Estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM) e do Woodwell Climate Reserch Center (EUA) mostrou que a Amazônia possui 11,3 milhões de hectares de vegetação em propriedades privadas que podem ser suprimidas legalmente, se assim seus proprietários desejarem. A alternativa para evitar que tais áreas sejam desmatadas passa pela consolidação de mecanismos que incentivem a preservação, diz o trabalho, publicado na última quarta-feira (9), na revista científica Frontier.
As áreas consideradas no estudo são aquelas que excedem as porções de floresta dentro de uma propriedade que, por lei, devem ser preservadas, como as Reservas Legais (RL) e Áreas de Proteção Permanente (APP). O total de vegetação nessas condições ultrapassa a área somadas dos estados da Paraíba e Rio Grande do Norte.
Esse total de floresta passível de desmatamento contém um estoque de 474 milhões de toneladas de carbono. Se forem ao chão, a quantidade de gases estufa lançados na atmosfera será maior do que as emissões líquidas do Brasil em 2019, considerando todos os setores poluentes.
“São áreas que se o proprietário estiver regularizado, com CAR aprovado, se ele for em uma Secretaria Municipal de Meio Ambiente e pedir a autorização de supressão vegetal, tal Secretaria não pode negar. Por isso a importância de criar incentivos que mitiguem o desmatamento legal e que contribuam para diminuir a supressão como um todo”, explicou a ((o))eco o pesquisador do IPAM Marcelo Stabile, autor principal do estudo.
Redução do desmatamento legal
Para conter a conversão legal da floresta, os especialistas dos dois institutos de pesquisa propõem a criação de um mecanismo privado de compensação financeira que remunera produtores rurais da Amazônia legal que se comprometerem a não derrubar essas áreas.
Esse mecanismo, chamado de Conserv pelos pesquisadores, já está há dois anos em teste, em propriedades do estado do Mato Grosso. Até o momento, nove propriedades já integraram o programa e mais cinco estão em fase de assinatura de contrato. O total protegido pela iniciativa, até o momento, chega a 8.410 hectares.
A expectativa é que, em 2020, o Conserv ajude a manter 20 mil hectares de vegetação nativa em pé, por meio da remuneração financeira aos seus proprietários.
Segundo Stabile, cada propriedade é avaliada individualmente em quatro critérios: estoque de carbono, presença de biodiversidade, índice de produção de água e conectividade. A partir dessa avaliação, os valores a serem pagos são definidos.
A cada três meses é feita uma avaliação in loco da área, para verificar se a integridade está mantida, e os pagamentos são feitos semestralmente, diretamente ao produtor. Os recursos são provenientes de doações dos governos da Noruega e Holanda. “O grande desafio é como a gente faz para isso virar um mecanismo de mercado que não dependa de doações”, diz o pesquisador do IPAM.
Criar um mecanismo robusto de pagamento por serviços ambientais (PSA) se torna ainda mais importante quando o preço das commodities alcança recordes, muito em razão da desvalorização do real. Na semana passada, a saca da soja chegou a ser vendida a R$ 200.
“A remuneração aos proprietários [dentro do programa Conserv] é atrativa, mas ainda não chega a ser a remuneração que teriam se fossem cultivar commodities de alta produtividade. O caminho para o proprietário continuar é se ela [remuneração] virar um mecanismo de mercado”, reitera o pesquisador.
Pagamento por Serviços Ambientais
A Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei Federal nº 14.119) passou 13 anos em tramitação no Congresso e foi aprovada muito recentemente, em janeiro de 2021. Além de ter recebido vários vetos que a fragilizaram, a lei, ainda não regulamentada, não contribuiu de forma efetiva para impulsionar um mercado de serviços ambientais no país.
O mercado de carbono é o que tem mais avanços, mas ele também ainda não está consolidado, nacional ou internacionalmente. A Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, realizada no final de 2021, falhou em suas tentativas de regulamentar o Artigo 6 º do Acordo de Paris, que estabelece regras para esse mercado.
“Nós esperamos que o Conserv possa servir como um indutor, uma alavanca para estimular o debate sobre a regulamentação do PSA e outros incentivos para donos de terras preservarem as florestas dentro de suas propriedades”, diz trecho do estudo do IPAM.
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