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Jaula cheia, crime solto

O Zoológico de Niterói (RJ), principal destino de animais silvestres no estado, está lotado. Sem ter para onde levá-los, a polícia reduziu o combate ao tráfico.

Andreia Fanzeres ·
3 de março de 2005 · 20 anos atrás



Mesmo com dificuldades de orçamento e infra-estrutura, nos últimos anos o zoológico de Niterói se transformou em referência na reabilitação da fauna fluminense. Mérito dos profissionais, sim. Mas também com uma ajudinha das circunstâncias: ao contrário do Zoológico do Rio e dos Centros de Triagem do Ibama, o zôo de Niterói não apenas recebe e trata os animais como tenta reintroduzi-los em seus habitats. O que nem sempre é possível. A maioria dos bichos chega ferida ou desnutrida, e não volta a ter condições de sobreviver na natureza.

Por incrível que pareça, essa prática contraria as orientações do Ibama, que não é favorável à soltura porque teme que a presença de novos indivíduos nas matas provoque desequilíbrio ambiental na área. (Saiba para onde podem ser levados animais silvestres encontrados em meio urbano)

O veterinário responsável pelo Zoológico de Niterói, André Maia, conta que num espaço tão pequeno (são apenas 9.800 m2) e com uma verba tão apertada não há condições de receber mais animais. “Nós dizemos que estamos aceitando apenas os casos de emergência, mas não podemos negar ajuda aos que são deixados na nossa porta, né?”, questiona. Por causa desse “excesso” de boa vontade, as autoridades ambientais e os bombeiros acabaram se acostumando a levar para Niterói os animais que encontram no Rio e outros municípios, como a capivara da Lagoa Rodrigo de Freitas e os vários pingüins que anualmente aparecem perdidos, vindos dos mares do sul.


Por isso, os funcionários do zôo chegaram a pedir formalmente à polícia para deixar de fazer as apreensões. Mesmo favorecendo o tráfico num primeiro momento, a equipe espera que o radicalismo dessa medida chame a atenção do poder público para os problemas de falta de estrutura no zoológico. “Se a polícia deixasse de prender bandidos por falta de presídios, alguma providência teria que ser tomada”, compara o veterinário, inconformado. Ele garante que o número de apreensões caiu depois do apelo. A Polícia Federal nega que esteja deixando de fazer as operações de combate ao tráfico, mas admite que não há regularidade nas ações. “Agimos quando há denúncia”, revela um escrivão.

Mas a Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA) do Rio de Janeiro confirma que a polícia está mesmo evitando fazer grandes apreensões, embora tenha condições de realizá-las. “Para capturar é preciso haver destino. Não dá mais para fazermos capturas de 500 ou 600 animais de uma só vez, como era rotina antigamente”, revela o inspetor Antonio Ferreira de Souza, da DPMA. Ele diz que denúncias gritantes devem ser averiguadas, mas a polícia torce para que não sejam encontrados muitos bichos. O inspetor afirma ainda que o número de animais traficados no Rio é enorme e as principais feiras de comércio ilegal são conhecidas há anos pelas autoridades. “Os feirantes não se intimidam mais com a polícia. Eles sabem que a pena é leve e que na pior das hipóteses pegam seis meses de prisão. Muitos são reincidentes”, conta.

Enquanto as autoridades ambientais não dão condições para a ampliação dos recursos do zoológico, a polícia tenta driblar as dificuldades como pode. Uma das formas é registrar algumas apreensões no papel e deixar o animal aos cuidados de um “fiel depositário”, se as condições de acolhida forem razoáveis. A equipe do zôo de Niterói prefere pedir para que cada vez mais pessoas visitem os animais, a fim de que os recursos captados na bilheteria ajudem no orçamento. As portas estão abertas. Quem dera as jaulas também.

  • Andreia Fanzeres

    Jornalista de ((o))eco de 2005 a 2011. Coordena o Programa de Direitos Indígenas, Política Indigenista e Informação à Sociedade da OPAN.

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