Paraty e toda a sua costa costumam constar no roteiro de quem busca praias para surfe, descanso ou agito noturno, ilhas para mergulho e opções de trilhas. Mas se você está atrás de um paraíso pouco conhecido e de natureza ainda praticamente intocada, restam poucas opções na região. Uma delas é Martins de Sá.
A praia é a mais preservada da Reserva Ecológica da Juatinga, que tem 8 mil hectares e abrange cerca de 12 praias, separadas por morros. Muitas só são alcançadas através das árduas trilhas, em outras chega-se de barco. Algumas são bem pequenas, outras muito povoadas.
Alguns fatores explicam por que o local se mantém a salvo da invasão dos turistas. O primeiro é a dificuldade de acesso. O trajeto começa em Paraty, onde barcos de pescador, no estilo traineira, disputam os grupos que chegam. O preço da viagem varia entre 20 e 30 reais e é preciso aguardar a lotação do barco, o que pode significar um bom tempo de espera debaixo do sol. A viagem dura em média duas horas, e os viajantes desembarcam na praia do Pouso de Cajaíba, local já bem povoado, com bares à beira d’água e música alta.
É lá que começa a trilha que leva a Martins. São mais duas horas de caminhada. Para os mais despreparados, o caminho não é fácil, com direito a uma forte subida a céu aberto. A maior dificuldade geralmente é encarar o desafio carregando mochila, que invariavelmente estará pesada: os viajantes devem levar, além da barraca e do saco de dormir, toda a comida que irão consumir. Na praia, o único mantimento acessível é a água, que desce limpa da montanha por um rio. Luz elétrica não há.
Vale a pensa fazer parte do seleto grupo que resiste à canseira e à rusticidade do lugar. A praia, de areia branca e fofa, tem águas cristalinas e é cercada por morros ainda totalmente tomados de Mata Atlântica. De lá, há trilhas que levam a cachoeiras e a outras praias também desertas, como a Sumaca. Martins de Sá é reduto de surfistas. Suas ondas são altas, o que na maior parte do ano impede o acesso direto por barco.
Sob bons cuidados
Existe, no entanto, outro motivo pelo qual este pequeno paraíso ainda se encontra parcialmente protegido da expansão desenfreada do turismo e das construções da região. A praia tem um administrador informal. É o pescador Manoel dos Remédios, ou seu Maneco, dono na única casa que há ali. Ele oferece serviço de camping e se dedica a manter o lugar limpo. Seja com as próprias mãos, seja orientando os turistas a preserver a praia.
Apesar de residir em área de reserva ecológica, seu Maneco é bem visto pelas autoridades da região. “A área tem muito palmito jussara. De quando em quando, os palmiteiros tentam explorar a região, mas a vigilância de seu Manoel ajuda a afugentá-los”, afirma João Fernandez de Oliveira, chefe local do Instituto Estadual de Florestas (IEF).
Também os viajantes que conhecem o local guardam boas lembranças do simpático guardião. “Dá pra perceber que ele gosta muito da praia e do convívio com os visitantes”, revela o surfista Bruno César de Oliveira, freqüentador assíduo de Martins. “Além disso, conhece bem cada palmo da floresta e da praia. Com algumas folhas faz remédios contra mosquitos e até ‘novalgina natural’”.
Manoel dos Remédios nasceu em Martins de Sá. Seus avós foram escravos em uma fazenda próxima à praia que explorava carvão. Hoje, com a fazenda abandonada e a floresta se recompondo, o pescador diz ter direito à terra que habita. Ninguém sabe ao certo a idade do caiçara. “Acho que é porque nem ele sabe”, brinca Bruno.
O carinho de seu Maneco por Martins de Sá parece contagiar os visitantes. O público da praia é cuidadoso com o ambiente e não costuma deixar rastros. Amantes da natureza dispostos a um certo sacrifício para desfrutá-la, sabem que quase já não existem lugares silenciosos, limpos e imunes ao caos urbano que toma conta do litoral.
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