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Governo recria comitês ambientais menores e com quase nenhuma participação da sociedade civil

Às vésperas da COP do Clima, em Madri, Jair Bolsonaro recria estrutura de governança para o combate às mudanças do clima e desmatamento

Sabrina Rodrigues ·
2 de dezembro de 2019 · 4 anos atrás
Entre as normas publicadas estão as que se referem à redução dos gases do efeito estufa, controle do desmatamento ilegal. Foto: Marcos Corrêa/PR.

Em meio às críticas pelo aumento do desmatamento, o governo decidiu recriar estruturas de governança de combate à derrubada de florestas e  mudanças climáticas às vésperas do início da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-25), que teve início nesta segunda-feira (02), em Madri, Espanha. O pacote de decretos foi publicado na sexta-feira (29) no diário oficial. 

A estrutura do combate ao desmatamento foi desmontada durante 2019. Um exemplo foi a extinção das comissões executivas do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm) e Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento no Cerrado (PPCerrado), extintas no revogaço que acabou com os colegiados não criados por lei, em abril.

A mesma coisa ocorreu com a área de combate às mudanças climáticas, que não apenas perdeu a Secretaria que cuidava do assunto já na troca de governo, como teve um redução de 95% do orçamento previsto para esse ano. Sem dinheiro e sem governança, o governo iria chegar na COP de mãos vazias e com aumento recorde de desmatamento nas costas. Três dias antes do início do evento, um pacote com cinco decretos restabelece parte da governança perdida, mas com o padrão Salles de ser: conselhos menores, sem representação da sociedade civil ou a diminuição drástica que não prejudicaria o quórum para votar propostas e implementar políticas públicas controversas. Algo que já havia ocorrido no Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), reestruturado em maio, e nas mudanças de cima para baixo que acabou por paralisar o Fundo Amazônia, administrado pelo BNDES.

Tchau sociedade civil

A nova comissão executiva para o Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa (Conaveg), por exemplo, recriada pelo Decreto nº 10.142, será responsável por propor planos e diretrizes e articular e integrar ações estratégicas para prevenção e controle do desmatamento ilegal e recuperação da vegetação nativa, mas sem a participação da sociedade civil, que poderá ser convidada para participar de reunião, mas sem direito a voto.

Antes, a comissão do Conaveg previa a participação 2 representantes titulares e dois suplentes da sociedade civil, nomeados pelo ministro do Meio Ambiente.

A mesma coisa ocorre com a recriação do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA), considerado o maior programa de conservação de florestas tropicais do planeta. As unidades de conservação apoiadas pelo programa são beneficiadas com bens (imóveis, materiais, veículos), obras e contratação de serviços necessários para fazer a unidade de conservação funcionar. As unidades apoiadas pelo ARPA possuem recursos que não são afetados por cortes orçamentários, o que permite colocar gasolina nos carros, manter certos programas, comprar equipamento de combate a incêndios florestais, por exemplo. Esse conselho tão importante para o funcionamento das unidades de conservação da Amazônia voltou a existir, porém ficou nanico. 

Com as mudanças promovidos através do Decreto nº 10.140, o conselho gestor da ARPA encolheu de 12 membros titulares para apenas 7, além da presidência do grupo não ser mais o Secretário-Executivo do Ministério do Meio Ambiente, mas o Secretário de Biodiversidade. O Ministério do Meio Ambiente tinha duas cadeiras no comitê. O novo decreto retira essa representação. A sociedade civil ficará apenas com um representante. Antes, eram dois. E os doadores privados do ARPA serão representados por apenas 1 deles. Havia três vagas anteriormente. 

Comitê das Zonas Úmidas é restabelecido

O Comitê Nacional de Zonas Úmidas (CNZU), extinto também no revogaço, foi recriado nos moldes do governo: menor e com participação mínima de setores empresariais e da sociedade civil. Previsto na Convenção de Ramsar tratado intergovernamental que promove a cooperação entre países na conservação e no uso racional das zonas úmidas no mundo , o comitê propõe diretrizes e ações de execução relativas à conservação, ao manejo referente à gestão dessas áreas. 

Instituído pelo Decreto nº 10.141, o novo comitê de Zonas Úmidas não apenas perde relevância dentro do Ministério antes, era presidido pelo Secretário de Biodiversidade e Florestas, agora por um representante da mesma secretaria , como deixa de contar com representação do setor empresarial, da Funai, do Ibama e 4 cadeiras para a sociedade civil.

Saiu de 30 membros para apenas 8 membros. 

Fundo Clima pagará custo da política ambiental urbana

Após paralisar a execução do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, o governo entendeu que poderia usar o fundo, com cerca de 380 milhões, para tirar do papel os projetos da chamada agenda urbana, carro chefe da gestão de Ricardo Salles. Um desses temas é o saneamento básico, que atualmente é prerrogativa do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), mas que o ministro do Meio Ambiente tomou para si, embora o ministério não tenha mais a atribuição de cuidar da Política Nacional de Recursos Hídricos, já que perdeu para o MDR a Agência Nacional das Águas.

O governo alterou a redação do decreto que ordenava o funcionamento do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima e da Política Nacional sobre Mudança do Clima. Além dos recursos destinados a projetos de redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), controle de desmatamento e pagamento por serviços ambientais, o governo acrescentou, com o Decreto nº 10.143, a coleta de lixo, o saneamento básico, a mobilidade urbana, o controle da poluição e a criação de áreas verdes como atividades que receberão os recursos do Fundo.

Além da mudança nas atividades que poderão usar os recursos, o governo também retirou quase toda representação da sociedade civil dos estados e dos municípios. Só o presidente do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima, Oswaldo dos Santos Lucon, estará na mesa, composta por um representante titular (e um suplente) dos ministérios da Economia; da Agricultura; de Minas e Energia; da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e o Secretário-Executivo do Ministério do Meio Ambiente, que presidirá o Comitê. Haverá também um representante do BNDES e das Confederações Nacional da: Indústria; do Comércio; de Serviços; da Agricultura e do Transporte no seleto grupo.  

A volta da REDD+

Com o Decreto nº 10.144, Jair Bolsonaro reinstitui uma comissão que ele havia extinto em abril: o comitê da REDD+ (Redução das Emissões de gases provenientes do Desmatamento e da Degradação Florestal). A REDD+ é um incentivo econômico que recompensa proprietários de terra que poderão receber dinheiro, através da venda de créditos de carbono, para manter a área preservada. É considerado um dos principais mecanismos para a redução do desmatamento e degradação ambiental. 

O estabelecimento do Comitê é importante para que o governo possa ter acesso aos recursos estrangeiros relacionados a REDD+. Estabelecendo um padrão, o governo retirou cadeira da sociedade civil e dos estados e municípios.

 

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  • Sabrina Rodrigues

    Repórter especializada na cobertura diária de política ambiental. Escreveu para o site ((o)) eco de 2015 a 2020.

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Comentários 1

  1. Absalão diz:

    Prometeu acabar com o IChicoBio e não cumpriu…#frouxo