A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado aprovou, na última semana, um requerimento para que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) apure suposta infração à ordem econômica cometida pelas empresas signatárias da Moratória da Soja, acordo que possibilitou a contenção do desmatamento na Amazônia no final da década de 2000.
De autoria do senador bolsonarista Marcos Rogério, do PL de Rondônia, o requerimento alega que a coordenação de empresas signatárias do acordo resultaria em práticas que obstruem o acesso a mercado para produtores rurais, com o agravante da punição a tais produtores.
“Tais práticas [previstas na Moratória da Soja] representam um obstáculo direto à livre iniciativa, prejudicando não apenas os produtores, mas também a competitividade do agronegócio brasileiro no mercado internacional”, diz trecho do documento.
A Moratória da Soja é o nome que recebeu o pacto ambiental estabelecido entre entidades representativas de produtores de soja no Brasil, empresas do setor, ONGs e, posteriormente, com o próprio governo, prevendo a proibição da soja proveniente de áreas desmatadas – legal ou ilegalmente – na Amazônia após 22 de julho de 2008, como forma de conter o desmatamento na floresta tropical.
A moratória é um dos exemplos mais bem sucedidos no mundo de conciliação do desenvolvimento da produção agrícola em larga escala com a sustentabilidade ambiental. Segundo análise do Greenpeace, entre 2009 e 2022, os municípios monitorados pela Moratória tiveram uma redução de 69% no desmatamento, enquanto a área plantada cresceu 344%, majoritariamente sobre porções já abertas.
Por vir de uma Comissão do Congresso Nacional, o requerimento dos Senadores não depende de procedimento preparatório, sendo instaurado de imediato o inquérito ou processo administrativo junto ao Cade.
Outros ataques
Está prevista para esta semana uma reunião entre membros da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE) para discutir mudanças nos termos da Moratória da Soja.
Pela proposta em análise, o monitoramento deixaria de considerar a propriedade rural inteira e passaria a analisar campos de soja individuais, o que permitiria aos produtores escolher quais áreas de sua propriedade estão em conformidade com o acordo.
Ao britânico Guardian, a ABIOVE ressaltou que se mantém a favor da Moratória, mas que pretende fazer mudanças. A possibilidade de alterações não agradou organizações que trabalham pela conservação da Amazônia.
“As mudanças propostas para a transição para um sistema de monitoramento em nível de subfazenda possibilitam que os agricultores vendam para empresas integrantes da moratória em uma parte da fazenda e para empresas não integrantes da moratória em outra. O monitoramento da moratória tem funcionado bem desde 2008. Se não está falhando, não precisa de conserto, disse ao Guardian David Cleary, da Nature Conservancy.
Em outubro passado, o governo do Mato Grosso já havia sancionado uma norma que elimina incentivos fiscais para empresas comprometidas com o pacto ambiental.
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