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Pesquisadores desenvolvem biomarcadores para monitorar contaminação por mercúrio

Especialistas buscam uma forma de avaliar a presença do mercúrio no ambiente e nos organismos antes que ele se torne tóxico.

Vandré Fonseca ·
4 de maio de 2016 · 8 anos atrás
Tucunaré
O mercúrio se acumula ao longo da cadeia alimentar, por isso peixes predadores, como o tucunaré (acima), apresentam maior concentração da substância no organismo. Foto: Giselle Varga/Flickr.

Manaus, AM – Pesquisadores estão utilizando uma nova tecnologia para avaliar a presença de mercúrio em seres humanos e no ambiente amazônico. Eles utilizam metaloproteínas, proteínas que contêm íons metálicos em sua formação, como biomarcadores, e assim identificar a presença e a concentração do metal pesado, uma substância neurotóxica. A vantagem do método em desenvolvimento é a possibilidade de monitorar a presença da substância no ambiente, antes que ela se torne um problema para a saúde das pessoas e animais.

“Queremos criar índices de vigilância para monitorar o mercúrio”, afirma o coordenador das pesquisas, Luiz Fabrício Zara, químico da Universidade de Brasília. “Hoje, o monitoramento só indica quando já existe o problema. Com os bioindicadores eu posso ver antes do problema acontecer”, completa. Já foram desenvolvidos biomarcadores para identificar a presença de mercúrio no leite materno e também que ilustram o transporte da substância da mãe para o filho durante a amamentação. Há também proteínas candidatas para estudos sobre a concentração do mercúrio em peixes, que vão servir para avaliar a presença do metal pesado no ambiente e na cadeia alimentar.

As pesquisas são financiadas pela Hidrelétrica de Jirau, com dinheiro da verba que seria destinada à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Resultados parciais dos estudos, realizados por uma rede de pesquisadores de nove instituições brasileiras, foram apresentados em Manaus, nos duas 3 e 4 de maio, durante o Workshop do Projeto Biomarcadores de Toxidade de Mercúrio Aplicados ao Setor Hidrelétrico na Região Amazônica.

“Na Amazônia, inclusive Rondônia, em função da extração de garimpo, se criou a mística de que ia brotar mercúrio quando se escavasse para construir as usinas e isso iria contaminar peixes e sedimentos. Mas não tinha estudos científicos”, diz Veríssimo Alves dos Santos Neto, gerente de Meio Ambiente de Jirau.

Zara explica que a Bacia Amazônia é rica em mercúrio naturalmente, devido a questões geológicas. É certo também que, em algumas regiões, a presença do mercúrio é ainda maior devido ao garimpo. De qualquer forma, a presença deste elemento é potencialmente danoso à população ribeirinha, porque além dos danos neurológicos que pode causar e também aos processos de bioacumulação e biomagnificação. E é justamente no principal recurso alimentar dessa população, os peixes, que o mercúrio se acumula através da cadeia alimentar e chega ao organismo humano. “O peixe da Amazônia tem mais quantidade de mercúrio quando comparado com a de outras regiões”, afirma o pesquisador da UnB.

Para comparar a presença de mercúrio na população, foram coletadas amostrar de três grupos de pessoas diferentes: ribeirinhos de comunidades próximas a Manaus, onde o peixe é a principal proteína animal consumida; da região do Rio Madeira, uma área da Amazônia com presença de estradas, onde o consumo de carne vermelha e frango é maior do que a de peixes regionais; e de Goiás, onde o peixe é ainda menos importante na alimentação. Esses estudos confirmaram que a concentração de mercúrio em amostras de cabelo aumentam conforme o peixe é mais importante na alimentação.

Mas os efeitos desta maior concentração de mercúrio no ambiente e no organismo ainda não foram esclarecidos pelos pesquisadores. Apesar de diretrizes da Organização Mundial de Saúde indicarem que uma concentração acima de 14 mg de mercúrio por quilo pode causar danos neurológicos, os pesquisadores afirmam já ter encontrado pessoas com mais de 100 mg da substância por quilo, sem que ela apresentasse sintomas de intoxicação. Os pesquisadores ainda não sabem se os amazônidas realmente são capazes de suportar uma maior concentração de mercúrio no organismo ou se, simplesmente, a medicina ainda não desenvolveu um método para avaliar corretamente os efeitos de uma intoxicação pelo metal pesado.

“O peixe é fundamental para a sobrevivência dessa população e ninguém pode ser leviano a ponto de dizer para não comer peixe”, esclarece o químico Wilson Jardim, da Universidade de Campinas, que realiza pesquisas sobre concentração de mercúrio na Amazônia. “Mas é preciso uma política de esclarecimento, que dê preferência aos peixes não predadores”, completa.

Ele explica que a concentração de mercúrio aumenta conforme se avança na cadeia alimentar, portanto, peixes predadores como tucunarés, cachorras e piranhas possuem uma concentração maior da substância. Ele cita por exemplo tucunarés de regiões do Rio Negro, que possuem até 5 mg de mercúrio por quilo, ou seja, dez vezes mais do que a recomendação da OMS, de 0,5 mg por quilo. O melhor então é variar o cardápio de pescado e, em caso de pessoas mais vulneráveis, como grávidas ou mulheres amamentando, dar preferência a jaraquis, matrinxãs e tambaquis.

Jardim tranquiliza também quem vai à região e não resiste a um bom peixe amazônico. Diz que a concentração de mercúrio em amostras do própria cabelo costumam aumentar quando ele passa algum tempo na região, se alimentando basicamente de peixes, mas em pouco tempo volta a níveis bem baixos. “Leva cerca de 90 dias para cair a metade da concentração registrada”, diz.

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Comentários 1

  1. Luiz Carlos Busato diz:

    Vandré, não se pode minimizar o problema do mercúrio, que é GRAVÍSSIMO!!!
    Olhemos que a ONU, por meio do PNUMA, criou ano passado uma Convenção (de Minamata) só para tratar do mercúrio e seus efeitos.
    É muito preocupante as altas concentrações de mercúrio nos peixes da Amazônia! E as concentrações não se devem a questões geológicas – a principal fonte é o garimpo!!!
    Vale lembrar que estamos lendo sobre um estudo bancado pelas hidrelétricas…
    Seria mais interessante se a reportagem ouvisse outras opiniões, como pesquisadores de fora e a experiência em outros países.