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Um feat que já deu certo: IA como ferramenta de conservação da biodiversidade

E se as tecnologias emergentes pudessem servir para a conservação da biodiversidade e preservação dos conhecimentos tradicionais?

22 de agosto de 2024

Esta é minha estreia como colunista de ((o))eco e estou muito feliz com esta oportunidade. Neste meu primeiro texto, quero dividir com vocês meu entusiasmo com as possibilidades do uso da Inteligência Artificial para a proteção da biodiversidade, mas também das populações indígenas, ribeirinhas e quilombolas.

Recentemente, estive em uma comunidade ribeirinha e, a partir de imagens de drones, conseguimos desarticular um polo de retirada ilegal de madeira, já denunciado várias vezes, mas que, sem provas, não avançava. Uma das aplicações mais promissoras da IA é no monitoramento ambiental. Sensores e drones equipados com algoritmos de inteligência artificial podem coletar e analisar grandes quantidades de dados em tempo real. Isso permite a detecção precoce de desmatamento ilegal, a identificação de espécies ameaçadas e o monitoramento de ecossistemas sensíveis. Com esses dados, é possível tomar decisões mais informadas e rápidas para a proteção do meio ambiente.

Os povos tradicionais têm um papel crucial nessa conservação. Eles possuem um conhecimento profundo dos ecossistemas em que vivem, muitas vezes transmitido de geração em geração. A Inteligência Artificial pode ser uma aliada na defesa desses povos, ajudando a documentar e preservar esse conhecimento. As ferramentas podem ser utilizadas para criar bancos de dados de saberes tradicionais, ajudando a protegê-los contra a perda e a apropriação indevida. Além disso, a IA pode apoiar a luta legal desses povos ao fornecer evidências detalhadas sobre a degradação ambiental causada por atividades ilegais em suas terras.

Kamila e Hamã no computador. Aldeia Inhã Bé, Amazonas. Foto: Lucca Desiderato

Já temos exemplos desse tipo de aplicação. O PrevisIA, desenvolvido pelo Imazon, instituição que monitora a degradação da Floresta Amazônica, é capaz de apontar as áreas de baixo a alto risco de desmatamento, por meio de um algoritmo que analisa variáveis como a presença de estradas legais e ilegais, o desmatamento já ocorrido, classes de territórios, distância para áreas protegidas, rios, topografia, infraestrutura urbana e informações socioeconômicas.

Outro exemplo é um projeto da Fundação Getúlio Vargas que utiliza ferramentas tecnológicas de georreferenciamento para monitorar comunidades ribeirinhas às margens do Rio Xingu, fortemente afetado por Belo Monte, com o objetivo de frear uma possível insegurança alimentar no território. No programa, segundo a pesquisadora Flavia Scabin, o conhecimento científico foi somado aos ensinamentos locais, dando origem a uma plataforma capaz de monitorar a qualidade da água, dos peixes e do solo.

Nesse sentido, quero apresentar um projeto que tem sido muito importante para mim nos últimos meses: a Tainá. Ela é um chatbot no Telegram no qual você envia uma foto e um áudio com informações, e eles já se tornam um banco de dados, permitindo que qualquer pessoa registre, de maneira simples, uma planta ou uma raiz, por exemplo, contribuindo para a construção de um repositório sobre a biodiversidade local. A iniciativa garante a propriedade intelectual das populações tradicionais e o pagamento pelas informações fornecidas. Como afirma Wanda Witoto, empreendedora social e diretora executiva do Instituto Witoto: “a grande força da IA está ligada à oralidade dos povos indígenas.” O projeto é um produto de uma organização suíça de tecnologia sem fins lucrativos, especializada em co-design de tecnologia comunitária, a GainForest.

Hoje, o cinema indígena está cada vez mais forte, e o uso dos celulares tem sido, nos últimos anos, uma arma importante para as populações indígenas poderem contar suas narrativas para o mundo e ter provas contra criminosos que ameaçam suas terras e vidas. Acredito que, no futuro próximo, drones e inteligência artificial conseguirão aprofundar ainda mais essa possibilidade de alcance das vozes dos povos originários.

Vista aérea do Rio Negro. Foto: Lucca Desiderato.

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