O Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, em Porto Alegre, abrigou, no 21 de dezembro, uma audiência para discutir alternativas para o impasse da hidrelétrica de Barra Grande, cuja construção está sendo contestada na Justiça por entidades ambientalistas. Proposta pelo presidente do TRF, desembargador Vladimir Passos de Freitas, a reunião era vista como a derradeira tentativa de levar as partes a negociar. Fracassou.
Estavam presentes à sala de reunião do desembargador advogados e representantes do Ministério Público Federal, Ministério do Meio Ambiente, Ministério das Minas e Energia, Ibama, Rede de ONGs da Mata Atlântica, Federação das Entidades Ecologistas de Santa Catarina (Feec) e do Consórcio de empreiteiras BAESA, responsável pela hidrelétrica. Só na mesa principal, sentaram-se doze pessoas. Feita de portas abertas, a discussão durou mais de três horas e atraiu para a platéia um bom número de curiosos.
Os empreiteiros não fizeram qualquer concessão. O que os ambientalistas pediam era a realização de um estudo de viabilidade técnica que examinasse dois cenários: o primeiro, considerando a capacidade de operação da usina caso fossem poupados de derrubada os cerca de 4 mil hectares de floresta primária e em avançado estágio de regeneração; o segundo, poupando apenas a mata primária. Segundo João de Deus Medeiros, da Feec, o diretor da BAESA, Carlos Miranda, afirmou que esses estudos de cenário já haviam sido feitos. Diante disto, o desembargador propôs um prazo para que tais documentos se tornassem públicos e fossem analisados pelos ambientalistas. E sugeriu marcar nova rodada de negociações em 7 de janeiro. Pressionado, o representante do Consórcio de empreiteiras voltou atrás. “Estudo, estudo, não tem. Mas qualquer engenheiro pode afirmar que assim a obra ficaria inviável”, teria dito Miranda.
“Não houve qualquer possibilidade de negociação”, resume João de Deus. A coordenação da reunião foi elogiada pelo ambientalista. Segundo ele, o desembargador procurou sensibilizar as partes para uma conciliação, que se traduziria no aprimoramento o Termo de Compromisso firmado em setembro entre a BAESA, o Ministério Público e o Ibama. Mas a recusa dos empreiteiros de reavaliar a situação pôs tudo a perder. “Eles não querem ceder nada. Se todo conflito em torno desse projeto surgiu justamente de informações distorcidas e falsas, não podemos abrir mão de novos estudos, fidedignos”, completa.
A maior surpresa da reunião veio da participação de procuradores do Ministério Público Estadual de Vacaria (RS). Eles comunicaram que a área de influência da hidrelétrica de Barra Grande afeta um Parque naquele município, fato até então ignorado e ausente do Estudo de Impacto Ambiental do projeto.
Não bastasse isso, a importância ambiental da região aumenta a cada novo levantamento. Depois de um ano de trabalho, está chegando ao fim uma força-tarefa coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente para mapear os últimos remanescentes do ecossistema Floresta de Araucárias (Floresta Ombrófila Mista). Por meio de imagens de satélite e checagens de campo, concluíram que essas florestas são ainda mais raras do que se imaginava. Em Santa Catarina, os remanescentes primários ou os secundários em avançada recuperação não chegam sequer a 1% da cobertura original (até hoje, a literatura acreditava que este índice ficava entre 2% e 3%). Sobram cerca de 45 mil hectares no estado. Cerca de 2.100 deles ameaçados pela hidrelétrica de Barra Grande.
Enquanto dura o impasse, prosseguem as ações na Justiça. Nos dois lados da fronteira, situações distintas. Enquanto no Rio Grande do Sul voltou a valer a liminar que impede a derrubada da floresta, em Santa Catarina o que vigora é uma liminar liberando o corte.
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