Reportagens

A semana já é do Paraná

O governo Roberto Requião antecipou-se à Semana do Meio Ambiente com um Pacote Verde que não deixa espaço para Brasília ou outros estados comemorarem a data.

Marcos Sá Corrêa ·
1 de junho de 2005 · 20 anos atrás

Se depender do Paraná, este ano não sobrará Semana do Meio Ambiente para ninguém. No resto do país ela começa no domingo, dia 5. Mas para o governador Roberto Requião, a semana caiu na terça-feira, 31 de maio, antecipada num Pacote Verde que, entre “decretos, convênios e resoluções”, aumentou da noite para o dia em 43% as áreas de conservação no estado, criando de uma vez quatro parques, um monumento natural, um jardim botânico de 2 milhões de metros quadrados em Londrina e 33 Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs). De quebra, a caneta do governador ampliou três parques estaduais e uma estação ecológica.

Se fosse só isso, já era muito. Mas o pacote também inclui um convênio para produzir 4 milhões de mudas de araucárias e outras árvores nativas em penitenciárias agrícolas. Proíbe que madeira da Amazônia não-certificada vá parar em obras públicas no estado ou mesmo passe pelo porto de Paranaguá. Estabelece ainda um programa oficial de estímulo à multiplicação de RPPNs, mandando por exemplo que as prefeituras repassem para os proprietários dessas reservas particulares a parte que lhes couber no ICMS Ecológico do município.

Tem mais. O governo institui uma política de recursos hídricos, que desvia o Paraná do curso que em Brasília pode levar à cobrança de água para irrigação. Implanta um fórum permanente de Mudanças Climáticas, para ajustar a emissão de gases no Paraná às metas do Protocolo de Quioto, e outro de Biodiversidade, para racionalizar o uso de recursos naturais. Arma a administração estadual com seu próprio Instituto de Regularização Fundiária e Agrária. Baixa normas para a produção de palmito. Regula o destino do lixo hospitalar. E traz para dentro de um programa já existente para a recuperação de matas ciliares – pelo qual o estado promete plantar 90 milhões de árvores nativas em marges de rios, lagoas e represas – uma novidade de peso: o sistema penitenciário paranaense, encarregado por um convênio com a secretaria de Justiça de produzir 4 milhões de mudas até 2006. Para se ter uma idéia do que esses 4 milhões querem dizer, os dois viveiros previstos no projeto de transposição do São Francisco deverão fornecer ao todo 400 mil mudas por ano para “revitalizar” toda a bacia do rio. Aos presos, a fórmula oferece a chance de ganhar um dia de desconto na pena para três dias que trabalharem nos viveiros.

Em outras palavras, as do secretário de Meio Ambiente e Recursos Hídricos Luiz Eduardo Cheida, que embrulhou o pacote, Requião “chutou o balde”. Até para lançar o Atlas da Vegetação da Floresta Atlântica, um inventário do que sobrou de mata nativa em 15 municípios do litoral paranaense, o governador mostrou que é de briga. “Espero que daqui a 10, 20 anos esse mapa não sirva para mostrar o que deixamos de preservar”, ele declarou. E isso que o atlas estava no programa especificamente para alegrar a festa.

Cheida tem agora 180 dias para tirar do papel as novas unidades de conservação, concretizando desde parques pequenos, como o das Araucárias, em General Carneiro, com 1,1 hectare, a razoavelmente grandes, como o de Cubatão, entre Guaratuba e São José dos Pinhais, nos arredores de Curitiba, com 5,5 mil hectares. O Monumento Natural de Lancinha, em Rio Branco do Sul, terá 140 hectares.

Há parques estaduais que se ampliam consideravelmente. O de Guartelá, em Tibagi, ganha mais 5 mil hectares. Com isso, seu tamanho quase se decuplica. O do Marumbi, nos municípios de Morretes e Piraquara, junto à baía de Guaraqueçaba, passa de 2,3 mil hectares para 7,4 mil. O do Rio da Onça, em Matinhos, cresce de 118 para 1,65 mil hectares. A Estação Ecológica de Guaraguaçu, em Paranaguá, mais que duplicada, ficará com 3,1 mil hectares.

Das 33 RPPNs registradas na terça-feira, 25 estão nos últimos retalhos de florestas com araucárias, a paisagem típica do Paraná que hoje está confinada a cerca de 0,5% de seu território. O estado é recordista nacional em reservas particulares, com 200 unidades. E passa a contar daqui para a frente um programa de incentivo às RPPNs sem similar no resto do país, onde a tramitação desses processos via Ibama anda cada vez mais lenta.

Pelo decreto 4890, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) fica encarregado de prestar “serviço técnico gratuito” aos interessados, “dando preferência aos requerimentos que correspondam a imóveis inseridos nas áreas pioritárias para conservação da natureza, tais como as que se localizam no entorno de unidades de conservação, no interior das Áreas de Proteção Ambiental”, por exemplo.

Terá também que ajudar o dono da terra a fazer o plano de manejo, levantar financiamento para projetos que tornem a reserva rentável, como o ecoturismo, obter isenção de impostos e abrir as portas de instituições de pesquisa capazes de orientá-lo na gestão da propriedade. Determina até que as estradas de acesso às RPPNs recebam atenção especial da Secretaria de Transportes. E que os proprietários possam usar destacamentos locais da polícia militar para fiscalizar as reservas.

Londrina ganha um jardim botânico com 2 milhões de metros quadrados. A metade desse terreno foi doada pela PUC, a Associação Brasileira de Educação e Cultura e fazendeiros.

  • Marcos Sá Corrêa

    Jornalista e fotógrafo. Formou-se em História e escreve na revista Piauí e no jornal O Estado de S. Paulo. Foi editor de Veja...

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