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Adalberto Eberhard - Adalberto Eberhard é veterinário de formação e criou, em 1989, a Fundação Ecotrópica. A organização conservacionista, sediada...

Redação ((o))eco ·
21 de dezembro de 2007 · 17 anos atrás

Adalberto EberhardAdalberto Eberhard é veterinário de formação e criou, em 1989, a Fundação Ecotrópica. A organização conservacionista, sediada em Cuiabá, é responsável pela preservação de quatro reservas particulares no Pantanal. Elas fazem parte de um dos complexos de áreas úmidas mais importantes do planeta.

“Escrever sobre o Pantanal é sempre um pesadelo renovado. Isto porque, enquanto as ações de conservação da natureza avançam a milímetros por ano, as ações de degradação vem em sentido contrário, atropelando, a quilômetros por segundo.”

Escrevi esta frase há quase trinta anos e sempre que me pedem para fazer uma retrospectiva anual da situação do Pantanal, eu a repito, na expectativa de perceber uma mudança na equação colocada. Foi tolice minha avaliar os avanços em conservação da natureza em milímetros ao ano, uma vez que agora fica difícil encontrar uma unidade menor que o milímetro e que tenha o charme do mesmo. Poderia falar em mícron, mas perderia muito do alcance em comunicação. Na outra extremidade, na destruição da natureza, poderia ter usado decâmetro ou hectômetro para poder nos dias de hoje, ampliar para quilômetro, para dar uma justa noção do que está acontecendo na região.

Reconheço que na extremidade milimétrica ocorreram coisas fantásticas no ano que se finda. No entanto, é lamentável a ausência do poder público neste lado da equação. Se não levarmos em conta o esforço extraordinário da administração do Parque Nacional do Pantanal em garantir a proteção do mesmo e a boa equipe que foi montada para isto, veremos que neste lado da equação quase todos os avanços foram da iniciativa privada. Plataforma de diálogo com empresários, aquisição de áreas para conservação, gestão de Reservas Privadas, foram iniciativas que enriqueceram o cenário pantaneiro. Concordo com a afirmação de que as ONGs ambientalistas estão mudas e que nem tudo está indo bem neste setor. Mas aí eu pergunto: quem se habilita a doar recursos para ONG militante e ativista? Quem deseja colocar seu nome ao lado da militância ecológica?

Em épocas de Brasil amazônico, em que caímos de joelhos frente à visão distorcida dos países do norte, que consideram o Brasil uma grande floresta amazônica, passamos a reproduzir este conceito em nossas políticas de governo relaxando a implementação das políticas nacionais de conservação da natureza e por conseguinte, eliminando a presença do poder público para cumprir com sua obrigação constitucional de zelar pela natureza do país. Existe um faz-de-conta amazônico. Para gringo e pressão internacional ver. E aí, virem-se Pantanal, Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga. Melhor nem falar dos Pampas praticamente extintos do Sul ou da Floresta Chiquitana que nem aparece como Bioma ou Ecorregião. A fissura no IBAMA foi como rachar uma melancia em festa de bacanas. Os pedaços foram espalhados, mas ninguém quer pegar para não dar vexame.

Como conseqüência deste descaso, o Pantanal vive momentos dramáticos. Não se deixe enganar pela quantidade de jacarés e capivaras. Estes ainda estão aqui. O que está sendo sabotado é a base de vida que mantém estes grandes animais vivos. A destruição é subjacente e invisível aos nossos olhos. Ela está sucedendo no plano microscópico. No dia em que esta base de sustentação falir, toda a pirâmide virá abaixo e tudo estará perdido. O lado quilômetro da equação está aumentando exponencialmente. Infelizmente, ao contrário do outro lado da equação em que o governo está ausente, aqui ele está maciçamente representado. Por omissão, por incentivo ou por conivência. Esta é a época de PAC e Plano Plurianual, é a época de pólo mínero-siderúrgico e do pólo gás-químico em Corumbá, é a época dos carvoeiros incólumes, é em que a nocauteada hidrovia do rio Paraguai começa a acordar. Época em que a sociedade pantaneira, que, de uma forma ou de outra zelou pelo Pantanal por mais de duzentos anos, se encontra marginalizada, e do bio-isto-bio-aquilo, que transforma Mato Grosso e Mato Grosso do Sul numa grande lavoura, destruindo de uma pancada só o divisor de águas onde nascem rios importantes, para não dizer fundamentais, para a sobrevivência da Planície Pantaneira, da Planície Amazônica e da Bacia do Araguaia- Tocantins.

Não se espante, O Pantanal e a Amazônia têm muitas coisas em comum. O que caracteriza as duas é que são absolutamente dependentes de águas que para elas convergem vindas de planaltos ou montanhas circundantes. E parte desta área comum é o divisor de águas mato-grossense.

Existem regiões onde é quase possível colocar um pé na Bacia Amazônica e outro pé na Bacia do Paraguai. Ambas dependem da saúde ambiental deste espaço de Cerrado. Mas o que é que o Cerrado intrometido está fazendo aqui em época de Amazônia? Não há como fazer de conta que o futuro da Amazônia pode ser garantido de forma desvinculada dos demais biomas brasileiros. O Brazil com “z” precisa se ver Brasil com “s”, parar de falar em biomas e começar a se preocupar com a natureza. Um governo que não se preocupa com a natureza não vai proteger o bioma a, b ou c. A natureza é o cenário onde se desenvolve nossa vida. É um direito de todos e zelar por ela uma obrigação constitucional do governo. Com o seu povo. Não como cortina de fumaça para ficar bem aos olhares distorcidos da comunidade internacional e nem como fator de transformação de milímetro em mícron.

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