O governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil-MT), promulgou a lei que proíbe a construção de pequenas centrais de hidrelétricas (PCHs) e usinas hidrelétricas (UHE) em toda a extensão do Rio Cuiabá, que é considerado um dos principais abastecedores do Pantanal. O feito é considerado uma vitória por ambientalistas, ribeirinhos, parlamentares e outros setores da sociedade civil organizada, que resistem à construção de seis PCHs no curso d’água. A legislação, que já está em vigor, foi publicada nesta quarta-feira (31) no Diário Oficial do Estado.
De autoria do deputado estadual Wilson Santos (PSDB-MT), o Projeto de Lei (PL) nº 957/2019, que deu origem à Lei Estadual nº 11.865 sancionada nesta quarta, foi aprovado em maio deste ano, mas recebeu o veto integral de Mendes em julho. Como mostrou ((o))eco, o governador apontou inconstitucionalidade na matéria, com base em parecer técnico da Procuradoria Geral do Estado (PGE) emitido a seu pedido. Na última semana, porém, os deputados estaduais da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) reverteram, por 20 votos a 3, a medida do chefe do Executivo Estadual.
Um dos temores em torno da derrubada do veto era a hipótese de judicialização do PL por Mendes. Na semana passada, porém, o governador disse, durante sabatina na TV, que não irá recorrer da decisão da ALMT. “Se a parte afetada tiver interesse, ela que entre na Justiça, se não tiver também, tá bom do mesmo jeito. O governo não vai judicializar essa questão porque não afetou o interesse do governo”, disse Mendes, referindo-se a Maturati Participações S.A., proponente do complexo de seis PCHs previsto para ser instalado em um trecho de 190 km do Rio Cuiabá. Ele também declarou ser contra a construção dos empreendimentos, apesar de ter vetado a proposta.
A ((o))eco, a ONG Ecoa (Ecologia e Ação), uma das organizações que atuaram pela proteção do rio contra as usinas, disse que a promulgação da lei representa a união da sociedade em torno de um projeto que colocaria em risco a preservação do curso d’água, que também dá nome a capital do Estado. “Representa respeito às pessoas, à natureza, mostra que juntos somos mais fortes. Eu diria que representa um ponto de inversão do desenvolvimento como conhecemos hoje, para um desenvolvimento de fato sustentável”, comentou Paula Isla Martins, consultora da organização que integra o Observatório Pantanal – coalizão composta por 43 instituições socioambientais atuantes na Bacia do Alto Paraguai (BAP) no Brasil, Bolívia e Paraguai.
“Estamos ‘virando a chave’, evitando antigas tecnologias e buscando alternativas que parem de degradar o ambiente. O rio Cuiabá é um exemplo a ser seguido para muitos outros rios, principalmente aqui na Bacia do Alto Paraguai”, acrescentou. Segundo levantamento da Ecoa, a Bacia do Alto Paraguai (BAP) tinha, até 2020, 38 empreendimentos hidrelétricos em funcionamento. Além disso, cerca de uma centena de outros projetos também miram rios da BAP que, assim como o Cuiabá, atuam na regulação dos ciclos de cheia e vazante do Pantanal.
Impactos para o Pantanal
O complexo de seis PCHs, inviabilizado pela lei recém-promulgada, estava previsto para ser instalado em um trecho de 190 km do Rio Cuiabá em áreas de seis municípios mato-grossenses: Cuiabá, Várzea Grande, Jangada, Nobres, Acorizal e Rosário Oeste.
Estudo de impacto de hidrelétricas na BAP, feito pela Agência Nacional de Águas (ANA), porém, caracterizou o rio como zona vermelha para implantação de empreendimentos hidrelétricos, principalmente pelo papel importante de manutenção do bioma pantaneiro.
A investigação também concluiu que 89% dos peixes do Rio Cuiabá são de piracema, ou seja, são migradores, que transitam entre o curso d’água e o Pantanal. Além disso, o rio é responsável pela produção do maior número diário de ovos de peixes migradores durante a piracema entre todos os cursos d’água da BAP.
Conforme especialistas consultados por ((o))eco, a construção das usinas no Rio Cuiabá ainda pode interromper o fluxo de peixes entre o curso d’água e o Pantanal, reter em até 90% o transporte de sedimentos para o bioma, acelerar o processo de erosão das margens do rio e impactar a cadeia econômica das cidades que dependem da pesca na região.
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