“Eu faço esses registros porque eu sei que daqui a alguns anos ou décadas isso vai se acabar e talvez esse parque nem exista mais. É um descaso total com a área do Parque Nacional da Amazônia. Vejo que necessita de alguém para divulgar o parque, porque, se depender do governo, só virão aqui para fazer barragem”, diz Gilberto Nascimento Silva, 44 anos, morador do Pará desde 1982, migrado do Piauí. Ele começou a trabalhar no Parque Nacional da Amazônia em 1993, como vigilante. Rapidamente, passou a ser guia para turistas e se perdeu dentro das matas em busca de novos atrativos do parque.
Ao ver a quantidade de registros em fotos e vídeos feitos pelos turistas, em especial europeus e norte-americanos, e a falta de divulgação sobre o parque para os próprios moradores locais, do município de Itaituba, juntou forças e comprou uma máquina fotográfica, naquele tempo, ainda analógica. Aprendeu a usá-la e a se aventurar nos cliques. “Eu lembro que para fotografar as onças eu tinha que me aproximar o máximo possível, pois minha câmera não tinha zoom”, conta Gilberto.
Gilberto afirma ter o mais completo acervo de imagens sobre o Parque Nacional da Amazônia. Hoje, ele já está na sua terceira câmera digital, como diz, “com muito mais recursos”, e calcula ter acumulado registros de 800 espécies diferentes. Suas fotos foram parar nas páginas de revistas nacionais e internacionais, além de usadas para ilustrar o plano de manejo do parque.
Entre os feitos fotográficos, Gilberto destaca o registro de um pássaro até então desconhecido e que, agora, está sendo identificado por biólogos no Museu Goeldi em Belém do Pará.
Gilberto é reconhecido na região e por sua fama foi convidado a participar de projetos científicos que envolviam registros fotográficos. Conheceu Leidiane Diniz, pesquisadora do ICMBio, que o convidou a participar de um projeto com armadilhas fotográficas utilizando as câmeras Tigrinus. Depois, em projeto de monitoramento de animais atropelados na Transamazônica (BR-230), que corta o parque, Gilberto conta que passou por uma das piores experiências de sua vida: encontrar uma onça-pintada atropelada na estrada. As evidências sugeriam que ela foi atropelada de propósito por um carro ou caminhão.
Hoje, segue trabalhando com armadilhas fotográficas, desta vez, com câmeras Bushnell , usadas para produzir vídeos. O trabalho faz parte do projeto contratado pela Eletronorte para mapear os felinos do parque, ameaçados pela planejada construção de grandes hidrelétricas na região.
Nestes mais de 20 anos de amor ao Parque Nacional da Amazônia, Gilberto nunca recebeu um centavo do governo (ou órgão responsável) que pagasse por seus trabalhos com registros fotográficos da biodiversidade local. Ele tirava o sustento trabalhando como vigilante terceirizado do Parque. Mas Gilberto foi demitido em novembro de 2013, quando o ICMBio rescindiu contrato com a empresa provedora do serviço. “Eu era simplesmente um vigilante do parque e agora tenho um arquivo muito grande sobre o parque. Eu me sinto um grão de areia, lutando por uma área que se encontra abandonada”, desabafa Gilberto. “Se na pequena área que a gente atua conseguimos registrar uma quantidade grande de espécies, então deve existir muito mais dentro desse imenso parque”.
Ele persiste com seus registros fotográficos, apesar das dificuldades e da falta de apoio. Já pensou em desistir. Mas, irredutível, segue forte e resiste até às brigas com a esposa — que acha exagerado o empenho dele pelo parque. Logo em seguida a entrevista que concedeu para essa matéria, seguiu para mais uma expedição de 30 dias dentro do parque, desta vez para ajudar o ICMBio a monitorar áreas de garimpo na região.
Vídeo: ((o))eco entrevista Gilberto Nascimento Silva
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