13 de janeiro (84°S, 79°29’39″W; 1287 m; -16.6°C, sensação térmica -33°C) – Platô do Manto de Gelo da Antártica Ocidental.
Após a inauguração do módulo, ontem à noite, seguimos os trabalhos finais. Tivemos a noite inteira de hoje com nevasca e temperatura caindo abaixo de -19°C, muito úmido, pés e mãos geladas. Ah, um raio de sol!
Hoje encerramos nossa perfuração do gelo. O testemunho de 100,50 m deve conter entre 250 e 300 anos de dados sobre a variabiidade da química atmosférica e do clima. Teremos 3 anos para fazer todas as análises e publicar os resultados. Os trabalhos no frio não terminam após o encerramento da expedição, pois as amostras coletadas serão subamostradas e derretidas em câmaras frias nos EUA, que também estão a -20°C. Isso demandará mais 2 meses de trabalho com as mãos geladas.
14 de janeiro (84°S, 79°29’39″W; 1287 m sem registro meteorológico) – Platô do Manto de Gelo da Antártica Ocidental.
Quase 3 dias inteiros de nevasca ou céu nublado, isso sempre afeta um pouco a motivação da equipe. A sensação térmica cai e fica mais difícil trabalhar fora das barracas.Começamos a empacotar nosso material para a viagem de volta. Nosso cuidado maior é com os testemunhos de gelo, que agora farão uma longa viagem até o Climate Change Institute no Estado do Maine, EUA. Os testemunhos seguem via área em câmaras frigoríficas e todo o cuidado é tomado para evitar o mínimo de derretimento (que alteraria a composição química original da neve ou do gelo). Por isso, temos que enterrar na neve mais de 20 caixas de amostras para manter a temperatura mais baixa possível (evitando a radiação direta do Sol). Incrível, mas em dias ensolarados, mesmo a 84°S, a radiação solar é suficiente para formar uma pequeno filme (de menos de um milímetro) de água sobre a neve que está a -20°C! É claro, esta radiação fornece energia suficiente para todos os equipamentos dentro do módulo Criosfera 1.
Hoje o pessoal da geofísica também encerrou suas medições, após grande sacrifício para evitar dedos congelados. Agora sabemos que o gelo abaixo do Criosfera 1 tem somente 900 m de espessura e a 7 km daqui já atinge 1600 m, ou seja, estamos na vertente de uma montanha. Isso é algo comum na Antártica. O manto de gelo esconde várias cadeias de montanhas, algumas que ultrapassam 3000 m de altitude e estão abaixo de 1000 ou mais metros de gelo.
16 de janeiro (84°S, 79°29’39″W; 1287 m; -16°C, sensação térmica -32°C) – Platô do Manto de Gelo da Antártica Ocidental.
Trabalhos quase concluídos e 90% de nossa carga pronta! Agora vem o período mais aborrecido de qualquer expedição: a espera do momento de retorno. A partir de hoje temos que aguardar os voos que retirarão toda a equipe e as amostras da Antártica. Também entramos na fase final de testes dos equipamentos do Criosfera 1 para garantir que a parte interna do módulo estará acima de 0°C durante o longo inverno polar, o que será essencial para manter tudo funcionando. O Marcelo Sampaio e o Heber Passos começaram a instalar uma caixa com isolante térmico sobre os circuitos eletrônicos e bombas de sucção de ar. Ainda falta testar a transmissão de dados para o Brasil.
Passeando sozinho na Antártica
Em um dia ensolarado, sem nuvens e pouco vento, me afasto mil metros do Criosfera 1, local da nossa pista de pouso para aviões com esquis. A radiação bate em meu rosto e o silêncio é absoluto. Menos dezesseis graus é agradável nessas condições, assim facilmente me esqueço que estou no centro do manto de gelo (o “deserto de cristal”), um dos mais agressivos ambientes do planeta e que em poucas horas poderia ser engolfado por nevascas que duram alguns dias, separados do desastre total somente pela lona de nossas barracas. No fundo uma beleza estranha, que foi bem expressada por Richard Byrd, o primeiro explorador a voar até o Polo Sul Geográfico: “havia uma grande beleza aqui, ao ponto de coisas que são terríveis também poderem ser belas”.
Ao sair da Antártica, nosso próximo destino será Punta Arenas, no Chile.
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