Uma história de amor com final sustentável. Chris Kokubo, 29, e Nathan Shepard, 34, têm profissões com afinidades. Ela é jornalista e ele professor de línguas, hoje dedicado ao espanhol. Mas não poderiam vir de lugares mais diferentes. Chris cresceu em São Paulo, a quarta metrópole do mundo com quase 20 milhões de habitantes, enquanto Nate foi criado em Starksboro, um vilarejo de 1.700 habitantes no excêntrico estado de Vermont, conhecido por ser pequeno, belo e orgulhoso das suas inclinações progressistas.
Com 42,4 mil habitantes, Burlington é a maior cidade do estado, que tem uma população total de 625 mil habitantes. Como a representação de deputados federais é proporcional à população, Vermont conta com apenas 1 deputado no Congresso. Embora não tenha o poder de influenciar a política nacional, em 2000, foi o primeiro estado a aprovar a união civil gay e por anos proibiu a Walmart de abrir lojas em seu território. Ambientalismo é uma paixão à parte. Do momento em que se pisa no aeroporto de Burlington (que também é rodoviária), começa-se a ver placas sobre reciclagem. Os restaurantes enfatizam comida local. O lixo tem uma conta. Gerou mais quantidade, pagou mais pela disposição de resíduos.
Chris e Nate se conheceram há 10 anos. Houve namoro, amizade, idas e vindas. Ela morou em Montreal, bem perto de Vermont. Ele foi atrás dela em São Paulo, onde ficou 2 anos. E não é que se casaram?
O final feliz tem uma moldura idílica: a fazenda de 40 hectares, propriedade da família de Nate há 6 gerações, onde ele construiu sua casa, das paredes aos acabamentos e equipamentos, com as próprias mãos.
Em janeiro, Vermont está coberto de neve. Para chegar onde moram é preciso deixar a estrada e percorrer um trecho de 500 metros de terra, no momento, também transformado em um tapete nevado. “Construí essa casa com o espírito de viver uma vida mais simples”, diz Nate. “E movido pela vontade de economizar e reduzir o impacto ambiental fiz escolhas de acordo”.
A casa não está ligada ao grid de energia público. Em vez disso, conta com dois painéis solares de 75 watts que abastecem quatro baterias, semelhantes a de carros, embora mais potentes. Vermont tem um dos menores índices de insolação dos EUA. Mesmo assim, no verão, os painéis são capazes de suprir cerca de 80% da energia elétrica consumida na casa. No último novembro, um mês já gélido por aqui, o sol brilhou além do comum, e o esquema supriu 60% do total consumido. Quando ele não dá as caras, é preciso recorrer a um pequeno gerador movido à gasolina para recarregar as baterias. Elas mantêm funcionando as luzes da casa, a bomba d’água do chuveiro, o aparelho de som, o liquidificador e o roteador Wi-Fi de internet (um dos itens que mais gasta energia).
Semana passada, fez 30 graus Celsius abaixo de zero. A calefação da casa é feita com um forno movido à lenha cortada dentro da própria fazenda. Se ele falhar, há um forno a gás, que funciona como plano B. Fogão e geladeira também são a gás.
O vaso do banheiro é seco. Isso quer dizer que, como a luz, igualmente não está ligado à rede pública, dessa vez de água. O sistema é simples. Há um assento normal de vaso sanitário, uma estrutura de suporte, e embaixo dela, escondido, um balde. A “descarga” fica ao lado: um outro balde cheio de serragem. Seja qual for o serviço, no final é só jogar serragem sobre os restos. Ela evita o cheiro e ali mesmo começa um processo de compostagem. Uma vez cheio, o balde é esvaziado em um canto certo do jardim. Os resíduos não recebem qualquer tipo de química, mas acabam virando adubo num processo que leva 3 anos. “Fico contente porque o ciclo se fecha. O lixo acaba voltando a virar vida na horta da casa”, diz Nate.
A primeira mudança de viver numa casa assim é passar a prestar atenção aguda no consumo de energia. Na sala, há um painel que mostra o percentual de carga das baterias. Hoje, quando chegamos às 15h30, marcava 97%. Perto das 23h30, marcava 78%. Nate ligou o gerador por uma hora e a carga voltou a 92%. Esta é uma casa de pilha e é preciso gastá-la com cuidado.
Tomar uma chuveirada liga a bomba de água, que é barulhenta. Garantido que o banho será mais curto, porque cada minuto debaixo d´água é um minuto culpado. Fechada a água, alívio, parou a bomba. Mas, epa, não dá para relaxar, a luz do banheiro continua ligada. É preciso se apressar em se vestir e apagá-la.
Na cozinha espartana não há forno de micro-ondas, mas pesadas panelas, destas que os chefs gostam porque mantêm o calor. Escureceu cedo, cozinhou-se com calma, e o jantar, um banquete que teve até farofa e goiabada, foi curtido com boa conversa e cerveja Long Trail, produzida na região, e cujo fabricante se gaba das suas práticas sustentáveis.
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