Olhares atônitos, semblantes fechados e, em sequência, aplausos. Essa foi a reação do público ao final da exibição do curta-metragem “Sukande Kasáká | Terra Doente”, na abertura da décima quarta edição do festival Filmambiente, no Rio de Janeiro.
O documentário acompanha os desafios enfrentados pelo povo Khīsêdjê no Xingu, Mato Grosso (MT), em meio ao avanço ilegal de fazendeiros produtores de soja na terra indígena. Para além dos impactos visualmente percebidos a partir do desmatamento, o filme mostra os efeitos nocivos dos agrotóxicos, que contaminam a terra, a água e todos do entorno. Afinal, o veneno não respeita as fronteiras entre a fazenda e a terra indígena, como relatam alguns dos habitantes da aldeia entrevistados durante as filmagens.
“Cinema com propósito”, é o que prega o co-diretor da obra, Fred Rahal. Ele conta que o início do processo de produção surgiu a partir de um convite para conhecer uma pesquisa que investigava a presença de agrotóxico nas águas e animais dentro do território do Xingu. Ao todo, 400 pessoas na aldeia kisêdjê estavam expostos aos malefícios dos agrotóxicos aplicados de maneira ostensiva nas plantações do entorno. A escolha para transformar estes achados em uma produção audiovisual ocorre também a partir de uma escolha estratégica:
“A gente achou que era bom fazer um curta porque poderia ter mais acesso tanto em janelas de exibição no circuito de cinema quanto em reuniões e exibições menores para parceiros ou para instituições públicas com o objetivo de difundir a mensagem e de levar também os Kisêdjê para falar sobre o assunto”, explica Fred.

Além da captura de imagens da destruição ambiental que impactam o espectador, “Sukande Kasáká” se destaca pela participação coletiva dos habitantes do território na produção do filme. Com a presença de Kamikia Kisêdjê na direção, o filme traz uma perspectiva intimista aos dramas experimentados pelos Kisêdjê, e a luta contra o apagamento de sua cultura e a degradação de seu território.
O documentário reúne gravações que datam desde 2013, o que mostra como a resiliência dos povos indígenas na região é longínqua – e sugere que os desafios estão longe de encontrarem seu fim.
“Hoje em dia, você percebe que já não é mais a floresta profunda. Já tem área aberta, bem perto do rio, fica visível até pelo satélite. É bem chocante, bem triste. Não faz nem 10 anos que uma área que a gente esteve que eu me senti fora do mundo, agora já tô no meio de uma plantação de soja. Eu tive lá em várias épocas do ano, senti a seca muito mais seca, tanto em relação ao rio quanto em relação ao entorno, assim, nas entre safras, né? Um cenário bem apocalíptico”, relata Fred.
Convidado para exibir o filme na estreia do festival Filmambiente deste ano, Fred Rahal comemorou a parceria, por enxergá-lo como festival “perfeito para esse filme” por unir o cinema às causas socioambientais. “Quando tem um festival desse, ainda mais quando é um filme de abertura, parece que ele penetrou mais fundo. Pra gente é uma grande alegria e demonstra também a vontade do festival em difundir essa mensagem específica que o filme traz”, completa.



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