O governo de Goiás tem reagido ao avanço do desmatamento do Cerrado no estado. A mobilização começou no início de junho, após a denúncia da destruição de 500 hectares de vegetação nativa e preservada do bioma de forma irregular dentro do Território dos Kalunga, comunidade tradicional quilombola. A denúncia rendeu uma operação e uma multa no valor de mais de 5 milhões de reais aos proprietários da área desmatada.
No dia 22/06, teve início a Operação Presença, que terminou na última quarta-feira (1º), e teve como foco principal 24 alvos de desmatamento na região do município de Cavalcante, onde está parte do território Kalunga e do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Foram aplicados 13 autos de infração por conta de 1.725 hectares de desmatamento em mata nativa de Cerrado e mais de 3 milhões de reais em multas. A Operação também embargou garimpos ilegais e minerações irregulares, que receberam seis autos de infração no valor total de R$ 318 mil, e apreendeu maquinários usados para prática dos ilícitos.
A fiscalização encontrou irregularidades até mesmo em uma propriedade do prefeito de Cavalcante, Josemar Saraiva Freire (PSDB/GO), que emitiu licenças sem validade para o desmatamento de Cerrado nativo em suas terras. Também foi encontrado um desmatamento ilegal de 1.029 hectares dentro da Área de Proteção Ambiental de Pouso Alto, minerações sem licenciamento e supressões vegetais irregulares em áreas públicas e privadas.
De acordo com os alertas do Deter, sistema de monitoramento do Inpe, o ano de 2020 já acumula um total de 2.418,73 km² desmatado no Cerrado, entre 1º de janeiro e 25 de junho (última data disponível para consulta). No estado de Goiás, o total do ano é de 151,81 km² e o município que lidera o desmatamento no estado é justamente Cavalcante, com 13,50 km², o equivalente a cerca de 9% do acumulado estadual e a mais de 1.300 campos de futebol de área desmatada.
Devido aos altos índices de desmatamento no município, na última quinta-feira (02) a presidente do Conselho Estadual do Meio Ambiente de Goiás, Andréa Vulcanis, suspendeu, em caráter cautelar, a autorização de Cavalcante para liberar licenciamentos ambientais no município. A decisão ainda será submetida para ratificação do Conselho e foi motivada pela constatação da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) de que o município vinha concedendo licenças fora de seu âmbito de competência, portanto, ilegais.
De acordo com Andréa Vulcanis, que também é secretária da Semad, “a situação em Cavalcante é gravíssima e destoa do restante do Estado, tanto pela intensa atividade de desmatamento quanto pela presença do próprio poder público nas ações, com emissão de licenças irregulares”, afirmou, em nota oficial da Secretaria.
O desmatamento em terra Kalunga
No começo de junho, o Ministério Público Federal (MPF) enviou um despacho para apuração da denúncia de desmatamento de cerca de mil hectares dentro do território quilombola dos Kalunga, reconhecido como Sítio Histórico do Patrimônio Cultural Kalunga, em Cavalcante. De acordo com a análise do MPF, foram desmatados efetivamente cerca de 530 hectares e há indícios de desmatamento de outros 267 hectares de área da Fazenda Alagoas, uma propriedade particular não desapropriada que está inserida no interior do território Kalunga, que é o maior quilombo do país. Em nota, a operação do estado de Goiás reconheceu apenas 504 hectares de desmatamento ilegal na área.
O desmatamento foi feito através da técnica conhecida como ‘correntão’, que consiste em correntes presas a tratores que, rapidamente, decepam a vegetação de forma agressiva e impiedosa. No local, a Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável apreendeu 300 toneladas de calcário, minério utilizado para controle do solo em exploração agrícola, o que indica a possível intenção do desmate.
Após apurações, a proprietária do imóvel rural, Maria de Lourdes Hlebanja, e a suposta arrendatária na qual foi emitida a dispensa de licença, Apoena Mineração e Comércios Ltda., foram multadas em R$ 2.525.000,00 cada uma pelo desmatamento de 504,5 hectares, com agravamento por estar em território destinado a proteção de comunidades tradicionais.
Mineração ilegal
Outro destaque entre as ilegalidades encontradas em Cavalcante foram garimpos e minerações irregulares. Numa delas, a mineradora Brasman foi autuada por realizar escavações fora da área licenciada e está sendo investigada pela suspeita de exploração de materiais não inclusos na permissão. Foram apreendidas 11 máquinas utilizadas para extração irregular de minério e a mineradora foi multada em R$ 169 mil, valor que ainda passará por análise de agravantes. Os fiscais também embargaram atividades de garimpo ilegal de ouro no rio São Félix, que foram autuadas com multas no valor de R$ 100 mil.
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