Milhares de representantes de praticamente todos os países se reúnem a partir desta segunda (21) na cidade de Cali, no sudoeste da Colômbia, para destravar planos de ações nacionais e dinheiro para reforçar a conservação global da biodiversidade, até o fim da década.
“Essa COP é uma verificação da temperatura para as ambições globais em relação à biodiversidade”, destaca Linda Krueger, diretora de Políticas de Biodiversidade e Infraestrutura da ong The Nature Conservancy (TNC).
Durante duas semanas, a 16ª edição da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica das Nações Unidas (COP16/CDB) deverá costurar um acordo forte para que as 23 metas de proteção socioambiental definidas há quase 2 anos, em Montreal (Canadá), saiam do papel.
O desenho inicial da Convenção foi definido há 32 anos na capital Rio de Janeiro (RJ), durante a Rio92, a primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.
O aperto de mãos de 2022 pedia planos nacionais para proteger ao menos 30% das terras, zonas costeiras e mares – incluindo o máximo de espécies –, restaurar 30% de ambientes degradados, cortar US$ 500 bilhões anuais em subsídios prejudiciais à natureza, reduzir o uso de agrotóxicos e combater o crime organizado, por exemplo atuando no tráfico de vidas selvagem.
Os países deveriam apresentar suas lições de casa antes da COP16, mas apenas 25 o fizeram, incluindo 17 nações muito ricas em vida selvagem. Outros 170 estão devendo, como o Brasil e a anfitriã Colômbia. A expectativa é de que inúmeros planos sejam lançados no evento.
“A COP é um teste de quão sérios os países serão em manter seus compromissos internacionais para deter a rápida perda de biodiversidade”, diz Crystal Davis, diretora Global de Alimentos, Terra e Água da ong World Resources Institute (WRI).
O atraso brasileiro se deve a problemas no funcionamento da Comissão Nacional da Biodiversidade (Conabio), cuja estrutura foi abalada no governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro. A Comissão articula a implantação dos compromissos nacionais junto à CBD.
Aplicar essas medidas nacionais rápida e efetivamente é indispensável para frear a perda acelerada de biodiversidade mundial. Caso isso não ocorra, os sistemas naturais entrarão em colapso, prejudicando seriamente economias e outras atividades humanas. Os sinais são claros.
Um balanço da União Internacional para Conservação da Natureza (UICN) mostra que o desmate provocado sobretudo pelo agro ameaça a existência de 50 mil espécies animais, vegetais e de fungos. Nos trópicos, a cada minuto é perdida uma área de florestas similar a 10 campos de futebol.
O último “Planeta Vivo”, relatório da ong WWF, revela um alarmante declínio de 73% no tamanho médio das populações de vida selvagem, nos últimos 50 anos. As maiores perdas foram nos ecossistemas de água doce (-85%), seguidos pelos terrestres (-69%) e marinhos (-56%), sobretudo nos trópicos.
Tais prejuízos podem ser contidos, sobretudo, com a criação de parques e outros tipos de unidades de conservação. No Brasil, apenas a Amazônia (28,5%) e a região marinha (26,3%) estão próximos da meta de 30% a serem resguardados até o fim da década.
Contudo, é fundamental conter a destruição da vegetação nativa e o fogo, ampliar a área protegida em todos os biomas – incluindo espécies raras ou ameaçadas – e eliminar problemas que ameaçam animais, plantas e outros seres vivos na zona costeiro marinha.
Um relatório da ong Oceana mostra que o país despeja 1,3 milhão de toneladas de plástico por ano no Atlântico. Os efeitos são dramáticos: 200 espécies marinhas já comeram plástico em nosso litoral, com 85% delas em risco de extinção.
Já em termos globais, apenas 2,8% dos oceanos estão “efetivamente” protegidos, mostra um relatório de ongs. O balanço ressalta que apenas 8,3% dos oceanos são “áreas marinhas protegidas”, mas que essa proteção é apenas no papel e que atividades predatórias seguem ocorrendo nessas áreas.
John Kerry, ex-secretário de Estado dos Estados Unidos, e José María Figueres, ex-presidente da Costa Rica, destacam no prefácio do documento que conservar ao menos 30% dos oceanos é vital para salvaguardar a biodiversidade e bilhões de pessoas que dela dependem para sobreviver.
“Também é essencial para preservar a capacidade do oceano de agir como nosso maior aliado climático, absorvendo bilhões de toneladas de emissões de carbono todos os anos”, lembram as lideranças internacionais.
Como usual em reuniões globais como a COP16, o sapato sempre aperta na hora de pôr dinheiro na mesa. “O mundo não tem chance de atingir [as metas de conservação] sem que os países mais ricos forneçam mais suporte financeiro aos países em desenvolvimento, que têm a maior parte da biodiversidade mundial”, ressalta Crystal Davis, do WRI.
O acordado na COP15, em 2022, foi de pelo menos US$ 200 bilhões anuais em investimentos na proteção ambiental mundial, até 2030. O valor equivale hoje a cerca de R$ 1,1 trilhão. O montante viria de governos, doações, setores financeiro e privado.
Além disso, países desenvolvidos deveriam repassar a em desenvolvimento pelo menos US$ 20 bilhões anuais, até 2025, e pelo menos US$ 30 bilhões anuais, até 2030.
Mobilizar esses recursos interessa especialmente ao Brasil, reconhecido como a nação mais rica no mundo em diversidade biológica, abrigando ainda mais de 15% das formas de vida conhecidas.
Por isso, o país estará ainda mais atento a temas circulantes na COP16, como a repartição de lucros pelo uso industrial da biodiversidade, participação de povos indígenas e tradicionais e mais transparência nas negociações multilaterais.
Outros temas em debate na COP16 envolvem as relações da conservação da biodiversidade com a crise climática mundial, impactos de arranjos comerciais como o Acordo Verde Europeu, que pretende isentar do desflorestamento as importações de carne bovina, cacau, café, óleo de palma, soja, borracha, madeira e seus derivados.
A reportagem de O Eco acompanhará na cidade de Cali as duas semanas de negociações da COP16.
*Com informações da CDB, Clima Info, WRI, TNC e Biodiversity Pulse.
O repórter viajou a convite do IPAM.
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Tudo seria muito mais produtivo que pudessemos acreditar nas estatisticas divulgadas por estas ONG´s, incluindo a WWF. A realidade nua e crua é que existe um evidente conflito de interesses destas ONG´s ambientais já que quanto pior p cenario que pintam mais recursos recebem. E durma-se com um barulho desses. Em quem acreditar?