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Estamos mais perto de nos tornarmos refugiados climáticos do que bilionários 

Com a realização da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), o Brasil pode colocar essa conversa no centro do debate

14 de agosto de 2025

Segundo dados do IDMC [Internal Displacement Monitoring Centre, ou Centro de Monitoramento de Deslocamentos Internos], em 2023, mais de 28 milhões de pessoas no mundo foram deslocadas por desastres naturais – número maior que os deslocamentos causados por guerras. No entanto, diferentemente de quem foge de conflitos armados, os refugiados do clima ainda não têm proteção jurídica internacional formal. Vivem em um limbo legal, com direitos negados e pouca visibilidade nos acordos internacionais.

O Brasil já tem seus refugiados climáticos, não precisamos olhar para ilhas do Pacífico ou desertos africanos. Basta lembrar das enchentes no Rio Grande do Sul em 2024 ou da seca recorde na Amazônia que comprometeu a segurança hídrica e alimentar de comunidades inteiras. Ribeirinhos, indígenas, quilombolas e moradores das periferias já estão se tornando migrantes ambientais. Muitos não voltam para casa. Outros sequer têm casa para onde voltar, então é urgente nomear essas realidades. 

Nesse mês de julho estreei um sonho, o podcast Cria Raiz, um projeto para falar de natureza, de meio ambiente e de COP30, trazendo os temas relevantes do evento para o cotidiano das pessoas. E um dos temas que trouxemos para a roda no nosso segundo episódio, no qual recebemos Jessi Alves e tivemos a participação de Vall Munduruku, foi exatamente sobre os refugiados climáticos.

Durante nossa conversa, que está disponível no youtube e no spotify, Vall Munduruku nos traz dados sobre o Acre, que em 2024, teve mais de 100 mil pessoas em 17 municípios afetados pelas enchentes. Comunidades inteiras ribeirinhas ficaram submersas. Famílias tiveram que deixar suas casas e viver em abrigos ou migrar para áreas urbanas precárias.

Se o Brasil quer liderar o debate climático global, precisa colocar rostos humanos na crise. Refugiados climáticos não são uma abstração – são pessoas forçadas a deixar seus territórios, suas redes de apoio, suas culturas. 

A COP30 deve:

  • Reconhecer oficialmente o conceito de refugiados climáticos, pressionando para avanços legais no âmbito da ONU.
  • Ouvir as vozes dos afetados, incluindo lideranças periféricas, indígenas, quilombolas e urbanas nos painéis principais, não só nas “side events”.
  • Exigir financiamento climático internacional para adaptação e acolhimento de migrantes ambientais.
  • Posicionar o deslocamento climático como uma violação de direitos humanos, que atinge de forma desproporcional mulheres, crianças e povos racializados.

Falar de clima é falar de pertencimento. Quando uma comunidade é deslocada por uma enchente, por um incêndio ou por um rio que seca, não se perde só o teto – perde-se história, identidade e proteção social.

A COP30 precisa ser o espaço onde esses corpos ganham nome, onde a justiça climática se materializa em políticas públicas, e onde migrar por causa do clima deixe de ser sinônimo de exclusão. Mais do que discutir metas de carbono, precisamos discutir quem está pagando o preço da emergência climática com a própria vida. 

Vem conversar com a gente no Cria Raiz, ainda vai ter muita conversa boa e relevante por aqui e por lá! 

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

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