Em meio a telefonemas e mensagens eletrônicas de clientes do Brasil e do Exterior, o empresário Evandro Luiz Weber recebeu a reportagem de O Eco na sede da cachaçaria Weber Haus, em Ivoti, na última sexta-feira (22). A cinquenta quilômetros de Porto Alegre, o município de colonização alemã tem vinte mil habitantes e ainda exibe casas no estilo enxaimel, uma ponte construída durante o Império e um agradável clima interiorano.
Com informações e dados na ponta da língua, Weber conta que os produtos de sua família são elaborados a partir de canaviais e processos orgânicos, sem agrotóxicos e outros químicos, e receberam em 2005 a primeira certificação desse tipo de destilado no Sul do país. A qualidade das bebidas é atestada pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) e Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), enquanto dos 17 hectares de cana-de-açúcar pela certificadora Ecocert.
Mas as iniciativas do empresário na área ambiental não se esgotam por aí. A produção de cachaças de boa qualidade exige a separação das chamadas “cabeça” e “cauda” durante a destilação, ou seja, apartar cerca de 10% do líquido, no início e no fim do processo. Essas parcelas são impróprias para o consumo, mas, em bebidas com baixos predicados, tudo é misturado. Quem sofre é o consumidor, com muita dor de cabeça. Para driblar esse incômodo e evitar o lançamento de resíduos no ambiente, Weber instalou um equipamento especial e vem produzindo álcool para os veículos da empresa.
Com uma “coluna” de aço inoxidável, ele vem convertendo uma média de 350 litros semanais em 80 litros de combustível. O álcool caseiro tem características semelhantes ao vendido nos postos e é usado em dois veículos Gol e Celta, do tipo flex. Eles rodam por estradas de terra e asfalto no Vale do Rio dos Sinos e nunca apresentaram problemas em viagens ou vistorias mecânicas. A pequena produção de combustível não é vetada pela legislação, conforme a Agência Nacional do Petróleo.
Acionando a calculadora no computador logo a sua frente, o empresário levanta uma economia de aproximadamente cinco mil reais com a produção local de álcool, nos últimos oito meses.
“É lucrativo ou rentável? Não. Mas estamos evitando a produção de cachaça com materiais impróprios e aproveitando resíduos que seriam jogados fora ou aproveitados para adubação da cana, mas só depois de um processamento”, explicou Weber.
Realmente pode parecer pouco dinheiro mantido no bolso, mas a cachaçaria vem ocupando espaços no mercado e abocanhando prêmios internacionais inéditos. Cachaças, aguardentes e licores podem ser encontrados em todos os estados do país e no Distrito Federal. Também na Alemanha, Itália, França e Estados Unidos. Há negociações para enviar o produto à Irlanda, Suíça, Dinamarca e Triângulo das Bermudas. Este ano, uma cachaça branca da Weber Haus foi premiada como o melhor destilado do globo na competição anual de bebidas de São Francisco, nos Estados Unidos. Ano passado, já havia levado várias taças para casa.
O sistema para produção de combustível da Weber Haus custa hoje cerca de R$ 14 mil. A empresa investiu cerca de um terço desse valor para adquirir o equipamento. Ou seja, ele já “se pagou” com o drible nas bombas dos postos de abastecimento.
E como a cachaçaria ainda depende de pequenos produtores para completar suas necessidades de cana-de-açúcar, está articulando com a prefeitura de Ivoti a formação de uma cooperativa de agricultores orgânicos. Também pensa em produzir e vender açúcar mascavo, a partir do ano que vem.
Produzindo cachaças desde 1948, a Weber Haus acumula conquistas e bons exemplos ambientais. Sua história, todavia, começou mais de um século antes, quando os antepassados de Evandro Weber pisaram no Brasil, vindos diretamente da Alemanha. Eles compraram terras em Ivoti, onde plantavam mandioca, produziam farinha e cana-de-açúcar. As primeiras cachaças vieram em 1848, para consumo próprio e de amigos. De início, o alambique era um simples galpão com um engenho, movimentado por mulas. Clique aqui e veja parte do antigo maquinário.
Produção em pequena escala
Acompanhando sistemas produtivos locais desde 1980, o professor da Universidade Federal de Viçosa (MG) Juarez de Sousa e Silva se diz um “incentivador” de práticas como a da Weber Haus, conta que vários alambiques no Brasil vêm aproveitando resíduos para elaboração de etanol e que a alternativa poderia viabilizar, inclusive, a produção descentralizada de combustíveis com formação de cooperativas de pequenos produtores de álcool, assim como ocorre com a produção de leite.
“Além do consumo familiar ou em pequenas empresas, vários alambiques reunidos poderiam destinar sua produção a uma central, onde o produto seria homogeneizado para comercialização. Assim haveria escala de produção e a possível abertura de mercados”, comentou o pesquisador e coordenador do site Pós-Colheita, recheado com informações interessantes para a pequena produção nacional.
Atalhos:
Weber Haus
Município de Ivoti
Ecocert Brasil
Universidade Federal de Viçosa / Pós-Colheita
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