Em plena COP 28, que acontece até o dia 12 nos Emirados Árabes Unidos, o ministro Alexandre Silveira, das Minas e Energia, abraçou a Opep+ e disse que isso poderia ajudar os pobres. Certamente, trata-se de profundo paradoxo, um filosofar sobre extremos. Afinal, Sócrates proferiu a frase: “Só sei que nada sei”.
Mas o paradoxo dos fósseis, a princípio negado, acabou ratificado pelo presidente Lula, que calou aplausos da sociedade civil ao dizer o quão chique achava o termo Opep Plus (+).
Como consequência, o prêmio Fóssil do Dia instituído pela Climate Action Network (CAN), que representa mais de 1,3 mil organizações não-governamentais, concedeu a categoria de “lógica distorcida” para o Brasil.
“O Brasil é o vencedor do dia por aparentemente confundir produção de petróleo com liderança ambiental”, afirmou a CAN durante cerimônia realizada na entrada do Expo City Dubai, na COP 28.
O que aconteceu em Dubai é extremamente grave. Não foram apenas gestos. O Brasil está escorregando, de forma mensurável, para as sombras de onde emerge o negacionismo climático. Um dia depois do término da COP 28, em 13 de dezembro, o Brasil promoverá leilões de poços de petróleo, muitos em áreas consideradas ambientalmente frágeis como o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha e da Reserva Biológica do Atol das Rocas.
A Agência Internacional de Energia (AIE) informou, em relatório publicado em novembro, que o Brasil é um dos países com a produção de petróleo que mais cresce, especialmente nos últimos seis anos.
O Brasil está pegando o bonde de décadas atrasado. A realidade global é outra. Muitos já percebem o engodo e a sedução dos fósseis, remanescentes da velha economia que está literalmente destruindo o planeta, mas com poder econômico para neutralizar, de forma lobística, as conferências climáticas e seduzir retardatárias economias em ascensão.
“Este ano, Dubai é um engano total“, diz Romain Grard, do centro estratégico internacional da Scientist Rebellion. “Precisamos abrir outros espaços de reflexão com o público em geral, para tentar criar uma ponte entre a reflexão e a ação”, afirmou. Na França, outras contra-COPs locais estão ocorrendo: Paris, Bordeaux, Nantes, Lyon e Nîmes.
A COP 28 de Dubai impressiona pelo contexto paradoxal. Al-Jaber, CEO da petroleira nacional dos Emirados Árabes, a ADNOC, protagoniza um colossal conflito de interesses, pois também preside a COP 28. Defende, pela empresa, o aumento da produção de petróleo – e em nome da conferência sua redução.
Há crescente e justificado descrédito com relação à conferência sobre aquecimento climático, realizada no ano mais quente da história em 128 mil anos. Jérôme Santolini, diretor de pesquisa em bioquímica do CEA (Pesquisa e Desenvolvimento Científico), de Paris, afirma: “O alarme soa há mais de cinquenta anos, os relatos se acumulam, mas há sempre um desacoplamento entre o conhecimento científico e a ação das esferas política e diplomática”.
Para os brasileiros, especialmente os vinculados à área climática, é teste de paciência acompanhar a “lógica invertida” do improvisado ativismo governamental Macunaíma. A realidade insólita nos leva a refletir sobre paradoxos e suas matrizes. A ânsia pelo poder econômico da geopolítica global, à qual não está imune o Brasil, revela o paradoxo do reino de Midas, levado à inanição por sua própria ganância.
O mesmo Brasil que, sob regime militar, devastou a floresta com a Transamazônica, depois de duramente atingido pelas críticas internacionais, recuperou espantosamente credibilidade e sediou, como líder global, a Conferência Rio 92, que deu origem à Convenção do Clima.
Pouco mais de duas décadas se passaram para que entrasse, sob o comando de Jair Bolsonaro, em estado de pouco disfarçado negacionismo climático. A retomada pelo governo Lula das promessas climáticas soou como um alento aos olhos internacionais mais progressistas, para movimentos sociais e representantes da ciência. Mas agora colhemos novamente o paradoxo.
A pergunta que fica no ar é: como solucionar essa crise de identidade à qual o Brasil é constantemente submetido, em que pese sua Constituição Federal, que encampou uma Política Nacional de Meio Ambiente ecológica e robusta.
Essa gênese de Macunaíma, herói sem nenhum caráter, precisa ser superada. O Brasil deve abandonar as seduções do velho modelo fóssil, paradoxo que sobrevive de defesas falaciosas acientíficas. Deve reconhecer seu DNA ambiental. Deve deixar de subestimar a inteligência da sociedade e afastar-se do proselitismo que não encontra mais espaço nessa modernidade adversa do antropoceno e na inegável realidade das mudanças climáticas.
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