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Óleo no gelo

Por mais contraditório que pareça, alguns ambientalistas dos EUA estão comemorando o derramamento de petróleo perto de uma reserva natural do Alaska.

17 de agosto de 2006 · 18 anos atrás

Desde os anos 1960, quando se ouviu falar pela primeira vez nas reservas de petróleo contidas sob o solo gelado do Alaska, o debate sobre como, e dentro de que limites, explorá-las nunca esteve tão aceso quanto nos últimos tempos. Desde que a administração Bush assumiu o comando das coisas, o Congresso dos Estados Unidos vem sofrendo inúmeras pressões para aprovar a exploração de supostas reservas de óleo cru que se encontram de baixo de uma das mais importantes e bem preservadas áreas de preservação do país, o Alaska National Wildlife Refuge (ANWR).

O ANWR é uma reserva de cerca de 80.000 km², logo abaixo do Círculo Polar Ártico, que ainda conserva condições naturais surpreendentemente intocadas. De sua área total, cerca de metade é considerada Wilderness Area, o que permite o uso para recreação humana não motorizada. A outra metade foi designada como Minimal Management, o que quer dizer que deve manter suas condições naturais intocadas.

Em 1980, contudo, na primeira expansão realizada no ANWR, uma porção de 6.070 km² da Wilderness Area — conhecida como 1002 area — foi designada para estudos sobre os recursos naturais da área, especialmente seu potencial petrolífero.

Hoje, apesar de existirem pequenas vilas dentro do ANWR, não há uma estrada sequer em seu interior. Só se chega a pé, de barco ou de avião.

Desde o ano 2000, a matéria já foi levada a votação diversas vezes, em ambas as casas do Congresso, chegando a ser aprovada em uma ou outra mais de uma vez. Graças à complexidade o processo legislativo dos EUA, no entanto, a medida nunca chegou à necessária aprovação por ambas as casas. Ainda bem. Nos dias atuais, em que o preço do barril do petróleo alcança valores estratosféricos — diga-se de passagem, muito por causa da guerra particular dos EUA no Iraque —, os discursos demagógicos e politiqueiros ganham força e influência em um debate como esse. Com base em promessas de gasolina mais barata e milhões, literalmente, de empregos, por pouco não se toma uma decisão leviana e excessivamente contextualizada sobre o assunto.

Da última vez em que a questão foi votada, em maio, a House do Congresso dos EUA — que corresponderia à nossa Câmara — aprovou a medida que permite a perfuração e exploração de poços dentro do ANWR com uma estreita vantagem: 225 votos a favor e 201 contra. A grande maioria dos que votaram a favor, como tem acontecido historicamente, era de congressistas republicanos. Dessa vez, porém, é o Senado que está relutante. E, pelo visto, se depender do desleixo da indústria petrolífera, ainda não será dessa vez que a medida vai passar.

No último dia 8 de agosto, os jornais norte-americanos noticiaram que a BP — empresa sediada em Londres mas que tem operações nos EUA maiores do que a Exxon Mobil — anunciou que terá que parar, por um tempo ainda indefinido, a produção do maior campo de petróleo dos EUA, em Prudhoe Bay, no Alaska, porque descobriu que suas tubulações estão, literalmente, por um fio. A empresa detectou até mesmo alguns pontos que já começaram a derramar óleo em alguns pontos da tundra do Alaska. Na atual conjuntura, uma notícia como essa cai como uma bomba nas pretensões de perfuração dentro do ANWR; e nos planos da própria BP de se tornar uma empresa reconhecida por sua responsabilidade ambiental (a página da empresa na internet, dá muita ênfase à causa ambiental, especialmente ao controle das mudanças climáticas).

No ano passado, a explosão de uma de suas refinarias no Texas matou 15 de seus empregados e feriu 170; em março deste ano, a empresa foi responsável pelo derramamento no meio ambiente de 270 mil barris de óleo cru, também no Alaska, e está sob investigação criminal.

Ao todo, a BP terá que substituir mais de 16 milhas de oleodutos, afetados, por motivos ainda não descobertos pela empresa, por corrosão. Em alguns pontos a parede dos dutos já apresentava vazamentos e em outros, tinha uma espessura muito abaixo da margem de segurança. A descoberta tardia do problema, segundo a própria BP, em um pronunciamento oficial, se deve ao fato de que, até hoje, os dutos só eram inspecionados pontualmente, já que desde 1992 o acúmulo de resíduos em seu interior impedia a passagem de um aparelho chamado smart pig que percorre toda a sua extensão, examinando a integridade da tubulação. De agora em diante, ela terá que desenvolver uma nova forma de fazer essa verificação.

Se, por um lado, as questões econômicas e sociais levantadas pela suspensão da produção da BP colocam ainda mais pressão sobre o preço do petróleo, os ambientalistas esperam que estes sinais — bem claros, diga-se de passagem — de insegurança na exploração de petróleo afastem a discussão sobre a perfuração de poços em um verdadeiro pedaço de paraíso na terra.

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