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O dado humano na natureza

Palestrantes no Congresso de Unidades de Conservação defendem a necessidade de estudar as relações entre o homem e o meio ambiente para guiar gestão de áreas protegidas.

Redação ((o))eco ·
18 de junho de 2007 · 18 anos atrás


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“A gestão de recursos naturais é 10% biologia e 90% lidar com as pessoas”, costumam dizer importantes gestores de áreas protegidas nos Estados Unidos. A frase , citada pelo pesquisador Michael J. Manfredo, do Departamento de Dimensões Humanas dos Recursos Naturais da Universidade do Colorado , exprime o sentimento comum entre os administradores de que as questões humanas no entorno e interior das áreas são tão importantes em seu trabalho quanto entender da natureza que elas protegem. E dá cabo da relevância que têm as ciências sociais para a conservação, ainda que esse campo do conhecimento tenha chegado tarde nas análises do tema e só de uns tempos para cá começado a ganhar força.

Tradicionalmente, a estrela dos trabalhos sobre conservação é a natureza em si. Estudos sobre os seres mais diversos têm sido a principal arma teórica para proteção da biodiversidade. Só que pesquisar a vida sexual dos sapos ou os diferentes cantos dos pássaros nem sempre leva em conta a principal ameaça à existência desses bichos e do ambiente em que vivem: o homem. Para isso, é preciso na maioria das vezes apelar para as ciências sociais. Manfredo dá como exemplo da importância desses estudos o debate sobre incluir ou não pessoas nas áreas protegidas. “Essa não é necessariamente uma questão de biologia, mas um conflito entre ideais humanos”, escreve ele no artigo que apresentou nesta segunda-feira durante o quinto CBUC, em Foz do Iguaçu. Sua palestra é apenas uma das diversas ministradas no evento que tentam chamar atenção para essa perspectiva recente do debate, chamada pelos especialistas de “dimensões humanas” da conservação.

Katrina Brandon, da Conservação Internacional, é outra que evidencia esse tipo de estudo. “As forças que põem a biodiversidade em perigo e que determinarão em última instância se ela será conservada ou destruída são sociais, econômicas e políticas, não ecológicas”, diz ela . Para a antropóloga, um dos caminhos interessantes a serem seguidos pelos pesquisadores dessa linha é a relação entre as áreas protegidas e o desenvolvimento da agricultura. “Áreas de conservação às vezes são vistas como ‘contribuidoras’ da pobreza rural ou limitadoras do desenvolvimento nacional por remover da produção potenciais terras agrícolas”, escreveu em seu artigo.

Visões opostas

Brandon tinha na cabeça o contexto tupiniquim quando pôs no papel a frase acima. A edição de 2006 do World Food Prize, conta ela, premiou dois brasileiros que contribuíram com estudos para transformar o Cerrado em área agriculturável. Na cerimônia, Norman Borlaug (conhecido como o pai da chamada revolução verde, durante a qual foram desenvolvidas novas sementes e práticas agrícolas nas décadas de 60 e 70) chamou as plantações no nosso Cerrado de “uma das maiores vitórias da ciência agrícola no século XX, que transformou uma terra improdutiva numa das áreas agrícolas mais produtivas do mundo”. Uma visão totalmente diferente de quem pensa a região a partir de suas características naturais. “O que para um grupo é uma terra improdutiva vasta e infértil, para outro é uma das áreas mais importantes biologicamente no mundo”, diz Brandon.

Esse tipo de percepção das visões diferentes sobre a realidade é um dos principais componentes do gestor ideal de parques e áreas protegidas de uma maneira geral, segundo Perry Brown, da Universidade de Montana. O administrador perfeito, para ele, deve ser munido de experiência prática e, principalmente, teórica: precisa conhecer conceitos de economia, geografia, ciências políticas e antropologia. E, de quebra, relacionar tudo isso com um conhecimento profundo de biologia. “Ele precisa reconhecer que áreas do tipo não vão se sustentar, mesmo se tivermos todo o conhecimento físico e biológico, a menos que as pessoas queiram parques e áreas protegidas e estejam dispostas a tomar medidas e fazer sacrifícios para sustentá-las”, diz ele, ao traçar um histórico do surgimento da disciplina das dimensões humanas nos Estados Unidos.

Esse é o ponto em comum entre todos os palestrantes dessa área: querem afirmar o novo campo de estudos como formador de profissionais prontos para trabalhar com o manejo de recursos naturais. Manfredo lista diversas vantagens que o gestor ligado nas pesquisas produzidas por esse campo pode ter: “projetos educacionais serão mais efetivos quando eles tiverem como alvo o que as pessoas já sabem; o desenvolvimento do turismo será mais efetivo quando considerar as demandas do consumidor; a aceitação de políticas será mais provável se as pessoas sentem que foram ouvidas e podem apoiar ou aceitar uma decisão”, diz.

Os Estados Unidos estão bem à frente dos países da América Latina no que diz respeito à formação de gestores com essa visão. “Existem cursos desde a década de 70”, diz Ryan Finchum, da Universidade do Colorado. Levar em conta as aspirações das comunidades no entorno e dentro das áreas protegidas, garante ele, não quer dizer que o gestor fique na mão dos interesses das pessoas. “Deve-se saber de antemão o que fazer com cada parte de um parque, por exemplo, separando áreas que devem ser inteiramente conservadas do que pode ter de alguma atividade”, diz Peter Newman, colega de Ryan no Colorado. “O importante é ter objetivos definidos”, completa.

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