Notícias

Suspensão da Moratória da Soja coloca em risco clima e economia do país, dizem organizações

Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) suspendeu acordo por suposta prática de cartel. Acordo freou desmatamento na Amazônia

Cristiane Prizibisczki ·
19 de agosto de 2025

A suspensão da Moratória da Soja, anunciada na noite de segunda-feira (18) pela Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), gerou preocupação entre as organizações que trabalham com meio ambiente no país. Segundo elas, além de ser um retrocesso ambiental e climático, o fim do acordo representa um risco econômico para o país.

A suspensão dos efeitos do acordo se deu, segundo o CADE, por medida preventiva e no âmbito de um processo que apura uma suposta formação de cartel entre as empresas signatárias da Moratória.

Ela acontece após meses de pressão do setor do agronegócio, que conseguiu, em dezembro de 2024, que a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado requeresse ao CADE a instauração do processo.  A medida foi publicada nesta terça-feira (19) no Diário Oficial da União.

Além da suspensão dos efeitos do acordo, o CADE determinou que os signatários se abstenham de coletar, armazenar, compartilhar ou divulgar informações comerciais relacionadas à moratória, bem como remover material informativo sobre o acordo de seus canais públicos. A medida foi publicada nesta terça-feira (19) no Diário Oficial da União.

A Moratória da Soja é o nome que recebeu o pacto ambiental estabelecido entre entidades representativas de produtores de soja no Brasil, empresas do setor,  ONGs e, posteriormente, com o próprio governo, prevendo a proibição da soja proveniente de áreas desmatadas – legal ou ilegalmente – na Amazônia após 22 de julho de 2008, como forma de conter o desmatamento na floresta tropical.

A moratória é um dos exemplos mais bem sucedidos no mundo de conciliação do desenvolvimento da produção agrícola em larga escala com a sustentabilidade ambiental.

Segundo análise do Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM), são atualmente 124 os municípios incluídos na área de abrangência do monitoramento do acordo, com produção acima de 5 mil hectares. Tais municípios concentraram 98% da área cultivada com o grão na safra 2022/2023 no bioma.

A análise do IPAM também confirmou que o fato de estarem sob as regras da Moratória não prejudicou a produção. Nos municípios monitorados, a área média desmatada caiu 69%, de 11.424 km²/ano antes da Moratória (2002-2008) para 3.526 km²/ano durante a Moratória (2009-2022). Enquanto isso, o ganho de produtividade da safra 2022/23 foi de 15,9% em relação ao período anterior, com aumento de 6,2% na área plantada. 

No total, a área de soja aumentou 4,5 vezes na Amazônia desde o início da Moratória, passando de 1,64 milhões de hectares para 7,28 milhões de hectares.

“Há uma pressão política pelo fim da Moratória da Soja, mas precisamos reconhecer que os resultados positivos da Moratória alçaram o Brasil à posição internacionalmente reconhecida de comércio responsável […]. Jogar fora a Moratória é apostar na insegurança para o próprio mercado e as exportações”, avalia Gabriela Savian, diretora de Políticas Públicas do IPAM. 

Para a WWF-Brasil, a decisão do CADE é um vaticínio perigoso para os interesses econômicos do Brasil e um risco ambiental e climático perigoso.

“Além dos impactos internos, a manutenção da Moratória da Soja é crucial para a posição do Brasil no comércio internacional. Importantes mercados em todo o mundo clamam por commodities livres de desmatamento. Ignorar essas demandas é colocar em xeque a competitividade do agronegócio brasileiro e fechar portas para mercados valiosos”, disse a organização, em nota.

Já o Greenpeace salienta que os critérios que levaram o CADE à decisão de suspender o acordo são, sobretudo, políticos. “Os ataques à Moratória da Soja não são técnicos. Eles são políticos e favorecem justamente quem mais lucra com a destruição da Amazônia. Avançar com o desmonte de um acordo eficaz, reconhecido internacionalmente e construído ao longo de quase vinte anos, em nome do desmatamento livre, é um tiro no pé. […]. Ao suspender a moratória, o Cade não apenas estimula o desmatamento, mas também silencia o direito do consumidor de escolher produtos que não contribuam para a devastação da Amazônia”, diz Cristiane Mazzetti, coordenadora de Florestas do Greenpeace Brasil.

Com a decisão do CADE, as empresas signatárias do acordo têm 10 dias para fazer cumprir as medidas.

  • Cristiane Prizibisczki

    Jornalista com quase 20 anos de experiência na cobertura de temas como conservação, biodiversidade, política ambiental e mudanças climáticas. Já escreveu para UOL, Editora Abril, Editora Globo e Ecosystem Marketplace e desde 2006 colabora com ((o))eco. Adora ser a voz dos bichos e das plantas.

Leia também

Notícias
12 de dezembro de 2024

Organizações lançam manifesto em defesa da Moratória da Soja

Documento, assinado por 66 organizações, alerta para a importância do acordo para enfrentamento da crise climática e de biodiversidade

Notícias
9 de dezembro de 2024

Agronegócio alega infração econômica e pede que Cade investigue Moratória da Soja

Senador bolsonarista autor da proposta alega que moratória fere direito à livre iniciativa e prejudica produtores. Políticos fortalecem ataque a normas protetivas

Salada Verde
1 de dezembro de 2023

Ruralistas engrossam críticas às moratórias da soja e da carne

As medidas são fundamentais para controlar o desmatamento na Amazônia e viabilizar acordos comerciais planetários

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.