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TJRJ nega recursos e construção de resort na APA de Maricá continua impedida

Ações judiciais movidas pelo movimento ambientalista e pelo Ministério Público têm impedido o andamento do processo de licenciamento ambiental do empreendimento de grande porte

Elizabeth Oliveira ·
25 de abril de 2022 · 2 anos atrás

Em decisão assinada no dia 13 de abril, envolvendo controvérsias relacionadas ao projeto de construção do resort Maraey, na Área de Proteção Ambiental (APA) de Maricá, o desembargador Edson Vasconcelos, da Terceira Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado Rio de Janeiro (TJRJ), negou quatro recursos em relação a decisões anteriores dessa Corte. As partes envolvidas ainda podem recorrer, mas enquanto isso e até que sejam julgadas as duas Ações Civis Públicas em curso, segue válida a liminar que impede o andamento do licenciamento ambiental desse empreendimento que vem sendo questionado pelo movimento ambientalista local, como já repercutido em reportagem de ((o))eco

Visando à proteção da área de restinga e de outros ecossistemas inseridos na APA de Maricá, um dos principais questionamentos do movimento ambientalista resultou em Ação Civil Pública (ACP) ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por demanda da Associação de Preservação Ambiental das Lagunas de Maricá (Apalma). Esse movimento foi unificado com a Associação Comunitária de Cultura e Lazer dos Pescadores Zacarias (ACCAPLEZ), representada nesse contexto pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPERJ). As alegações de potenciais riscos socioambientais do empreendimento imobiliário em ecossistemas de valor excepcional têm contado com apoio da comunidade científica atuante nesse município litorâneo fluminense.

A ACP contra o Estado do Rio de Janeiro, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e o Município de Maricá pleiteia que seja reconhecida a inconstitucionalidade do Decreto 41.048/2007, que reduziu de 300 para 30 metros a Faixa Marginal de Proteção da APA de Maricá, ao instituir o seu Plano de Manejo. Nesse contexto, foi reivindicada, também, a suspensão de todos os pedidos de licenciamento, loteamento, construção e instalação de empreendimentos no interior e no entorno da APA, até que seja legalmente formulada e estabelecida a Faixa de proteção na APA e elaborado novo Plano de Manejo. 

Essa ACP tem envolvido uma batalha judicial com inúmeros reveses, dentre os quais, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de abril de 2021, reiterada em acórdão publicado em novembro do mesmo ano, impedindo o processo de licenciamento ambiental do resort que estava em curso no Inea. No documento mencionado, consta a cronologia do imbróglio.

Na mais recente decisão do TJRJ, foram negados três recursos da IDB Brasil, empresa que está à frente do Maraey, projeto residencial-turístico de capital espanhol que reafirma a proposta de desenvolver essa iniciativa com viés de sustentabilidade; e da Prefeitura de Maricá que apoia a construção do empreendimento sob alegação de impactos socioeconômicos positivos, além de um recurso do MPRJ. Em linhas gerais, essas partes envolvidas buscaram recorrer de acórdãos anteriores do TJRJ, em relação aos processos judiciais em curso, sob alegações de violações de artigos do Código de Processo Civil e da Constituição Federal que não foram aceitas.

Algumas respostas do desembargador 

Sobre os recursos da IDB Brasil

“A alegada ofensa aos artigos 489, §1º, III e IV e 1.022, II, do Código de Processo Civil, nada mais é do que inconformismo com o teor da decisão atacada, uma vez que o acórdão recorrido dirimiu, fundamentadamente, as questões submetidas ao colegiado, não se vislumbrando qualquer dos vícios apontados.”

“Não se pode confundir a ausência de aperfeiçoamento da prestação jurisdicional com a entrega de forma contrária aos interesses do recorrente. Inexistente qualquer vício a ser corrigido porquanto o acórdão guerreado, malgrado não tenha acolhido os argumentos suscitados pela recorrente, manifestou-se expressamente acerca dos temas necessários à integral solução da lide.”

Sobre o recurso da prefeitura de Maricá

“Constata-se que o recurso interposto não pode ser admitido, à míngua do necessário prequestionamento em relação ao artigo 492, parágrafo único do Código de Processo Civil.” 

“Detidamente analisados os autos, não se depreende o necessário e indispensável prequestionamento do único dispositivo apontado como violado nesse recurso, bem assim da tese jurídica aventada nas razões recursais.” 

“Tais pontos não foram objeto de exame pelo colegiado ordinário e, nada obstante isso, a parte interessada não logrou opor embargos de declaração, a fim de provocar a manifestação do órgão julgador, deixando de atender ao comando constitucional que exige a presença de causa decidida, como pressuposto para a interposição do recurso excepcional.”

Sobre o recurso do MPRJ

“O inconformismo sistemático, manifestado em recurso carente de fundamentos relevantes, que não demonstre como o acórdão recorrido teria ofendido os dispositivos legais alegadamente violados, e que nada acrescente à compreensão e ao desate da quaestio iuris, não atende aos pressupostos de regularidade formal dos recursos de natureza excepcional, atraindo a incidência da Súmula 284, STF.” 

“Não se deve confundir apego excessivo à forma com a escorreita aplicação da lei, sendo imprescindível imprimir tratamento igualitário na rigorosa apreciação dos pressupostos de regularidade formal dos recursos de natureza excepcional.”

“O recurso não pode ser admitido, na medida em que tem óbice de trânsito instransponível, já que a parte recorrente, apesar de ter indicado quais os dispositivos de lei federal objeto da controvérsia (artigos 322, §2º, 492 e 1.013, § 3º do Código de Processo Civil), deixou de indicar com precisão em que consistiriam as supostas violações, o que é impositivo, mesmo em caso de alegação exclusiva de dissidio jurisprudencial.”

Atualização


IDB Brasil reitera que não há impedimentos legais

Após a publicação desta nota, a IDB Brasil apresentou esclarecimentos, reafirmando que não existem impedimentos legais ao desenvolvimento do projeto Maraey. A seguir, divulgamos, na íntegra, o posicionamento da empresa, enviado por intermédio de sua assessoria de imprensa.


“A IDB Brasil, responsável pelo projeto MARAEY, esclarece que a decisão proferida pela Terceira Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), no último dia 13, não altera em qualquer medida o acórdão da 18ª Câmara Cível do mesmo TJRJ, que reconheceu a nulidade da sentença contrária ao projeto. Foram negados, pela Terceira Vice-Presidência, recursos impetrados por todas as partes, inclusive pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. A empresa reitera que não há qualquer decisão vigente da Justiça no sentido de impedir a continuidade do empreendimento. A posição da IDB Brasil segue sendo a mesma do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e da Procuradoria do Município de Maricá, órgãos que inclusive já se manifestaram formalmente nos processos.

A empresa esclarece ainda que cumpre rigorosamente todos os ritos legais desde o início do processo de licenciamento de MARAEY, há mais de 10 anos, e jamais atuaria em descumprimento a qualquer decisão judicial vigente. A IDB Brasil segue, portanto, trabalhando no desenvolvimento do mais importante complexo turístico-residencial sustentável do país, que já conta com premiações e selos de reconhecimento mundial, como o Prêmio de Liderança do U.S. Green Building Council 2021 para América Latina (2021 USGBC Leadership Award Latin America), o selo BIOSPHERE e as pré-certificações Sustainable SITES Initiative GOLD e Geo Sustainable.

MARAEY terá, entre outros ativos, a segunda maior reserva particular de restinga do Estado do Rio de Janeiro e a quinta maior do Brasil, além de um centro de pesquisas para estudar ecossistemas locais e dar apoio integral à comunidade de Zacarias, com entrega de título de propriedade aos moradores, infraestrutura e incentivo à pesca artesanal, entre outros benefícios.”

*Editado às 20h20, do dia 26/04/2021, para acrescentar o posicionamento da IDB Brasil

  • Elizabeth Oliveira

    Jornalista e pesquisadora especializada em temas socioambientais, com grande interesse na relação entre sociedade e natureza.

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Comentários 2

  1. A repórter deveria buscar referências sobre a paisagem de uma restinga, pois nessa matéria colocou uma área completamente urbanizada, deixando de lado a restinga que fica no extremo oposto.


    1. Oi Sergio,

      Na verdade o erro foi da edição. Havia uma foto da área de restinga e essa legenda pronta. Depois, descobri que já tínhamos usado a fotografia e troquei, mas esqueci de adequar o texto. Obrigado por nos avisar, já corrigimos.