As mudanças nas cores da Fazenda São Nicolau depois de uma década de reflorestamento (foto: Divulgação)
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O balanço de uma década de atividades na fazenda São Nicolau, “poço de carbono” da montadora francesa Peugeot em Cotriguaçú, indica que o crescimento de dois milhões de mudas de árvores nativas e exóticas plantadas em 1,8 mil hectares onde antes havia pastagens para gado retirou da atmosfera 110 mil toneladas de Dióxido de Carbono (CO2), ou cerca de oito toneladas anuais para cada hectare.
A expectativa é de que sejam captadas 720 mil toneladas do gás até 2038, quando acaba o projeto, no noroeste do Mato Grosso. A área foi comprada em 1998 e recebeu injeção de dez milhões de euros da empresa, além de reforço anual de 180 mil euros para pesquisas, incluindo dinheiro do Office National dês Forêts, órgão francês responsável pela gestão de onze milhões de hectares de florestas públicas naquele país. A fabricante transformou outros 1,8 mil dos dez mil hectares da fazenda às margens do rio Juruena em reserva particular.
A propriedade é uma gota no oceano do desmatamento da Amazônia, mas o poluente absorvido ajuda a formar troncos, galhos, folhas e raízes e a combater o aquecimento do planeta, provocado inclusive pela poluição que sai do escapamento de automóveis. Na região, havia antes uma fazenda do grupo Carrefour, também francês, com 25 mil hectares. Metade da área foi torrada em um épico incêndio, onde passaram a pisotear milhares de cabeças de zebu.
A experiência em solo brasileiro também serve como laboratório sobre a recuperação de áreas desmatadas na Amazônia. A reintrodução de árvores ocorreu com 50 espécies típicas da floresta tropical, como ipê, simarouba, jamelão, paricá, aroeira, peroba e paineira. Também há cultivo de teca, árvore natural de países como Índia e Tailândia com crescimento rápido e madeira apreciada na fabricação de móveis. A espécie é uma das dez que mais rapidamente ganharam tamanho no experimento e serão estudadas mais a fundo.
Professor da Universidade Federal de Mato Grosso, Versides Sebastião de Moraes e Silva contou a O Eco que cada tipo de árvore se comporta de maneira diferente após o plantio. O importante, disse, é ter espécies que aceleram no desenvolvimento, como caixeta e figueira-branca, para formar uma cobertura sobre outros parentes mais lentos. “Em áreas abertas com pastagens o crescimento é mais lento do que sob a proteção de outras espécies, ou até de um cafezal”, comparou o engenheiro florestal.
Coordenador de pesquisas em Silvicultura Tropical do Inpa – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e membro do comitê científico que
Distribuição de plantios e terras na fazenda São Nicolau. Imagem: Divulgação |
acompanha a empreitada, João Ferraz lembra que sete em cada dez hectares de floresta na Amazônia são derrubados para abertura de pastagens, enquanto metade dos pastos antigos está degradada. Por isso, é preciso usar áreas já abertas para produção e recuperar matas sempre que for possível. Mas a tarefa não é fácil.
“Para áreas degradadas na Amazônia, o projeto representa uma fonte de conhecimento em como tratar com espécies nativas e exóticas quando elas forem plantadas em áreas desmatadas. Conhecimentos científicos já mostram como transformar uma antiga pastagem em cultivo florestal, mas falta conhecer o desempenho dessas espécies até que elas cheguem numa fase produtiva, estejam aptas a integrar o ecossistema local ou o mercado de madeiras”, disse.
Florestas nativas maduras na Amazônia estocam entre cem e 150 toneladas de CO2 por hectare, em média, com uma biodiversidade estimada em até cinco mil tipos de árvores para todo o bioma. A ciência conhece apenas em torno de 1,5 mil espécies. Comparando, matas na América do Norte têm cerca de 650 espécies, enquanto na Europa central apenas 50 espécies. Recompor o tecido amazônico é tarefa que se perde no tempo e depende de investimentos contínuos.
“A idéia não é só a restauração das florestas até níveis bem próximos das originais, mas em primeira linha que a região receba benefícios ambientais prestados pela floresta, como controle de erosões e do assoreamento dos rios, suprimento de água para mananciais, manter evapotranspiração para atmosfera e produção de chuvas, proteção de fauna. Esses serviços têm hoje em dia reconhecimento e importância cada vez maiores”, comentou Ferraz.
País quer REDD
Mapa das áreas com projetos de REDD no Brasil.
Clique e confira em tamanho maior, com legenda. Imagem: SFB |
Dos 18 projetos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD) vigentes no país, dezesseis estão na Amazônia e dois na Mata Atlântica. Eles abrangem 46 milhões de hectares, estão distribuídos em propriedades públicas e privadas e terras indígenas e, aposta o governo federal, podem render até 230 milhões de dólares, ou quase 400 milhões de reais, para a manutenção de florestas. Mas apenas 12% já estão implementados, conforme levantamento apresentado esta semana pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB).
O Brasil vai defender o mecanismo que compensa com dinheiro o freio no desmatamento na conferência climática de Copenhague, em dezembro, inclusive com manejo florestal e seqüestro de carbono. Se o REDD ou mecanismo semelhante for aprovado na conferência, o papel das florestas no combate às mudanças do clima será finalmente reconhecido e fortalecido. O projeto da montadora francesa faz parte do pacote que Mato Grosso levará ao encontro, esperando captar recursos para pagar quem mantém árvores de pé. “Já estamos debatendo com possíveis doadores”, disse o secretário de Meio Ambiente do estado, Luis Henrique Daldegan. Empresas de energia norte-americanas estão na lista.
Ele explica que a idéia é pagar aos proprietários rurais que mantiveram florestas além de suas reservas legais, de oito em cada dez hectares em fazendas na Amazônia. Assim, estariam preservando mais do que determina a lei e merecendo uma compensação que ajudaria a manter toda a propriedade. A Secretaria de Meio Ambiente aponta mais de oito milhões de hectares de florestas em fazendas nessa situação. Essas matas se espalham em mais de três mil propriedades cadastradas pelo estado, onde apenas os “excedentes” de matas, para além das reservas legais, somam quase um milhão de hectares.
Mas além de Amazônia, que ocupa quase metade do estado, Mato Grosso tem Cerrado e Pantanal. A proposta para compensação pelo controle no desmatamento, por enquanto, incide apenas no primeiro bioma, onde o estado vem reduzindo as taxas de desmatamento. Já no Cerrado, dos 359 mil quilômetros quadrados (Km2) originais em Mato Grosso, 175 mil Km2 já cederam espaço a soja, boi e outras atividades. “Para compensar desmatamento evitado é preciso saber onde se está desmatando, o que ocorre por enquanto apenas na Amazônia. No Cerrado, o monitoramento apenas começou”, comentou Raul Valle, do Instituto Socioambiental.
Saiba mais:
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