Estudo divulgado nesta quarta-feira (12) pela Coalizão Energia Limpa mostra que, apesar do relativo investimento do país em fontes renováveis de energia, como eólica e solar, a dependência contínua e crescente do gás fóssil tem sabotado a transição energética no país.
O gás fóssil – ou gás natural – é um combustível fóssil que, assim como o petróleo, é encontrado em reservatórios no subsolo, tanto em campos marítimos quanto em terrestres. Sua fama cresceu durante as crises hídricas registradas no Brasil, já que passou a ser utilizado como complemento emergencial e estratégico para a produção de energia termoelétrica.
O relatório divulgado nesta quarta-feira, no entanto, mostra que o gás deixou de ser consumido em grande escala somente nessas situações e passou a receber uma fatia significativa dos investimentos na infraestrutura da geração elétrica brasileira.
Intitulado “Regressão Energética: como a expansão do gás fóssil atrapalha a transição elétrica brasileira rumo à justiça climática”, o relatório revela que mais de 70 novas térmicas a gás estão em estudo e planejamento no Brasil.
Além disso, a privatização da Eletrobras, realizada durante o governo Bolsonaro, estabeleceu um acréscimo de 8 gigawatts de térmicas a gás por 15 anos, a serem instalados entre 2026 e 2030. Isso resultará na emissão de mais de 300 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente, o que significa cerca de 40% do total de emissões do setor elétrico nacional atualmente.
Segundo o relatório, tais investimentos no gás natural, associados às recentes mudanças na legislação sobre o assunto, podem acarretar em um bloqueio de investimentos em renováveis no setor elétrico por 15 a 30 anos, além de aumentar os custos da energia consumida no país.
“Temos todas as condições entre as grandes economias do mundo de ser carbono negativo, e defendemos que isso pode acontecer antes de 2045. Há todo o potencial no Brasil para isso, mas a área de energia tem falhado nas propostas nesse sentido. Como se a expansão de óleo e gás fosse a grande alternativa de geração de renda. É como defender ir à guerra para alcançar a paz”, diz Suely Araújo, especialista sênior de políticas públicas do Observatório do Clima.
Para entender como o Brasil chegou a essa dependência, o estudo apresenta uma cronologia dos últimos 20 anos (2003-2023) de reformas, planos e programas de incentivo no âmbito das políticas energéticas nacionais. Essa recapitulação também traz um resumo das ações de resistência da sociedade civil, que conseguiu barrar e adiar dezenas de projetos fósseis nesse período.
“Há mais de dez anos é discutido como seria a expansão do gás. Agora é a hora que deveríamos pensar no descomissionamento de fósseis, e não cair no risco de ativos encalhados. Falamos muito da transição energética, mas temos três componentes: a transição da matriz propriamente dita, nosso papel na escala global e a inclusão energética”, diz Ricardo Baitelo, gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).
Segundo os autores do estudo, o Brasil chegou a esta dependência ancorada em justificativas econômicas questionáveis e um intenso marketing de sustentabilidade, associados a leis e programas de incentivo ao uso do gás.
À medida que a COP 30 se aproxima, a Coalizão Energia Limpa reforça a urgência de o país revisar seus planos de expansão do uso deste combustível fóssil. “Quando falamos de transição energética, precisamos pensar em transição política. A forma como o parlamento se posiciona com relação às mudanças climáticas é, sim, responsabilidade política”, disse a deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG).
A Coalizão Energia Limpa é um conglomerado de organizações da sociedade civil empenhadas na defesa de uma transição energética justa e sustentável no Brasil. O lançamento do relatório aconteceu em Brasília, durante reunião do Grupo de Trabalho de Energias Renováveis da Frente Parlamentar Ambientalista da Câmara dos Deputados.
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