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Urgência de salvar a biodiversidade marca a agenda da COP16

Planos nacionais de conservação e meios para financiamento estão entre as maiores demandas da Conferência que começa nesta segunda-feira, em Cali (Colômbia)

Aldem Bourscheit ·
21 de outubro de 2024

Milhares de representantes de praticamente todos os países se reúnem a partir desta segunda (21) na cidade de Cali, no sudoeste da Colômbia, para destravar planos de ações nacionais e dinheiro para reforçar a conservação global da biodiversidade, até o fim da década.

“Essa COP é uma verificação da temperatura para as ambições globais em relação à biodiversidade”, destaca Linda Krueger, diretora de Políticas de Biodiversidade e Infraestrutura da ong The Nature Conservancy (TNC). 

Durante duas semanas, a 16ª edição da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica das Nações Unidas (COP16/CDB) deverá costurar um acordo forte para que as 23 metas de proteção socioambiental definidas há quase 2 anos, em Montreal (Canadá), saiam do papel.

O desenho inicial da Convenção foi definido há 32 anos na capital Rio de Janeiro (RJ), durante a Rio92, a primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. 

O aperto de mãos de 2022 pedia planos nacionais para proteger ao menos 30% das terras, zonas costeiras e mares – incluindo o máximo de espécies –, restaurar 30% de ambientes degradados, cortar US$ 500 bilhões anuais em subsídios prejudiciais à natureza, reduzir o uso de agrotóxicos e combater o crime organizado, por exemplo atuando no tráfico de vidas selvagem.

Os países deveriam apresentar suas lições de casa antes da COP16, mas apenas 25 o fizeram, incluindo 17 nações muito ricas em vida selvagem. Outros 170 estão devendo, como o Brasil e a anfitriã Colômbia. A expectativa é de que inúmeros planos sejam lançados no evento.

“A COP é um teste de quão sérios os países serão em manter seus compromissos internacionais para deter a rápida perda de biodiversidade”, diz Crystal Davis, diretora Global de Alimentos, Terra e Água da ong World Resources Institute (WRI). 

O atraso brasileiro se deve a problemas no funcionamento da Comissão Nacional da Biodiversidade (Conabio), cuja estrutura foi abalada no governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro. A Comissão articula a implantação dos compromissos nacionais junto à CBD.

Foto: Lucas Ninno/Diálogo Chino/CreativeCommons

Aplicar essas medidas nacionais rápida e efetivamente é indispensável para frear a perda acelerada de biodiversidade mundial. Caso isso não ocorra, os sistemas naturais entrarão em colapso, prejudicando seriamente economias e outras atividades humanas. Os sinais são claros.

Um balanço da União Internacional para Conservação da Natureza (UICN) mostra que o desmate provocado sobretudo pelo agro ameaça a existência de 50 mil espécies animais, vegetais e de fungos. Nos trópicos, a cada minuto é perdida uma área de florestas similar a 10 campos de futebol.

O último “Planeta Vivo”, relatório da ong WWF, revela um alarmante declínio de 73% no tamanho médio das populações de vida selvagem, nos últimos 50 anos. As maiores perdas foram nos ecossistemas de água doce (-85%), seguidos pelos terrestres (-69%) e marinhos (-56%), sobretudo nos trópicos.

Tais prejuízos podem ser contidos, sobretudo, com a criação de parques e outros tipos de unidades de conservação. No Brasil, apenas a Amazônia (28,5%) e a região marinha (26,3%) estão próximos da meta de 30% a serem resguardados até o fim da década. 

Contudo, é fundamental conter a destruição da vegetação nativa e o fogo, ampliar a área protegida em todos os biomas – incluindo espécies raras ou ameaçadas – e eliminar problemas que ameaçam animais, plantas e outros seres vivos na zona costeiro marinha. 

Um relatório da ong Oceana mostra que o país despeja 1,3 milhão de toneladas de plástico por ano no Atlântico. Os efeitos são dramáticos: 200 espécies marinhas já comeram plástico em nosso litoral, com 85% delas em risco de extinção.

Já em termos globais, apenas 2,8% dos oceanos estão “efetivamente” protegidos, mostra um relatório de ongs. O balanço ressalta que apenas 8,3% dos oceanos são “áreas marinhas protegidas”, mas que essa proteção é apenas no papel e que atividades predatórias seguem ocorrendo nessas áreas.

John Kerry, ex-secretário de Estado dos Estados Unidos, e José María Figueres, ex-presidente da Costa Rica, destacam no prefácio do documento que conservar ao menos 30% dos oceanos é vital para salvaguardar a biodiversidade e bilhões de pessoas que dela dependem para sobreviver.

“Também é essencial para preservar a capacidade do oceano de agir como nosso maior aliado climático, absorvendo bilhões de toneladas de emissões de carbono todos os anos”, lembram as lideranças internacionais.

Mares, oceanos e praias globais se tornaram verdadeiros lixões. Foto: JB/Pexels/CreativeCommons.

Como usual em reuniões globais como a COP16, o sapato sempre aperta na hora de pôr dinheiro na mesa. “O mundo não tem chance de atingir [as metas de conservação] sem que os países mais ricos forneçam mais suporte financeiro aos países em desenvolvimento, que têm a maior parte da biodiversidade mundial”, ressalta Crystal Davis, do WRI.

O acordado na COP15, em 2022, foi de pelo menos US$ 200 bilhões anuais em investimentos na proteção ambiental mundial, até 2030. O valor equivale hoje a cerca de R$ 1,1 trilhão. O montante viria de governos, doações, setores financeiro e privado. 

Além disso, países desenvolvidos deveriam repassar a em desenvolvimento pelo menos US$ 20 bilhões anuais, até 2025, e pelo menos US$ 30 bilhões anuais, até 2030.

Mobilizar esses recursos interessa especialmente ao Brasil, reconhecido como a nação mais rica no mundo em diversidade biológica, abrigando ainda mais de 15% das formas de vida conhecidas. 

Por isso, o país estará ainda mais atento a temas circulantes na COP16, como a repartição de lucros pelo uso industrial da biodiversidade, participação de povos indígenas e tradicionais e mais transparência nas negociações multilaterais.

Outros temas em debate na COP16 envolvem as relações da conservação da biodiversidade com a crise climática mundial, impactos de arranjos comerciais como o Acordo Verde Europeu, que pretende isentar do desflorestamento as importações de carne bovina, cacau, café, óleo de palma, soja, borracha, madeira e seus derivados.

A reportagem de O Eco acompanhará na cidade de Cali as duas semanas de negociações da COP16.
*Com informações da CDB, Clima Info, WRI, TNC e Biodiversity Pulse.

Mais recursos internos e internacionais são estratégicos para melhor proteger o Cerrado (acima), os demais biomas e a zona costeiro marinha brasileiras. Foto de uma sempre-Viva (Paepalanthus sp.) por Esther Castro/Needpix/CreativeCommons

O repórter viajou a convite do IPAM.

  • Aldem Bourscheit

    Jornalista cobrindo há mais de duas décadas temas como Conservação da Natureza, Crimes contra a Vida Selvagem, Ciência, Agron...

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Comentários 1

  1. LUIZ ALBERTO DO AMARAL ASSY diz:

    Tudo seria muito mais produtivo que pudessemos acreditar nas estatisticas divulgadas por estas ONG´s, incluindo a WWF. A realidade nua e crua é que existe um evidente conflito de interesses destas ONG´s ambientais já que quanto pior p cenario que pintam mais recursos recebem. E durma-se com um barulho desses. Em quem acreditar?