O governo do Pará vai tentar criar, ainda neste final de ano, um Mosaico de Unidades de Conservação na Terra do Meio, uma área de 8 milhões de hectares encravada entre os rios Xingu e Tapajós, no Sudoeste do estado. É nela que hoje estão os maiores focos de desmatamento, grilagem de terras e violência em território paraense. A implantação do Mosaico foi acordada entre os governos estadual e federal. O decreto de criação também está pronto. Faltando mesmo para botar o plano em andamento estavam apenas as audiências públicas para discutir a proposta oficial, parte fundamental do processo de criação de unidades de conservação. Breve, não estarão mais.
Na quinta-feira, dia 16 de dezembro, em decisão de certo modo surpreendente – a intenção do governo paraense era conhecida, mas sua avidez em concretizá-la tão cedo não – o secretário de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do estado, Gabriel Guerreiro, convocou para a segunda e terça-feira seguintes, 20 e 21 de dezembro, as audiências públicas com as populações de dois municípios que estão na Terra do Meio, São Felix do Xingu e Altamira. Guerreiro tomou a decisão de acelerar o processo depois de reunião que teve em Brasília, no início de dezembro, com João Paulo Capobianco, do Ministério do Meio Ambiente e Flavio Montiel, chefe dos fiscais do Ibama.
A razão do encontro era mostrar e debater o plano de macrozoneamento do estado, que nesse momento tramita em regime de urgência na Assembléia Legislativa e, se for aprovado, vai destinar 63% de seu território a unidades de conservação. Discutiu-se também questão que está ficando cara aos governos da Amazônia: o uso da legislação de criação de unidades de conservação para combater a grilagem e disciplinar o uso do solo. O problema é gravíssimo no Pará, onde conta-se nos dedos os hectares de terra em mãos privadas cujos títulos estão inteiramente legalizados.
Capobianco e Montiel elogiaram e deram apoio ao plano de macrozoneamento, mas detiveram-se mais nos problemas da Terra do Meio. Por conta do que anda acontecendo nela, especialistas do Ibama e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que monitoram os desmatamentos na Amazônia através de imagens do satélite Landsat, estão pessimistas quanto ao futuro imediato. Em outubro último, fiscais do Ibama descobriram — e mantêm sigilo sobre o caso — um gigantesco desmatamento numa área superior a 6 mil hectares, o equivalente a 6 mil campos de futebol.
Montiel defendeu o uso de “medidas emergenciais”, ainda este ano, para evitar que a destruição continue célere na Terra do Meio. Guerreiro tirou do colete seu plano para criar lá um Mosaico de Unidades de Conservação. Mostrou que ele se encaixava perfeitamente nas recentes tentativas do governo federal de frear o desmatamento no local – o presidente Lula assinou a criação de duas reservas extrativistas por lá, a Verde para Sempre e a Riozinho do Anfrísio – e nos planos futuros de Brasília para a área, que incluem a transformação da Floresta Nacional do Xingu em Estação Biológica, uma unidade de preservação permanente onde só pesquisadores tem autorização para entrar. Por conta dessa conversa toda, Guerreiro entendeu que era hora de correr e tomou a decisão de levar as audiências públicas adiante.
Os desmatamentos na Terra do Meio devem atropelar as previsões otimistas de Marina Silva. Com base em dados preliminares do INPE, que têm uma margem de erro de 10% a 15%, a ministra acredita que os índices de desmatamento na Amazônia em 2004 ficaram no mesmo patamar dos de 2003, ou até diminuíram. Há duas semanas, durante a apresentação do Inventário Emissões de Gases do Brasil, no Ministério da Ciência e Tecnologia, Marina Silva destacou o Plano de Combate ao Desmatamento na Amazônia, que conta com a participação de 13 ministérios coordenados pela Casa Civil. “O governo está trabalhando em conjunto para reduzir os índices”, afirmou a ministra.
Mas os números recentes do desmatamento na Amazônia apontam crescimento. Se em 2003 o Brasil perdeu na região uma área equivalente à do estado de Sergipe (22 mil km2), em 2004 corre o risco de perder um território do tamanho de Alagoas (29 mil km2).
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