Reportagens

Futuro insustentável

O IBGE juntou dados de diferentes instituições brasileiras e montou o perfil do desenvolvimento sustentável do país. O meio ambiente paga o preço mais alto.

Carolina Elia ·
4 de novembro de 2004 · 20 anos atrás

Desenvolver-se é preciso, mas acompanhar as conseqüências e tendências do desenvolvimento também. Com esse objetivo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou uma compilação de dados, levantados por diversas instituições, que ajudam a detectar o ônus do progresso. Não por acaso, o documento Indicadores de Desenvolvimento Sustentável começa falando de Meio Ambiente.

Primeiro a boa notícia: o Brasil vem reduzindo drasticamente o consumo industrial de substâncias que destroem a camada de ozônio. A mais famosa delas o CFC. Nas áreas urbanas, a concentração de poluentes no ar tem se mantido estacionária, e em alguns casos até declinado. A melhora na qualidade do ar estaria ligada a programas de governos estaduais e municipais.

Mas a poucos quilômetros dos centros urbanos, em qualquer parte do Brasil, matas nativas são queimadas. Segundo os dados divulgados pelo IBGE, quase 213 mil focos de calor foram detectados no país no ano passado. Dentro da Amazônia Legal, as taxas de desmatamento são altas e não têm mostrado tendência de declínio. “Na Mata Atlântica o índice é mais baixo, mas também sobrou pouco para desmatar”, explica Jadicael Clevelario Junior, coordenador dos indicadores ambientais do relatório. Ele lembra que nem por isso os danos são menores.

A Mata Atlântica abriga o maior número de espécies ameaçadas de extinção no país. Resultado direto da destruição desse ecossistema durante 500 anos de ocupação do litoral. Das 414 espécies da fauna terrestres que constam na lista de risco do IBAMA, 269 moram na Mata Altântica. O tráfico de animais silvestres também colabora bastante para o empobrecimento das florestas brasileiras. Trata-se do terceiro maior comércio ilegal do mundo, movimenta cerca de 10 bilhões de dólares por ano, e o Brasil abastece 10% desse mercado. Segundo o IBAMA, as aves são as mais procuradas e 95% do comércio de animais silvestres brasileiros é ilegal.

Uma arma para tentar barrar tanto o desmatamento quanto o tráfico de animais silvestres é a criação de áreas de proteção ambiental. Elas são cada vez mais numerosas, mas ainda insuficientes. A maioria está na Amazônia, que tem a maior área percentual protegida e as maiores unidades de conservação em extensão do país. Já a Mata Atlântica e a Caatinga têm menos de 1% de suas riquezas protegidas. O Cerrado também se ressente de mais áreas de preservação. O documento do IBGE, que só contém informações sobre unidades de conservação federais, aponta a ausência de reservas na área conhecida como arco do desmatamento, provocado pelo avanço da agropecuária no centro-oeste. Revela também que há um número significativo de pastos de pouca produtividade espalhados pelo Brasil. Eles poderiam ser usados para a pecuária e agricultura, o que evitaria novos desmatamentos.

Para enfatizar a necessidade do manejo adequado dos recursos, uma parte da publicação foi dedicada ao problema da desertificação. Em muitos países esse tipo de erosão está relacionado a mudanças climáticas, mas no caso do Brasil o principal fator de desertificação é o mau uso do solo. A primeira edição dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável do IBGE, publicada em 2002, não incluía essa questão. Agora, os organizadores pretendem não apenas torná-la permanente como disponibilizar mais informações sobre o assunto. Por enquanto, eles só conseguiram dados relacionados às regiões nordeste e sul. O fenômeno da desertificação pode provocar assoreamento de rios, inundações e perda de qualidade de vida.

Um outro dado preocupante do relatório é o aumento do uso de agrotóxicos no Brasil nos últimos anos. Em 2002, foram empregados 7,6 milhões de toneladas de fertilizantes em 53,5 milhões de hectares plantados. Os agrotóxicos normalmente estão associados a técnicas de plantio que tornam as plantações mais produtivas, o que de certa forma poupa a terra. Em compensação poluem os rios, que já não andam muito bem. Nenhum corpo d’água analisado atingiu um nível de qualidade de água ótimo. Perto dos centros urbanos a qualidade piora, principalmente pela falta de saneamento básico. Nos últimos anos, o Brasil ampliou os sistemas de coleta de esgoto, mas não o tratamento desses resíduos.

Essa série de dados, que se entrecruzam e remetem a diversos outros, é apenas uma parte do que está exposto na publicação do IBGE. O documento contempla ainda os campos econômico, social e institucional. Em todas essas áreas há questões ligadas ao meio ambiente. Segundo os organizadores, o objetivo foi mapear o rastro deixado pelo desenvolvimento e pensar o caminho que ele deve tomar no futuro para se tornar, de fato, sustentável.

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