a solidão em um mundo onde o nosso umbigo ficou maior que o planeta e os valores fundamentais foram trocados pelos midiáticos.
Os artistas hoje pouco ou em nada parecem com pessoas reais. Vivem em um mundinho protegido pelo seu dinheiro, mas ainda cercados de adoradores que invejam a aparência, a riqueza, o talento (?) e/ou os valores (?) desses artistas etéreos, que parecem apenas existirem na ilha de caras ou nas páginas de fofocas que pululam nos sites da internet. Esses artistas negligenciam sua importância como formadores de opinião, mas, para formar opiniões é preciso ter alguma, certo?
Assim como os artistas, muitos políticos também parecem habitar uma esfera da realidade distinta da dimensão onde vive povo. E o “reality show” (peço desculpas aos inimigos dos estrangeirismos) do Senado e da Câmara tende a ser bem mais assustador que o da televisão, porque o que é decidido neste mundo etéreo, repleto de personagens que dizem representar o povo brasileiro, pode afetar, e muito, o mundo real.
Quem não se manifesta não existe. O resultado da inação é que não dizemos aos políticos o que nós pensamos. Políticos são criaturas interessantes. Apesar dos altos salários e do poder conferido pelo sistema, são extremamente melindrosos e podem se tornar agressivos quando perdem a razão. Políticos têm medo de muitas coisas. Têm medo de técnicos responsáveis, de críticas sólidas e, embora adorem eleitores, detestam o povo. Mas o que mais apavora políticos é a possibilidade de caírem no esquecimento. Perderem seus cargos, perderem suas benesses, perderem seu espaço privilegiado no sistema, suas alianças e seus conchavos.
Quando não saímos às ruas, quando não manifestamos nosso desagrado, quando não tornamos pública nossa contrariedade, corremos muitos riscos. Corremos o risco de que políticos anacrônicos, assentados sobre ideologias sabidamente falidas, assumam a “responsabilidade” de falar por nós. De dizer o que nós queremos para o futuro, que tipo de futuro nós teremos. Quando não nos manifestamos, arranjos políticos estranhos são tramados. Tais arranjos são capazes de unir políticos que defendem ideologias teoricamente preocupadas com o uso dos bens comuns, àqueles cujo objetivo é garantir o máximo de privatização destes bens comuns, como o solo, a biodiversidade e a água. Àqueles que representam grupos capazes de comprarem pareceres putativamente técnicos, produzidos por “especialistas” claramente sem isenção. Pareceres tão frágeis que foram facilmente falseados por técnicos sérios dentro da mesma instituição de pesquisa.
A proposta do “novo” Código Florestal não tem nada de “novo”. É simplesmente a tentativa de tornar lei a velha ladainha dos que não querem entender que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um dos pilares da Constituição Brasileira. Que o direito da Coletividade prescinde ao direito Privado. Que todos devem se responsabilizar pelo uso dos recursos naturais.
A proposta de revisões do Código Florestal não é produto do trabalho de especialistas altamente gabaritados no assunto. É feita por pessoas que não possuem perfil técnico adequado para a tarefa. É feito por pessoas que baseiam seu conhecimento em percepções pessoais. Em achismos e não na veracidade dos fatos, demonstrada por dados reais. Por pessoas que estão atendendo a interesses de uma pequena parcela da sociedade. Por pessoas que estão sonhando acordadas.
Não podemos chamar esse Código Florestal de “novo”, visto que esse termo possui conotação positiva. Na verdade essa proposta de Código Florestal representa os interesses das forças mais retrógradas da sociedade, mas que teimam em se auto-intitularem como “desenvolvimentistas” ou “progressistas”. Não se iludam. Essa proposta do código atende a interesses de grandes proprietários e de grandes desmatadores que serão anistiados. Não atende aos interesses de produtores familiares. É sempre bom lembrar que a Reserva Legal de uma propriedade permite uma série de atividades econômicas, desde que não ocorra corte raso da vegetação e que as Áreas de Preservação Permanente existem para proteger interesses da coletividade, com especial ênfase na segurança das pessoas. Em que planeta vivem os que querem tais mudanças no nosso Código Florestal? Certamente não é em um planeta onde as pessoas bebem água, nem onde o desabamento de terra de encostas desmatadas destroem vilas inteiras e soterram famílias inteiras.
O Brasil bate recordes de produtividade agrícola ano após ano. O Brasil possui instituições de pesquisa agropecuária de ponta, responsáveis pelo expressivo aumento da produtividade por hectare e pela climatização de diversos cultivares a diferentes regiões do país. Temos milhões de hectares de solos degradados em todo o Brasil, que poderiam voltar a produzir, e fartamente, caso a preocupação política fosse para RETOMAR as fronteiras agrícolas perdidas e não em destruir novas áreas primárias.
Se o meio ambiente realmente limitasse o crescimento do Brasil, como seria possível sermos o maior produtor de alimentos do mundo? Somos uma grande potência agrícola e também somos uma grande potência ambiental. No entanto, não se iludam. Se acabarmos com a qualidade do solo, com a disponibilidade e quantidade de água, com os valores da biodiversidade (polinização, por exemplo), em pouquíssimo tempo nosso poderio agrícola entrará em colapso. Vamos todos viver na miséria decorrente de um meio ambiente desequilibrado.
Aparentemente a juventude perdeu seus ideais. Aparentemente não existe mais nenhuma causa nobre o suficiente para lutarmos. Parece que a ideologia substituiu os ideais, que os ganhos substituíram os valores. Recuso-me a acreditar nisso. Ainda acredito na força da juventude e no poder de transformação da história que as novas gerações possuem quando se unem em nome de um ideal! Conquistamos um mundo com liberdade e qualidade de vida nunca vistas na história. Precisamos conquistar um futuro para esse mundo! Onde estão os jovens? Os jovens estão aqui! Estão em todos os lugares! Sempre estarão!
As discussões sobre o Código Florestal DELES já começaram no Senado. Precisamos mostrar nosso descontentamento com essa proposta. Precisamos sair às ruas para defendermos o NOSSO Código Florestal. Porque não aproveitamos a data do dia da Árvore para organizarmos grandes manifestações em todo país, organizadas com a ajuda de nossos meios de divulgação em massa? Quem sabe não aproveitamos para mostrar que queremos plantar árvores e que queremos enterrar a carreira de políticos que não estão antenados aos anseios da sociedade? Lembrar a eles que a NOSSA Constituição assegura nosso direito ao Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado? Que temos respeito pela nossa vida e pelo nosso futuro? Que reconhecemos nosso valor e exigimos respeito! Que somos reais e não bonecos manipulados pelo poder e pela mídia.
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