Reportagens

Espécies ameaçadas, mas pouco conhecidas

Estudo do Ipea ressalta lacuna nos estudos das espécies nacionais e aponta o desmatamento como causa de desequilíbrio ecológico.

Nathália Clark ·
17 de fevereiro de 2011 · 14 anos atrás

Brasília –

O Brasil é o país com maior biodiversidade do planeta. Fungo fotografado  no Parque Nacional do Iguaçu (foto Marcos Sá Corrêa)
O Brasil é o país com maior biodiversidade do planeta. Fungo fotografado no Parque Nacional do Iguaçu (foto Marcos Sá Corrêa)

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou, nesta quinta-feira, 17, o Comunicado n° 78, sequência da série “Eixos do Desenvolvimento Brasileiro”. O estudo sobre biodiversidade aponta para a falta de conhecimento a respeito da diversidade genética das espécies brasileiras. Apesar de ser o campeão mundial em biodiversidade, com 1,8 milhões de espécies, o baixo nível de conhecimento no Brasil é assinalado pelo índice da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) como o mais crítico em termos globais.

Assessor técnico da presidência do Ipea, Albino Alvarez afirmou que a biodiversidade é um patrimônio de ordem cultural, ética e estética, além de um importante capital natural, e que deve se tentar traduzi-la em valores monetários que colaborem para o desenvolvimento do país. “As espécies fazem parte de um patrimônio histórico, num território onde (e a partir do qual) a sociedade brasileira se constituiu, e seus serviços são importantes para a própria manutenção da vida humana”, disse.

Causas, efeitos e possíveis soluções

As maiores causas apontadas para a redução da diversidade genética das espécies são: a perda ou fragmentação de habitats, processo comum em todo o mundo; mudança na composição de ecossistemas, tendo o desmatamento como a causa mais evidente de desequilíbrio ecológico; sobreexplotação, ou seja, a extração para venda, principalmente de recursos pesqueiros e florestais; introdução de espécies exóticas; poluição e contaminação, onde se encaixa o lugar do Brasil como principal consumidor mundial de agrotóxicos; e, por fim, as mudanças climáticas.

Como contenção dessa perda e preservação da biodiversidade, o técnico de planejamento e pesquisa em sustentabilidade ambiental, Nilo Saccaro Junior, destacou o trabalho com manejo das espécies e a produção de conexão entre os fragmentos ecossistêmicos, como os corredores ecológicos. No entanto, para que isso seja possível e bem realizado, é fundamental o conhecimento não só das espécies, que é maior, mas também da diversidade genética. Segundo levantamento do Ministério do Meio Ambiente (MMA) apresentado pelos técnicos, até hoje, dentre os animais ameaçados de extinção no Brasil, há iniciativas de estudos apenas para 22% dos mamíferos, 3% das aves, 15% dos répteis e nenhum em absoluto para os anfíbios; sendo a maioria destas espécies da Mata Atlântica e Amazônia.

Nilo acredita que “estamos muito aquém do conhecimento necessário, o que impossibilita o processo de monitoramento global da erosão da diversidade genética”. Para ele, alcançar um melhor nível deve ser uma meta e um diferencial, para um país com liderança na questão ambiental como o Brasil. Ele disse ainda que isso pode ser feito com iniciativas coordenadas, diversos centros trabalhando conjuntamente, e citou o exemplo bem-sucedido da Rede Genoma.

Espécies em ameaça de extinção

Albino Alvarez, do IPEA: estamos muito aquém do conhecimento necessário (foto Nathalia Clark)
Albino Alvarez, do IPEA: estamos muito aquém do conhecimento necessário (foto Nathalia Clark)

De acordo com o estudo, desde 1968 nota-se um aumento nas estatísticas de espécies à beira da extinção. Isso, segundo João Paulo Viana, corresponde ao processo de transformação do ambiente e dos padrões de uso do solo. Em último levantamento feito em 2008 havia 627 espécies da fauna ameaçadas e 472 da flora. Dentre os animais vertebrados, as aves estão em maior número na lista, sendo 160, e os peixes vêm em segundo lugar, com 154 espécies em risco.

Divididas por bioma, a lista de espécies ameaçadas da flora tem a Mata Atlântica em primeiro lugar, com 276; em seguida o Cerrado, com 131; Caatinga, com 46; Amazônia, 24; Pampa, 17; e Pantanal, 2. As medidas adotadas para conservação e recuperação das espécies, desde a portaria 316 do MMA e Instituto Chico Mendes da conservação da Biodiversidade (ICMBio), de 2009, são as listas nacionais de ameaça, os livros vermelhos e os planos de ação.

Biomas, zona urbana e UCs

Segundo Júlio César Roma, também técnico do instituto, o conhecimento e a conservação dos biomas têm aumentado, mas a distribuição de Unidades de Conservação (UCs) ainda é bastante desigual, com baixa representatividade principalmente na Zona Costeira Marinha, no Pampa e Pantanal.

Para os técnicos, porém, não basta apenas a conservação das zonas de mata, a ocupação urbana desordenada também contribui para a perda da biodiversidade, embora não hajam muitos estudos sobre esse impacto. Em Brasília, por exemplo, há espécies endêmicas de aves ameaçadas pelo crescimento populacional. E a perda total, sim, parece irremediável. “Repor uma biodiversidade perdida é praticamente impossível e seria extremamente caro para o governo e para a sociedade”, afirmam os técnicos.

Leia a íntegra do Comunicado do Ipea nº 78: Genes e Espécies e Biomas Brasileiros

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  • Nathália Clark

    Nathalia Clark é jornalista na área de meio ambiente, desenvolvimento sustentável, mudanças climáticas, justiça social e direitos humanos.

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