Reportagens

Da florestania ao agronegócio sustentável, PT do Acre tenta voltar ao governo estadual  

Novamente candidato a governo, Jorge Viana adota um tom ambiental mais suave

Fabio Pontes ·
30 de agosto de 2022 · 2 anos atrás

Passados 24 anos desde a primeira vitória do Partido dos Trabalhadores (PT) ao governo do Acre, com a eleição do engenheiro florestal Jorge Viana, os petistas tentam retomar o poder com uma agenda mais “adaptada” ao atual contexto conservador.  

Viana é o único sobrevivente ao tsunami bolsonarista que atingiu o Acre nas eleições de 2018, mesmo ele próprio saindo derrotado na disputa ao Senado. Dono de uma boa memória eleitoral por seus dois mandatos no governo – entre 1999 e 2006. 

Foi em sua gestão que aconteceu a reestruturação física e institucional do estado num de seus piores momentos políticos, com a infraestrutura carcomida, as contas públicas arruinadas e a atuação de um esquadrão da morte formado por policiais.  

Durante a sua primeira passagem pelo governo, Jorge Viana colocou em prática as ideias de desenvolvimento da economia de base florestal defendida pelos movimentos de seringueiros liderados por Chico Mendes durante a década de 1980. 

O petista definiu sua gestão como o “governo da floresta”, e de “florestania” a proposta de assegurar políticas de geração de renda sustentável e serviços públicos para as comunidades da floresta, conciliando crescimento com a preservação da Amazônia. 

Nos 20 anos de hegemonia do PT, o modelo da “florestania” foi bastante criticado pelos adversários, acusando-o de ser o responsável pelo “atraso do desenvolvimento econômico” regional. Com isso, a “florestania” passou a ser um peso eleitoral, enquanto os concorrentes pregavam a adoção do agronegócio como a melhor solução, base do discurso que o atual governador, Gladson Cameli (PP), eleito no primeiro turno em 2018. 

No pleito de quatro anos atrás, o PT foi varrido de todos os mais importantes cargos eletivos. Os únicos espaços mantidos foram duas cadeiras na Assembleia Legislativa. Em 2020, o partido conseguiu uma vaga na Câmara dos Deputados após o titular, um parlamentar do Republicanos, ser cassado por corrupção eleitoral. A vaga preenchida pelo primeiro suplente da sigla.   

Ao se lançar novamente candidato a governo, às vésperas do prazo final das convenções partidárias, Jorge Viana agora adota um tom ambiental mais suave. Da florestania do passado, seu discurso agora é do agronegócio sustentável – mesmo termo usado pelo atual governo em meio ao crescimento recorde das taxas de desmatamento no estado. 

Na última quarta-feira (24), durante visita a um dos maiores frigoríficos da capital Rio Branco, Jorge Viana defendeu a adoção de uma pecuária de baixo impacto. De acordo com ele, durante seu mandato o Acre conseguiu conciliar a produção do campo com a preservação da floresta. Para refutar rótulos de ambientalismo radical aos governos petistas, ele sempre destaca o fato de ter sido durante as gestões do partido que o Acre obteve a certificação internacional de zona livre de febre aftosa. 

“Nós vamos trabalhar intensamente para fazer o segundo crescimento da pecuária acreana, que eu chamo de pecuária sustentável, e fazer o Acre crescer com o agronegócio sustentável para fazer com que chegue mais comida à casa das famílias”, disse Viana após o encontro com trabalhadores do frigorífico. 

“Eu vou estimular o agronegócio”, afirmou na semana anterior em reunião com famílias de agricultores da comunidade Baixa Verde, zona rural de Rio Branco. “Se ele [o produtor] plantar muita soja e milho vai ter ração para o peixe. Eu não vou ser contra, nem sou contra [o agronegócio]. Eu vou facilitar, facilitar licença [ambiental] para pequeno, médio e grande”, discursou o petista. 

Em seu programa de propostas, o ex-governador adota um discurso mais conciliador entre desenvolvimento econômico e preservação da Floresta Amazônica, que ainda ocupa ao menos 86% do território acreano. Usa com recorrência o termo desenvolvimento sustentável para se adotar políticas de crescimento da economia local com respeito ao meio ambiente.  Tenta, assim, não se desfazer por completo dos tempos do “governo da floresta”. 

Ele critica a atual situação de alta do desmatamento no estado, afirmando que é possível impulsionar a produção agropecuária a partir das áreas já desmatadas, sem a necessidade de novas aberturas. 

Além da recuperação de áreas degradadas ou subutilizadas para aumentar a produção rural, o plano também fala em reflorestar outros pontos desmatados para o Acre ganhar dinheiro por meio de programas de pagamento por serviços ambientais, com destaque para o mercado de crédito de carbono.      

  • Fabio Pontes

    Fabio Pontes é jornalista com atuação na Amazônia, especializado nas coberturas das questões que envolvem o bioma desde 2010.

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